Talvez tivesse sido minha impressão ou eu estivesse buscando encaixar peças inexistentes para justificar o que não sabia. No entanto, por mais falha que fosse a minha memória fotográfica, eu costumava me lembrar dos rostos quando os via de novo, como se houvesse um estalo no fundo da minha mente. Sobre aquele homem eu estava certa. Eu não sabia seu nome nem o que fazia ali, qual intenção tinha ou qual sua relação com o clã Navarro. Sobre aquela mulher sabia muito menos. Mesmo assim, o casal tinha que ser eles, sobre quem ouvi escondida uma conversa entre Leonor e Liza.
Apesar da distância entre Leonor e eu nos últimos dias, era perceptível que ela estava sobressaltada, para não dizer apavorada. Eu podia observar seus movimentos calculados, suas saídas estratégicas, suas conversas em código com os outros. Embora bisbilhotar não fosse do meu feitio, se eu tivesse a oportunidade seguiria aqueles vampiros. Ou talvez esse fosse meu maior erro e eu caísse em uma armadilha. De qualquer forma, não saber o que estava acontecendo me tirava do sério.
Encarei a minha família, a ponto de encurralá-los, mas eles estavam apenas observando o movimento e até conversavam amenidades. Não pareciam ter notado o casal na multidão. Disse a eles que iria procurar meus colegas de sala e ser solidária. Leonor me disse para ligar imediatamente caso acontecesse alguma coisa. Então ela esperava por isso, mas insistia em não me preparar quando as ameaças estavam na frente do nosso nariz. Se não era importante que eu soubesse quem era eles, também não era importante que eu contasse que já os tinha visto.
Entrei na multidão, mas logo quis sair. O fervor da emoção era insuportável. Mesmo uma vampira cruel como eu me sentia triste e lamentava a situação, ainda mais quando eu quase fui a algoz de uma das vítimas. A família de Laís estava inconsolável, verifiquei olhando de longe. Aquilo tudo estava errado. Aquelas jovens garotas, com toda uma vida pela frente, não deveriam ter morrido. Eu me sentia indiretamente culpada por aquilo. Se não tivéssemos ido para Santa Adelaide não teríamos levado o mal conosco. Andando entre as pessoas eu só conseguia sentir cheiro de morte.
Quando me afastei da multidão, corri até uma árvore e a abracei. Eu não conseguia mais ficar de pé nem olhar para os cartazes ou as camisas com fotos. Eu estava ensurdecida pela dor coletiva e mergulhada nas lamúrias. Sentindo fraqueza em meu corpo, fui sucumbindo ao chão e deitei ao pé da árvore em posição fetal. Por que aquela culpa não passava? Então, alguém se aproximou de mim. A primeira coisa que vi foi os tênis únicos, que eu já havia reparado há alguns dias, um par de All Star do The Beatles. Só poderiam pertencer ao Sebastian, que sempre aparecia quando menos sua presença era desejada. A propósito, não nos víamos desde o sábado. Eu não queria vê-lo novamente nem falar com ele, ainda mais naquela situação.
— Cecília? Você está bem? – perguntou suavemente, agachando-se ao meu lado.
— Onde você estava por todo esse tempo que sumiu? – as palavras apenas saíram.
— Você disse que não queria mais me ver. – fez uma longa pausa – Achei que fosse melhor, então estava te evitando.
— Ah, não importa. – levantei-me do chão. Ele me acompanhou.
— Gostaria de ter te conhecido em outro momento, mas agora... É complicado.
— Realmente não importa, Sebastian! – quase gritei – Estamos nessa droga de cidade com pessoas morrendo, ainda não há culpados e eu sei que isso não vai parar com essas garotas. Eu mesma posso ser a próxima vítima. Sendo assim, as suas desculpas, que sequer chegam a serem desculpas de verdade, não importam.
— Tem razão. – ele baixou a cabeça, chateado.
— Se você quer o nosso bem, é melhor mesmo me evitar.
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[EM REVISÃO] - Uma História Sombria de Amor (Trilogia Entre Vampiros - LIVRO I)
VampirosCecília Navarro é uma vampira de quase 300 anos que mantém escondido seu lado sombrio junto ao clã que a adotou após a sua transformação. Embora odeie ser uma vampira, Cecília sabe o quanto são poderosos, mas não compreende porque vivem fugindo de a...