Capítulo 1

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Damien

Esperar.

Esperar para que algo aconteça.

O vento soprava em meu rosto enquanto detonava o segundo maço de cigarros apenas naquela noite. O barulho da cidade me acalmava, era quase três da manhã e parecia que o mundo continuava a girar, loucamente, incessantemente, sem parar.

Como eu.

Não havia sono, nem descanso, nem paz.

Os sons que a minha vizinhança produzia eram assustadores, em alguns momentos podia ouvir um som de tiro, em outros uma gritaria desenfreada, palavrões que fariam alguns machões se borrarem nas calças. Pois é, lar doce lar.

Eu ganhava muito bem para um Tenente-Detetive da Homicídios, estava acostumado a lidar com casos realmente terríveis e cenas bastantes sangrentas e assustadoras, nada mais parecia me surpreender ou assustar, como era o caso das cenas de violência que por vezes presenciava em meu bairro, ainda mais que meu velho apartamento de dois quartos era suficiente para mim e muito confortável, não pretendia sair tão cedo dali.

Além disso, eu prezava pela solidão e o fato de ser um oficial da polícia fazia com que todos os vizinhos se mantivessem bem afastados de mim, que era uma benção em meu caso.

Eu gostava de estar sozinho, aprendi a ficar sozinho, às vezes, como agora, parecia que eu iria ficar louco, viajava entre o passado e o presente como quem rebobina uma cena de filme, só que comigo era a realidade vívida e real, não havia paz nunca, talvez fosse esse o motivo pelo qual perdia a vontade de viver dia após dia.

A minha vida mais parecia um filme de terror.

Ainda essa manhã eu havia recebido um caso ao norte da cidade, o pai resolveu cometer suicídio, não suficiente, preferiu cometer um homicídio, atirou nos dois filhos e na esposa enquanto eles dormiam.

Foi uma das piores cenas que eu vi em minha vida. A mãe dormindo em sua cama, provavelmente a primeira a morrer, as duas crianças de dois e três anos deitadas em suas caminhas, um menino e uma menininha, um tiro limpo no meio da testa de cada um. O desgraçado não teve coragem de se matar, ficou brincando de roleta russa com a polícia por quase seis horas, por fim, se rendeu e não acabou com a própria vida, era apenas mais um desgraçado covarde. Sua justificativa para o crime foi de que havia sido demitido e não teria como sustentar sua família, que seus filhos não poderiam viver sem ele e que agora estavam em um lugar melhor.

Eu queria matá-lo com minhas próprias mãos, queria estrangulá-lo eu mesmo, mas a lei não permitia, meu trabalho era apenas o de arrumar provas suficientes para colocá-lo atrás de uma cela para o resto de sua vida.

Apenas.

Respirei fundo.

Não fosse o meu emprego, talvez não houvesse mais nada no mundo para mim também. Eu trabalhava dia após dia para retirar das ruas os piores tipos de seres humanos e mesmo assim não parecia acabar. Para cada um que eu prendia, havia outros dez casos aguardando para serem resolvidos.

Não me importava mesmo ter que trabalhar dia e noite, não havia vida para mim fora deste mundo. Essa era a realidade que eu escolhi viver e ficaria nela até morrer ou até ser morto em serviço.

Mas o que eu mais odiava, o que mais me atormentava, era a quantidade de vidas inocentes perdidas de forma tão trágica e cruel e era nesses momentos, nesses momentos de solidão no terraço do meu prédio, fumando como uma chaminé velha, que eu sentia que precisava receber uma ligação do meu comandante, precisava sair e fazer algo, fazer a única coisa que eu conseguia fazer de melhor.

Dona do Meu CoraçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora