VII

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Meu corpo é uma prisão

Que me impede de dançar com aquele que amo

Mas minha mente segura a chave

(Arcade Fire - My body is a cage)


Os pregos de cobre da disciplina atingem minhas costas e dói, mas não tanto quanto eu mereço. Tudo dentro das salas de flagelo parece ser feito para aumentar a sensação de desconforto. São pequenas demais. É abafado e sufocante, parece não ter ar o bastante para todos os homens que se castigam ao meu redor. A pouca iluminação disponível vem das velas espalhadas pelo chão. As disciplinas na parede e a imagem de um Jesus crucificado em tamanho real são os únicos adornos do local.

Até onde uma pessoa pode chegar para alcançar o perdão para os seus pecados?

Qual é o limite do seu sacrifício?

Seria coincidência o maior símbolo da fé católica ser um homem torturado, cuspido e morto?

É isso que esperam de mim?

— O corpo é um espaço cheio de culpa, ele o distrai de suas responsabilidades. Você tem que controlar o seu corpo. — Hidan falava para ele mesmo, mas, um a um, os outros iam repetindo suas palavras, como uma espécie de oração de purificação e cura.

É torturante.

Meus braços ficam dormentes e minhas costas doem, mas a cada nova xibatada as vozes em minha cabeça diminuem de volume e anseio pelo momento em que se calarão completamente.

O silêncio é reconfortante e torna a sensação quase hipnótica. Quanto mais bato, melhor me sinto e mais quero me bater. Sei que se eu parar vai doer ainda mais, então continuo até não aguentar mais, porque as vozes não me deixam esquecer a promessa que fiz e nem o quanto minha covardia coloca Shisui em risco.

— Você precisa encontrar o significado da dor. Sem isso, o sofrimento é em vão. — Hidan repete de tempos em tempos, seguido pelos outros.

A dor do meu corpo é tudo que tenho a oferecer a Deus para ser perdoado por todos os pecados que já cometi e que ainda planejo cometer. Se não houver um Deus para me perdoar, então, que eu pague por cada um dos meus erros, sei bem que mereço todas essas chicotadas e muito mais. Só espero não enlouquecer de vez antes.

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Se existisse uma palavra que definisse a minha vida após a visita de Madara, essa palavra seria: difícil.

Era difícil espionar o Papa Hiruzen e planejar a sua morte. Ele é um bom homem e não merece esse destino cruel apenas para que Madara consiga esvaziar os cofres da Igreja sem ser incomodado.

Era difícil me manter afastado de Shisui, mesmo sabendo que era para sua segurança. Era mais difícil ainda estar com ele e perceber que a chama de paixão e desejo em seus olhos aos poucos ia se transformando em decepção e pena.

Uma noite, depois dos castigos, em um momento de clareza nas ideias, procurei Shisui e disse a ele o que já deveria ter falado:

— Nós somos um erro, Shisui. Isso não pode mais acontecer.

Meu tom soou tão assertivo que surpreendeu até a mim. Shisui me encarou por longos segundos, as expressões no seu rosto indo de confusão, a raiva, de raiva a incredulidade, de incredulidade a decepção de maneira tão rápida que era difícil de acompanhar. Até que ele riu. Riu gostoso, como sempre faz quando está feliz — quando está comigo.

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⏰ Última atualização: Jul 21, 2021 ⏰

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