A calmaria antes da tempestade

28 7 17
                                    

–VITÓRIAAAAAAAAAAAAA!!!!!!!!!!! –Levanto da cama em um salto com o grito da minha mãe e olho para o relógio. Merda, faltam cinco minutos pras sete! –VOCÊ VAI SE ATRASAR!

–NÃO VOU! –Berro de volta. Eu já estou atrasada. Pego e visto meus uniformes o mais rápido possível. Enfio os materiais na mochila e calço meu tênis marrom, parando na frente do espelho. Ajeito o uniforme escolar, uma calça azul e uma camisa branca com a logomarca da escola perto da gola e sorrio, estou deslumbrante. Vou atrás de alguma coisa para comer pelo quarto e agarro um pente, desembolando meu cabelo cacheado enquanto reviro a estante onde estudo, enfio na mochila um pacote de bolacha e olho para o relógio, estou atrás...

 –VITÓRIA... EU VOU AÍ TE BUSCAR ÉGUA! –É, é melhor eu ir.

–CALMA!!! –Desço como um furacão pela casa e chego na garagem correndo. Um vulto preto rasga o ar e sou acertada em cheio no rosto. Pego a coisa ainda no ar e afasto um pouco, sentindo meu nariz doer. Minha mãe bate a porta do carro e liga-o, sem me esperar.

–EI ESPERA! –Berro e corro para dentro dele, olhando para a vasilha em minhas mãos. Precisava ter jogado isso em mim? –Precisava disso Carla!? Isso realmente doeu!

–Ah, doeu? Então na próxima vez que você se atrasar vou lançar o chinelo no lugar da vasilha! –Coloco o cinto e suspiro, percebendo seu olhar fixo em mim enquanto dá ré sem sequer olhar trás. –Fez as suas tarefas?

–Fiz. –Respondo, olhando fixamente para a minha mochila. Tento esconder meu medo com um sorriso, mas não funciona. Eu realmente fiz os deveres, porém ainda sinto medo da reação dela. Nos olhamos e ela claramente desconfia de mim.

–Eu vou perguntar de novo, você fez as suas tarefas? –Seus olhos castanhos parecem cintilar e respiro fundo. Minha raiva se sobrepõem ao medo e fecho a cara.

–Quer conferir? –Minha língua parece estalar e o rosto dela é tomado pela fúria. Espero a pior das reações, mas ela se controla e volta a atenção ao trânsito, apertando o volante.

–Vou esperar o conselho de classe falar alguma coisa. E se ele falar algo sobre alguma tarefa não feita, pode dar adeus a seu celular. –Dou de ombros e olho para frente. Fiz todos os deveres, não tenho o que temer, eu acho.

Não falamos mais nada depois disso, apenas encaramos a estrada. Pelo canto dos olhos, observo ela se acalmar, respirando fundo. Somos diferentes em varias coisas, mas se tem alguma coisa em que somos quase idênticas é em como agimos quando estamos nervosas e na aparência. Somos pardas, temos o mesmo cabelo castanho e cacheado, praticamente a mesma altura e... na verdade devo ser uns três centímetros maior que minha mãe, isso porque ela já é bem alta. 

Volto a atenção para frente e pego meu celular, suspirando. Gostaria de evitar brigar com ela, porém isso sempre acontece. Esqueci de fazer uma tarefa e perdi totalmente a confiança dela, o que é um saco. Passo pelas notificações e vejo trinta mensagens, arqueio as sobrancelhas e quando abro elas, disparo a rir.

–Posso saber o motivo da risada? –Minha mãe pergunta ainda um pouco irritada e balanço a mão, desligando o celular sem o responder.

–É o Rodolfo, ele quer saber se aconteceu algo para eu ainda não estar na escola. –Ela balança a cabeça em negação e tento ignorar, pensando nele. Devemos nos conhecer a uns seis ou oito anos, estava com mais ou menos sete anos e agora tenho dezesseis, cerca de nove anos. 

Ainda lembro de quando o puxei para a quadra para jogarmos futebol com nossa turma. Naquela época ele era gordinho e não tinha um pingo de confiança, custei a convencê-lo a bater uma bola. Sorrio com a lembrança, naquela época ainda me dava “bem” com a turma...

CalamidadeOnde histórias criam vida. Descubra agora