☆ 04 | Longe de acabar

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Ala médica - Bloco cirúrgico

Ano de 2148 (2 horas e 30 minutos após o Chanceler Jaha ser baleado)


Sangue.

Era tudo o que Blaze conseguia enxergar no abdômen aberto de Telonius Jaha. Quanto mais as horas se arrastavam, menores eram as esperanças de salvar o Chanceler e todos naquela sala pareciam saber disso.

Blaze só se lembrava de uma cirurgia tão tensa quanto aquela alguns anos atrás, quando precisaram tirar um tumor do útero de uma mulher idosa. Abby Griffin sofrera para impedir que a senhora perdesse tanto sangue, mas era difícil trabalhar com alguém com baixos fatores de coagulação; nem todas compressas e pinças hemostáticas do universo pareciam ser suficientes para conter o sangramento. E era ali onde estava o problema. Cada paciente na Arca tinha direito a um número limitado de transfusões. Aquela senhora teve sorte, conseguiu se manter viva com a cota máxima de sangue, mas o Chanceler, por outro lado... Bom, talvez o limite máximo de transfusões não seria suficiente para salvá-lo e se esse fosse o caso, a Dra. Griffin precisaria decidir entre salvar uma vida ou cometer um crime capital.

— Dra. Griffin...? — a voz trêmula de Cleo foi imediatamente procedida pelo aumento dos "bipes" no aparelho de anestesia. — A pressão dele está abaixando muito...

— A bala destruiu alguns vasos — Abby estalou a língua e praguejou baixinho, mantinha os olhos cansados fixos em seu trabalho. — Jackson e Lucas, preciso que me ajudem aqui. Vou suturar esse vaso. Blaze, me passe o afastador.

A garota demorou alguns segundos a mais para reagir. Sua cabeça pesava demasiadamente e sentia seu estômago revirado, como se tivesse comido uma ração fermentada. Ela precisou que Lucas repetisse seu nome para que, por fim, entregasse o instrumento nas mãos da Dra. Griffin. Se a mulher percebeu que Blaze estava presente na cirurgia só com o corpo, ela não pareceu demonstrar, talvez estivesse aflita demais com a vida do chanceler para notar qualquer outra coisa além.

— Preciso que me mantenha informada, caso os parâmetros dele mudem. Me ouviu, Cleo? — Abby tomou o afastador da mão de Blaze e encarou Cleo, certificando-se se ela realmente estava prestando atenção.

Cleo assentiu prontamente.

— Sim, doutora. Deixe comigo.

— Ótimo. Você é meus olhos e meus ouvidos, lembre-se disso. — Abby virou-se para Blaze logo em seguida. — Blaze, querida, sei que está exausta, mas preciso de você ainda, ok?

A garota mais nova confirmou com um aceno de cabeça. Talvez Abby não estivesse assim tão alheia ao resto, como Blaze havia pensado. Não podia negar que estava sim, muito cansada, mas os verdadeiros motivos de estar com a mente distante eram seus pensamentos sobre a estupidez de Bellamy Blake e o interrogatório no final do dia. É claro que poderia dizer quem atirara no chanceler, mas qual seria sua desculpa para estar na cena do crime? O setor 15 era restrito à Guarda e aos engenheiros e Blaze, obviamente, não era nenhum dos dois. Acontece que ela jamais poderia contar o real motivo de estar lá, seria flutuada se o fizesse.

Ela tentou trazer a mente para o presente. Tentou focar 100% de sua atenção na cirurgia e nos comandos da Dra. Griffin, até repassou mentalmente o nome de todos os instrumentos que estavam na mesa diante de si, tudo para poder esquecer o momento ruim que havia passado pela manhã.

Tentou pensar em Monty e no fato de que amanhã era o tão esperado dia de visitas da Skybox. Há quase cinco meses, seu namorado havia sido preso por uso de substâncias ilícitas. Desde então, Blaze e ele se viam uma vez por semana, durante uma hora, sob a supervisão de um guarda da Skybox. Não era um relacionamento fácil, Blaze precisava admitir. Perdera a conta da quantidade de vezes em que chorou pelos cantos, igualzinho uma criança pequena. A falta de Monty parecia comprimir seu peito infinitas vezes, amolecer seus músculos e roubar o oxigênio dos pulmões. A angústia a torturava e havia dias em que Blaze só queria ficar deitada, olhando para o nada, abraçada com a jaqueta de Monty. Mas ela não podia. Era maior de idade e se seus sentimentos interferissem em seu trabalho, ela seria terrivelmente punida pelo Conselho da Arca. A única coisa que fazia Blaze seguir em frente era a esperança de que quando Monty completasse 18 anos, dali a poucos meses, ele tivesse a chance de ser julgado novamente e quem sabe, ser libertado. Era um pensamento bem otimista, quase sonhador na verdade. Naqueles últimos tempos, nenhum jovem delinquente estava ganhando uma segunda chance, todos estavam sendo flutuados no instante em que completavam 18 anos. Mas Blaze não era capaz de cogitar a execução de seu namorado. Não. Monty Green não seria morto e ponto.

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⏰ Última atualização: Aug 25, 2021 ⏰

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