Capítulo 4

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12 de junho de 2020.

Decidi que precisava agir de alguma forma, dar um jeito de invocar Laura ou sei lá. Só sabia que precisava fazer aquela garota me ouvir, tirar tudo do peito antes que explodisse. As cartas não eram o suficiente para apaziguar os pensamentos que bombardeavam minha mente, minha ansiedade não me deixava dormir e eu ficava rolando na cama até três horas da manhã.

Era por isso que, em plena quinta-feira, cinco horas da madrugada, eu estava acordada com os pensamentos acelerados. E também com uma página do Mercado Livre aberta, mostrando os resultados para minha pesquisa sobre tabuleiros Ouija. Eu debatia em silêncio se aquilo era uma boa ideia, se era seguro.

Sabia de todas as regras, também estava supondo que, se eu chamasse por Laura, apenas ela atenderia — assim, eu não estaria invocando nenhum outro fantasma para dentro do meu quarto e seria seguro.

Num impulso, olhei meu saldo no aplicativo do banco e mordi o lábio. Eu tinha algum dinheiro sobrando porque era bolsista da faculdade, então só inspirei fundo e comprei. Meu coração estava acelerado e, tentando não pensar nas consequências, coloquei qualquer série de comédia na Netflix. Adormeci entre um episódio e outro.

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O tabuleiro Ouija chegou na semana seguinte, fiquei encarando aquilo o dia inteiro, sem coragem de usar. É claro que eu não brincaria com o tabuleiro durante a noite, então joguei o troço dentro do guarda-roupas e fui dormir — ainda inquieta, encarando as portas do armário, pensando que um fantasma sairia de lá.

Decidi que precisaria superar o medo na manhã seguinte. Aquela era minha última tentativa de falar com Laura, eu já havia tentado de tudo: acender velas, incensos, falar com ela como se fosse uma prece. Tudo.

Então, naquela manhã ensolarada, com a aula de Literatura Brasileira I rodando aos fundos, decidi que o cenário alegre e cotidiano era perfeito para uma partida de Ouija.

Acendi incensos, abri bem as cortinas, espalhei as drusas de cristal que eu colecionava ao redor do quarto. Coloquei o tabuleiro no chão, bem no centro do cômodo, e peguei uma almofada para sentar em cima. Cruzei as pernas, encarando o tabuleiro marrom claro, as letras estampadas na madeira. Inspirando fundo, coloquei a ponta dos dedos no ponteiro.

— Laura? Você pode me ouvir? — pedi suavemente, focando os pensamentos nela, deixando que todas as memórias que tínhamos juntas passassem na minha mente como um filme. Laura rindo, nós duas fazendo guerra de pipoca, maratonando Crepúsculo ou qualquer outra série adolescente de qualidade duvidável. Laura ditando seus textos. Laura sorrindo. Laura dançando. Laura sendo Laura. — Eu sei que você está brava comigo, mas queria que você me ouvisse. Sinto sua falta, preciso dizer tudo o que sinto por você. Preciso dizer que te amo ao menos uma vez, ou sinto que vou explodir. Preciso dizer isso olhando nos seus olhos, porque preciso ver sua reação, saber se é recíproco, preciso explanar todos esses sentimentos antes que me consumam. — Inspirei fundo o aroma de incenso, segurando as lágrimas que ardiam nos meus olhos. — Eu sei que errei, mas fiz tudo o que podia para corrigir. Você precisa ver os comentários sobre seus textos, Lau. São incríveis, você é incrível! Suas histórias são incríveis e emocionantes, preciso que saiba disso. Publiquei porque achei que você pudesse gostar de alguma opinião além da minha. — As lágrimas já estavam caindo neste ponto, limpei o nariz com a manga da blusa. Engoli em seco. Olhei para o ponteiro posicionado no centro do tabuleiro, esperando que ele se movesse, que desse algum sinal de vida. — Lau? Pode me ouvir? — chamei baixinho, já decepcionada. Ouvi um sussurro baixo como resposta, um sussurro tão baixo que as palavras ficaram enroladas demais para eu entender. Ofeguei, tirando as mãos do ponteiro e olhando ao redor. — Lau? É você?

Silêncio. Tudo estava parado. Voltei a olhar para a tábua Ouija, colocando as mãos no ponteiro porque sabia que não deveria deixá-lo sozinho ali. Foi quando senti o toque. Um toque leve no meu ombro, frio e cheio de eletricidade.

— Laura! — exclamei, mas não havia ninguém quando me virei. Um calafrio me fez tremer, resolvi desistir daquela loucura. Faria do tabuleiro uma peça decorativa e nunca mais falaria sobre aquilo.

Anjos Como VocêOnde histórias criam vida. Descubra agora