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LOUIS.

 

  O culto durava das 9hrs da manhã até as 12hrs. Era cansativo, mas eu já tinha me acostumado. No final do culto tiramos fotos e seguimos para o lado detrás para comer. A comida era sempre estranha, soja, arroz, salada, mais salado, muita salada, purê de batata e lasanha de brócolis. O que era algo que eu odiava. Tinha suco, muitos sucos e isso era bom, eu tomava vários.

    — Ei Louis. — Daniel chegou, se aproximando, com seu prato de comida na mão, o encarei. Daniel era o jovem mais bonito da igreja, ele tinha dezenove anos e tinha um cabelo enroladinho, os olhos castanhos e a pele bronzeada pelo sol. Talvez eu reparasse demais nele. Ele era do grupo de louvor, tocava ukulele e violão, e flauta... voltei para a realidade. — Mais tarde vamos comer uma pizza com um grupo de louvor, se você quiser ir, o Liam disse que passaria para te buscar.

    — Ah, pode ser divertido. — Eu sorri pra ele, porque eu não sabia mais o que falar. Podia quem quiser ali tentar puxar assunto comigo, mas eu nunca conseguiria continuar. Apenas com o Liam. Apenas porque ele me conhece. Mas o resto, me dava um grande frio na barriga.

   O restante do dia foi de orações, e todo o mimimi da igreja. Quando deu 18hrs, Liam me ligou e ficou dez minutos tentando me convencer à ir na pizzaria para o encontro do grupo de louvor. Mesmo eu falando dez vezes para ele que eu não era do grupo de louvor e me sentiria deslocado, ele insistiu e disse que as pessoas eram legais (spoiler: não eram)

   Vesti uma calça jeans e uma blusa comum, peguei o celular e vinte dólares. Liam passou cinco minutos depois e fomos andando até a tal pizzaria, onde tinham pessoas em uma mesa do lado de fora.

     — Olá pessoal. — Liam chegou, animado, falando, cumprimentando a todos. E eu fiquei calado, acenando. Puxei uma cadeira na ponta da mesa e me sentei, encolhido e assustado com tudo que estava acontecendo ao meu redor. Com tantas vozes falando de coisas diferentes.

    Conversa vai, conversa vem, e finalmente eles pediram quatro pizzas, acho que iria dar, o fato de que tinham apenas dez pessoas, séria mais que o suficiente. Pediram suco de abacaxi e de limão, e eu fiquei escutando a conversa deles. A pizza demoraria, já que pediram para vir todas juntas.

    — Liam... — sussurrei enquanto cutucava o ombro dele, ele se virou para mim com um sorriso porque antes estava gargalhando. — Eu vou tomar um ar, tá bem?

   — Quer que eu vá com você? — Payne me conhecia muito bem para saber que eu não estava me sentindo confortável, ele provalmente se culparia por ter me arrastado pra cá, mas eu não queria aquilo.

   — Não precisa. — afirmei para ele, forçando um sorriso, e ele me olhou por mais cinco segundos, se olhasse um pouco mais saberia que o sorriso era forçado, e realmente se culparia, mas eu não queria que ele se sentisse culpado, ele já tinha feito tantas coisas para mim, porque eu não poderia fazer para ele também? Então não era nada demais. Eu só preferia se estivéssemos apenas nós dois, e não mais oito pessoas junto, porque assim eu poderia conversar com ele.

    Me levantei. Mas que merda você está falando Louis? Eu deveria parar de ser egoísta e deixar o Liam fazer outras amizades. Não é só porque eu sou antisocial, não gosto de me aproximar das pessoas, não consigo confiar em ninguém, não consigo trocar mais de cinco palavras com outra pessoa, não quer dizer que Liam deve ser assim também. Não é tudo apenas sobre mim. E por pensar assim eu sou um pouco menos egoísta, né?

   Caminhei até a esquina, observei as padarias, os restaurantes e fiquei encostado na parede da esquina, estava mal iluminado e eu tinha que forçar um pouco a visão para enxergar tudo direito.

    — Não acha aqui um pouco perigoso? — Perguntou, e eu conhecia aquela voz, não me recordava até bater os olhos no desconhecido de mais cedo. Engoli em seco.

   — Não, aqui não acontece nada. E eu estou protegido pelo Senhor. — Mais um sorriso forçado. Parecia que todos os sorrisos que eu abria eram forçados, os sorrisos nas fotos em família na igreja, os sorrisos depois do "feliz sábado", o sorriso para ele.

   — Você não sabe se acontece nada. — Ele insistiu. — O seu senhor, tem mais de sete bilhões de pessoas para se preocupar. Acha mesmo que ele vai se preocupar com você?

   Aquilo me fez pensar. Mas eu precisava acreditar que ele se importava e se preocupava comigo, porque era a única coisa que me prendia aqui, a minha fé. Ter alguém, um ser, que realmente se importe comigo. Jesus se importava comigo, e não era um desconhecido que continuava com os olhos verdes que iria me dizer o contrário.

   — Não acredita em Deus? — Perguntei, mudando um pouco o rumo da conversa. Eu não estava pronto para pregar o evangelho, agora não Senhor.

   — Claro que eu acredito em Deus. — ele deu de ombros, se encostando no muro, estava com a mesma roupa de cedo, só tinha tirado a jaqueta, e bandana. — Ele é o meu Pai. Assim como o seu. Mas digamos que eu sou um filho renegado.

   Ele piscou para mim, e aquilo certamente fez meu coração saltitar. Ok, ele tinha algo de muito estranho. E os malditos olhos ainda estavam verdes.

    — Nunca é tarde. — Tentei ajudá-lo, eu poderia falar do amor de Deus e todas as coisas que já ouvi falar na igreja, mas acho que não sou a pessoa certa para falar sobre aquilo.

   — Você não sabe. — Ele deu um passo para frente, ficando afastado do muro dessa vez, seu cabelo batia em seus ombros, quando ele sorria covinhas se formavam em suas bochechas, e lá vou eu novamente, reparando. — A vida é curta, curta demais para dedicar a vida para Deus. Quem lhe garante que ele vai te dar a salvação? No momento de sua morte, você pode pensar... porque não transei mais? E puf, sua passagem para eternidade está perdida.

   Minhas bochechas queimaram, mas pelo menos estava escuro demais para ele notar. Por que ele estava falando essas coisas comigo? Nem sequer sei quem é, ou o seu nome. Os olhos verdes dele foram para a sua direita, como se estivesse enxergando algo, alguém, e ele assentiu. Esse cara é esquisito.

    — Bom, eu preciso ir. — Ele voltou a olhar para mim, meus olhos se encontraram com os seus, azul no verde. — E eu me chamo Harry, Harry Styles. É um prazer.

   Ele disse o nome, como se, soubesse o que eu estava pensando, e então saiu, andando, desaparecendo na noite.

    — Eu sou o Louis. — Falei, mas obviamente ele já estava longe demais para me escutar, e foi claramente uma tentativa falha de me apresentar, eu nem deveria, na verdade.

   Percebi que tinha ficado tempo demais ali, a pizza provavelmente já teria chegado, então resolvi voltar na mesma linha reta que tinha vindo, achando a mesa com aqueles rostos conhecidos, e me sentando na mesma cadeira. Me sentindo novamente desconfortável no meio daquelas pessoas, mas pelo menos agora eu estava comendo pizza.

in the hands of a fallen angel! Onde histórias criam vida. Descubra agora