Jantar? | 10

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|POV MARINA|

12h50min; reunião com a testemunha do caso Casagrande

Giovana avisou que chegaria em cima da hora, porque estava mexendo com o caso de Robson. Apenas concordei. Desde ontem, parece que nossas conversas ficaram estranhas. Não tem mais aquela naturalidade, mesmo que as únicas interações, desde ontem, tenham sido por mensagem. Nossa conversa fluía mesmo assim. Espero que eu não tenha feito merda. A testemunha ainda não chegou, o que não me ajuda; tenho tempo para pensar em bobagens como essa.
- no que está pensando? - a voz doce de Giovana ecoa pela sala, me tirando de meus devaneios.
- oi. Em nada, não. - me levanto da poltrona, enquanto ela se aproxima.
- sério? Essa cara de pensativa e não estava pensando em nada? - ela joga alguns papéis na mesa.
- estava pensando na vida. 'tá bom para você? - tento quebrar o nosso gelo, e parece que funcionou. Ela solta uma risada, concordando com um aceno de cabeça.
- eu pedi para a Rafaela pesquisar algumas coisas sobre a nossa testemunha. Não é muito, mas já ajuda para saber exatamente o que tirar dela. - ela aponta para os papéis, que leio de longe. - nessa lonjura você não vai conseguir ler. - é, talvez ela tenham percebido os trezentos metros que nos separam. Dou alguns passos, chegando próxima a quina da mesa de vidro. Sou observada por ela, que tem um sorriso leve nos lábios.
- eu também pedi para Gizelly fazer a mesma coisa. - assumo, agora lendo os papéis em minhas mãos.
- eu imaginei. Só estava esperando você dizer. Isso é ótimo, porque estamos na mesma página. - ela desfolha os documentos, delicadamente.
- é ótimo mesmo. - me perco observando sua beleza.
- com licença. - Maria aparece na porta, quase me matando do susto.
- pois não? - Giovana vira-se para ela.
- a testemunha. - ela chama a mulher, que passa por ela e entra na sala. Ela está acompanhada por outra, que creio ser sua advogada.
- boa tarde, doutoras. - a mulher estende a mão, nos cumprimentando. Retribuímos o ato. Fazemos o mesmo com a testemunha. Aponto para as cadeiras, que logo são ocupadas.
- primeiramente, gostaríamos de saber se você aceita que o depoimento seja gravado. - Giovana começa a conversa.
- aceito. - passo um documento para a doutora Camila, que diz que a testemunha autoriza ter seu depoimento gravado. A advogada lê e passa para Natália, a testemunha. Ela assina e me devolve.
- vamos começar do início... Quando e por que você foi contratada para trabalhar na casa dos Casagrandes? - dou o ponta pé inicial do depoimento, agora gravado por uma câmera posta no início da mesa.
- fui contratada no ano mês de março de 2016, após ter conhecimento da proposta de emprego pela internet. - a mulher responde, aparentemente calma.
- quem falou primeiramente com você?- Giovana faz sua primeira pergunta.
- dona Fernanda Casagrande. - Gio anota em seu celular, usando o bloco de notas.
- ok. Isso foi pessoalmente ou via internet? - Teixeira pergunta, e Natália prepara sua resposta.
- foi por mensagens. - sua postura mostra que ela está calma.
- então o primeiro contato é feito por um aplicativo de mensagens. E depois disso? - ela continua anotando, enquanto calmamente despeja perguntas à mulher.
- ela pediu para que eu fizesse uma entrevista. Marcou em um restaurante no bairro deles e nos encontramos lá. - sua postura continua a mesma. Aparentemente, segundo minhas análises, ela não está se sentindo desconfortável; o que é ótimo para nós.
- como foi a entrevista? Ela mencionou sobre o marido, filho ou alguém? - pergunto, chamando sua atenção.
- ela mencionou o marido e o filho. Disse também que tinha um cachorro, e que precisava de alguém que não se importasse com aquilo. - concordo positivamente com a cabeça.
- ok. Partindo para a sua primeira impressão no seu primeiro dia. O que mais te chamou atenção? Você chegou a conhecer o Rodolfo no primeiro dia ou você não o viu? Me conta sobre a interação da família. - pergunto novamente, já esperando uma resposta comprida.
- em primeira vista parecia ser uma família muito unida, que esbanjava harmonia e tinham uma relação estável. Eu conheci o menino e o marido, seu Rodolfo. Foram extremamente amigáveis comigo. Eu não vi nada suspeito no primeiro dia.- ela descreve os momentos com gestos.
- quando isso aconteceu exatamente? Quantos dias depois da entrevista? Você consegue lembrar? - Giovana toma partida novamente.
- no dia seguinte. Ela precisava de alguém rapidamente. - a mulher responde, levando Giovana à anotar novamente.
- os seus próximos dias na casa seguem normais, correto? - peço sua confirmação, chamando a atenção de todas.
- correto.
- quando que você percebeu atitudes suspeitas? - pergunto.
- no dia em que precisei voltar na casa, porque havia esquecido minhas chaves lá. Fazia uns 6 meses que eu já trabalhava lá. Quando fui entrar, ouvi uma discussão. Achei que era coisa de casal e esperei acalmar. Os barulhos pararam, e eu finalmente decidi bater à porta. Seu Rodolfo me atendeu, possuindo um olhar raivoso. Não vi a dona Fernanda, mas tinham algumas coisas no chão. Eu ignorei, já que ele nem fechou a porta da casa e parecia querer que eu saísse de lá rapidamente. - ela descreve detalhadamente.
- a próxima atitude suspeita, por favor. - falo, e ela dá continuidade.
- alguns meses depois desse dia, não lembro exatamente a quantidade de tempo que passou, mas aconteceu de novo. Foi ficando cada vez mais rotineiro. - explica, gesticulando e alternando seu olhar entre eu e Giovana.
- ok. Você presenciou alguma dessas agressões ou somente resquícios delas? - Giovana toma a vez. Estamos sincronizadas.
- eu presenciei. - Natália responde, agora um pouco mais acuada.
- quantas vezes? - minha vez de perguntar.
- três. - seu tom é triste.
- quando foi a última vez que você presenciou? - Teixeira pergunta.
- um dia antes de ser demitida. - a mulher não dá o dia exato, então resolvo perguntar sobre isso.
- você sabe me dizer o dia? - tento soar calma.
- 28 de novembro de 2019. - ela também soa calma.
- ok. O que você presenciou nesse dia?- Giovana indaga.
- eu vi o seu Rodolfo agredir a dona Fernanda. - sua voz é pesada, segurando o choro.
- eu sei que é difícil. Você quer parar por uns 5 minutos? Posso pedir para trazerem uma água para você. - percebo o quanto ela parece ter ficado abalada, e por isso ofereci essa pausa.
- ok. Obrigada. - seus olhos estão marejados.
- eu vou pegar a água para você. - Giovana avisa e levanta-se, indo pegar o copo d'água.

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