Capítulo 6

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O dia trancado no quarto se arrastou preguiçosamente, em um silêncio perturbador. Enquanto Wei Ying tentava compreender a situação em que estava, que, para todos os efeitos, era bem mais difícil do que havia imaginado no começo. E com "começo", ele se referia a apenas algumas horas atrás.

Em pouco tempo ali sua opinião sobre a família e o que acontecia na casa mudou mais de uma vez . De vítimas de seu gêmeo maluco eles passavam para vilões muito rapidamente. A dor em seu pescoço toda vez que fazia qualquer movimento era um claro sinal de que nem tudo é o que parece.

Suas teorias, entretanto, não pareciam fazer sentido com as conversas cochichadas que vinham de trás da porta pesada do seu quarto.

Dizer que Wuxian estava confuso era pouco. Aparentemente ele não era o único.

O que quer que toda aquela confusão representasse, todos o olhavam como se tivesse crescido uma segunda cabeça. "Todos" consistiam em Lan Wangji, a empregada e seu irmão e até mesmo sua "mãe". 

Todos entraram em seu quarto em momentos distintos e por motivos diversos.

A empregada foi a primeira, trazendo seu almoço e remédios. A princípio ela era austera, com uma postura perfeita e cabelos lisos escorridos perfeitamente alinhados e bem presos em sua nuca. Seus tamancos de madeira pareciam ressoar no porcelanato e sua expressão era quase sempre neutra, fora, vez ou outra, quando uma ruga de concentração aparecia entre suas sobrancelhas.

Dá primeira vez em que ela havia entrado no quarto, Wuxian ainda estava adormecido, na segunda, porém, estava sentado no chão gelado, perto da janela grande, os olhos azulados percorrendo a floresta do outro lado da janela distraidamente enquanto tentava entender o que estava acontecendo naquela casa, qual era sua posição e o que deveria fazer para não pisar em ovos, não irritar ninguém.

Quando ela entrou, empurrando um carrinho de metal com o que supôs que fosse comida em cima, percebeu que já era hora do almoço. A mesma lhe lançou um olhar especulativo enquanto posicionava o carrinho ao lado da cama, a saia branca balançava atrás de si com cada mísero movimento, mostrando que o tecido, mesmo para uma empregada, era de boa qualidade e maleável.

— O senhor Wei gostaria que eu trouxesse a mesa até aqui? — Ela perguntou, lançando um olhar ponderado para a sua posição no chão.

Wei Ying piscou os cílios longos, confuso por um segundo, mas logo negou com a cabeça, antes de deliberadamente voltar a encarar a janela quando viu que a empregada se virava para ir embora.No entanto, após alguns segundos encarando o verde do lado de fora, se virou novamente para a cama e reparou que não havia ouvido o barulho da porta.

A empregada o encarava do lado do carrinho, as sobrancelhas unidas em uma expressão que Wei Ying não sabia exatamente decifrar. Quando ela reparou que Wuxian a encarava, neutralizou sua expressão e educadamente inquiriu:

— Não vai comer? Caso você não goste do prato de hoje, posso pedir para que façam outro, mas é seu favorito.

Wei Ying a encarou com suspeita. Depois da noite anterior, com o final inesperado que teve, encarava-os todos como seus inimigos e ter alguém insistindo para que comesse era um sinal bem grande e vermelho, com letras garrafais dizendo "perigo".

— Não tenho fome — murmurou, agora encarando a empregada com cautela. Planejava comer a comida depois, sozinho e sem pressa, agora não tinha tanta certeza — pode se retirar.

Observou a empregada sair do quarto com as sobrancelhas franzidas novamente e, tremendo um pouco, foi até o carrinho.

Mordeu os lábios, encarando os diversos pratos bem elaborados, comida que ele sozinho jamais conseguiria comer. Tudo tinha uma cara boa, que fazia Wei Ying querer abocanhar, se lembrando que a única coisa que teve em mais de 24 horas foi uma torrada.

De novo, se lembrou da noite anterior, quando foi atacado brutalmente por seu meio-irmão e se questionou se não havia um motivo para que seu irmão gêmeo estivesse tão desesperado para fugir dali, porque as pessoas na casa estavam tentando matá-lo.

Era uma narrativa que não batia muito com as conversas que havia ouvido, nem mesmo por parte de seu gêmeo do mal, mas não costumam dizer que uma ação vale mais que mil palavras?

Estava nervoso, mas  agora que estava  de frente para a comida seu estômago roncava de fome. Pegou um pouco dos principais pratos e juntou em um só, indo no banheiro e quase jogando tudo no lixo, antes de decidir que deixaria muitos rastros e virando tudo aos poucos na patente, dando descarga de pouco em pouco e tomando cuidado para não entupir encanamento ou seria facilmente descoberto.

Com tudo finalizado, devolveu as coisas no lugar com algumas sobras, mas faltando o suficiente para mostrar que havia comido.

Ao invés de esperar que a empregada viesse buscar o carrinho, porém, decidiu deixar claro que não queria ser incomodado e empurrou ele mesmo o carrinho para fora, deixando-o em frente a porta e a fechando atrás de si.

No silêncio do quarto, com as costas plantadas contra a porta de madeira, se perguntou o que iria fazer, e acima de tudo, o que diabos estava acontecendo ali?

Para todos os efeitos, seu marido não apareceu até o momento. Segundo o dia anterior, seu sogro lhe odiava, Yanli e Madame Yu eram grandes pontos de interrogação e, obviamente, seu meio-irmão acompanhava Lan Qiren na lista de pessoas que não gostavam de si. Seu cunhado era outra grande incógnita, mas considerando como seu gêmeo do mal agia e o que foi dito, não achava que tinha uma boa moral com ninguém ali, a ponto e ue quando seu meio irmão praticamente tentou lhe enforcar, ninguém veio saber de si, nem seu próprio marido.

Wuxian suspirou, passando os dedos longos pelos fios de cabelo escuro, o coração batendo forte dentro do peito.

Sem mais opções, decidiu se deitar na cama e dormir mais um pouco, antes conferindo o remédio na mesa, mas desistindo de tomá-lo, com medo de que lhe fizesse algum mal.

Sem remédios para dor, foi dormir sentindo a garganta lesionada, mas o cansaço fez com que o sono viesse rápido.

Quando acordou novamente, foi com o barulho de vozes alteradas, mas que de alguma forma mantinham-se contidas, como se discutissem mas não quisessem gritar. Abrindo os olhos, percebeu que continuava sozinho no quarto, mas que por detrás da porta parecia haver uma breve comoção.

NOTA: Cap curto, mas o próximo vamos finalmente ter interações wangxian e algumas tretas, um pouco de infos do passado do wuxian do mal, etc.

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