Capítulo IV

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Cidade da Guatemala, Guatemala. 2018

No instante em que o avião tocou o asfalto do aeroporto, Ignácio sabia que deveria trazer toda a experiência adquirida nos anos entre as entidades das piores espécies e agentes dúbios, preparados para lhe jogar aos chacais quando necessário. Danijel e sua nova aquisição, Thymea, serviriam para este propósito: inibir qualquer xadrez imaginário feito pelas pessoas que o contrataram.

Desceram na noite fria de um centro urbano que poderia trazer surpresas aos desavisados: pelo que afirmavam da Guatemala, parecia um quintal mexicano desorganizado. Ainda assim, a cidade que servia de centro político e econômico tinha um ar mais nobre do que os rumores. Nem parecia o país que servia de passagem para imigrantes ilegais que visavam o Norte desenvolvido.

Ajeitou seus óculos, abotoou a gola da camisasocial branca, vestiu o blazer vinho para se aquecer e fitou o horizonte. Quando voltou a si, estranhou a garota de vestido praiano não sentir frio. Talvez fosse nativa de cidades ou países frios,ele deu de ombros. Viu Danijel dirigindo-se claramente ao check-in, quase correndo para buscar as malas.

Os procedimentos e conversa fiada com o segurança não demoraram mais do que vinte minutos e logo estavam em um sedan alugado de uma marca bastante comum da região. Dirigindo, ele preferiu absorver os principais pontos do lugar e seguir o GPS até o hotel onde havia feito sua reserva. Não via a hora de tomar uma ducha e ver uma série na televisão antes de cair no sono.

Tinha outros planos para aquela noite, no entanto.

Estacionando na entrada do hotel, ele se virou para o banco do carona onde Danijel já trabalhava em seu laptop, mapeando alguma coisa.

— Registre nossa chegada e alugue um quarto para nossa acompanhante... — Ignácio retirou da carteira um cartão corporativo. — E a faça comprar roupas novas que não destaquem muito na multidão.

— Eu preferia ficar no meu quarto, já preparando...

— E eu preferia dormir, mas eu tenho outras coisas para fazer. — O homem bronzeado, fruto de diversos trabalhos em locais ensolarados, apertou as mãos no volante, antes de fitar novamente a garota loira que os acompanhou. — Vejo-os mais tarde.

Claramente dispensados, Thymea anuiu para ninguém em particular e saiu do carro. Parou no meio da calçada e olhou para cima. Teria assoviado se soubesse.

O hotel era enorme, maior do que qualquer casa em que já morara, mas não era o tamanho o que mais lhe chamou a atenção. As duas torres, por um momento, lembraram-lhe de casa, da ilha onde vivera a maior parte de sua vida, das irmãs que nunca mais veria, do castelo dos senhores Reagan...

Althea uma vez lhe dissera que havia mais castelos como aqueles na terra natal delas, mas nunca se importara muito com aquilo. Desire poderia ser só um resquício do que Albion era, do que Albion representava para seu povo, porém era só o que ela conhecia. E agora, no entanto, não existia mais, tomada pela fúria das águas que clamou por tantos anos por aquele pedacinho de terra.

Ela suspirou, melancólica.

— É aqui onde nós vamos ficar? Neste castelo?

— Por hora. — Danijel indicou as malas a um dos concierges com a cabeça e dois funcionários vieram ajudá-lo. — Acho interessante você chamar um hotel luxuoso de castelo.

Thymea arqueou a sobrancelha.

— Mas isso — ela apontou — parece um castelo. — Ela olhou mais uma vez para a construção. O hotel realmente lhe lembrava das histórias de Althea.

— Eu e você temos concepções muito diferentes do que é um castelo. — O sino-canadense sorriu. Empurrou a franja do cabelo liso para nãoatrapalhar sua visão e continuou andando em direção ao interior do prédio, com Thymea a poucos passos.

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