Capítulo 3

573 49 32
                                    




A chuva já havia cessado, e restava somente a neve caindo e o vento batendo incessantemente contra a janela, resultando em um barulho que ecoava pela casa toda. Neil acordou assustado com o barulho, olhou para seu relógio de bolso e constatou que ainda eram cinco horas da manhã, poderia voltar a dormir, e talvez conseguisse continuar o sonho incrível que estava tendo. Em seu sonho, ele beijava Todd, e era beijado de volta. No sonho, Todd confessava gostar dele. Fora o melhor sonho que já tivera na vida. Ele daria qualquer coisa para aquilo ser real.

De repente, ele ouviu um gemido e um braço lhe agarrar. Quase em pânico, ele olhou para o lado, e teve que usar todas as suas forças para não gritar de susto. Todd Anderson estava ali, dormindo na sua cama, e com os braços envoltos em sua cintura. Isso só poderia significar ... Não fora um sonho, tudo tinha de fato acontecido.

Todd estava dormindo profundamente, e não dava indícios que iria acordar tão cedo, e agora Neil com certeza não conseguiria voltar a dormir. Então ele ficou ali, simplesmente olhando Todd, observando sua respiração, e fazendo carinho em seus cabelos, muito suavemente e com cuidado para não acordar o menino. Passados ​​o que Neil estipularia trinta minutos, Todd acordou, e deu um sorriso.

- Bom Dia! - Cumprimentou Todd, com a voz ainda rouca de sono.

- Bom Dia! - Neil deu um selinho, e estava prestes a evoluir, mas Todd o afastou com um tapinha.

- Ei! Acabei de acordar, e não escovei os dentes.

- Eu não ligo.

- Mas eu ligo, e muito - Disse Todd se levantando e indo em direção ao banheiro. Teria que escovar os dentes com o dedo.

Enquanto Todd se demorava no banheiro, Neil levou um choque de realidade. Gostaria de viver para sempre nessa utopia de felicidade, mas sabia que era impossível, não só coisas boas ocorreram no dia anterior. Quase se matara, mais dois segundos e agora ele estaria morto, neste exato momento sua mãe estaria chorando, e dentro de uma hora seus amigos do colégio receberiam a notícia. Sentiu um gosto amargo em sua garganta ao imaginar todos em seu enterro. Mas na hora parecia haver uma única saída, ele já estava infeliz há muito tempo, seu pai nunca o deixava viver, estava cansado demais, não aguentava. Mas ... outra opção, da qual ele chegou até a considerar antes, mas não teve coragem o suficiente. Mas agora teria que ter, era sua única opção.

- Eu vou fugir! - Falou Neil, alto o suficiente para Todd ouvir. Imediatamente a porta do banheiro se abriu.

- Ficou maluco? E para onde você vai? - Perguntou Todd com os olhos arregalados, não tendo resposta de Neil, ele continuou - Você não pensou sobre isso né? E outra, seu pai vai te achar em questão de minutos, ele tem muitos contatos. E você é menor de idade, ele ainda é legalmente responsável por você.

- O professor Keating pode me ajudar - Sentiu que finalmente teve uma boa ideia. Não estava tudo perdido, afinal.

- Ele vai se meter em problemas por isso Neil. Provavelmente vai ser despedido se descobrirem.

- E por isso ninguém pode descobrir - Achou que isso fosse óbvio.

- Ainda acho uma má ideia. Espere até completar dezoito anos, faltam apenas ...

- Não! - Cortou Neil, esperava que não alto demais, não podia acordar seus pais - Eu não consigo Todd. Bom, você não entende.

- Não entendo? - Perguntou Todd ficando irritado - Acho que você se esquece que meus pais queriam que eu fosse outra pessoa, que durante minha vida toda fui comparado ao meu irmão. Caramba, até vocês me compararam a ele quando cheguei.

- Merda! - Xingou Neil, as vezes ficava tão envolto somente em seus problemas, que se esquecia que os outros também tinham os seus.

- Tudo bem, já me acostumei, chega um certo ponto que você simplesmente se contenta.

- Não deveria - Contestou Neil.

- Não deveria o que?

- Se acostumar. Se contentar com uma vida falsa.

- A vida não é sempre como queremos, as coisas simplesmente são como são.

- Novamente, não deveria. Nós mesmos deveríamos correr atrás e fazer nossa própria felicidade, não deveríamos simplesmente nos contentar e esperar que os outros ditem como vivemos. A vida é curta demais para desperdiça-la não sendo você mesmo, curta demais para não vivermos cada segundo sendo o mais feliz possível.

- É, isso faz muito sentido. Acho que a Sociedade dos Poetas Mortos está realmente fazendo bem a você - Observou Todd dando um risinho, o menino deu alguns passos, preenchendo o espaço entre os dois - Eu entendo você, por mais que não eu não concorde muito, eu entendo que você não consiga continuar aqui. Então se fugir é realmente o que você quer, eu estou com você. Sempre estarei com você.

- Sempre? - Perguntou Neil, essa era uma promessa muito séria.

- Sim, sempre - respondeu pegando a mão de Neil e a levando a boca, dando-lhe um beijo. Neil se arrepiou dos pés à cabeça com o gesto - Mas agora você precisa arrumar a sua mala, tenho certeza que seus pais acordarão logo, e se realmente quiser fazer isso, é agora ou nunca.

- Sim, sim. Você tem razão - Concordou Neil, saindo do transe que os lábios de Todd em sua mão lhe proporcionou.

Ele começou a jogar tudo que via frente em sua mala, sua mãe enfartaria se visse, mas bom, ele não tinha tempo. Esse pensamento fez lembrar-se de sua mãe, da qual ele não poderia se despedir. Amava muito a Sra. Perry, e temia que nunca mais fosse vê-la.

- Todd, você poderia pegar um papel e uma caneta, por favor? - Pediu Neil enquanto tentava fechar sua mala. Sua mãe merecia uma carta de despedida - Estão na segunda gaveta da cômoda.

Todd lhe entregou os itens, e ele imediatamente começou a escrever. As palavras fluíram, era como sempre estivessem dentro dele.


Querida mãe,

Quando a senhora ler isso eu provavelmente já estarei muito longe. E sinto muito por isso, gostaria que as coisas pudessem ser diferentes, mas infelizmente não é possível.

Quero que saiba que a senhora não tem culpa alguma, me amou intensamente desde o meu primeiro minuto de vida, e eu lhe amei de volta. E sempre amarei, a senhora sempre estará gravada em meu coração.

Eu prometo que vou ficar bem, então não se preocupe. Apenas não consigo permanecer nesta casa, não com papai.

Vou rezar para que possamos nos reencontrar em breve.

Com todo amor do mundo,

Neil Perry.


Ele deixou a carta em cima da cama. Tinha certeza que seu pai leria antes de deixar a esposa ler, mesmo tendo o nome da Sra. Perry (e somente o nome dela). Mas ele não se importava de fato, só queria que chegasse nas mãos da mãe, seu pai filho da puta podia ler, ele não ligava.

Neil e Todd saíram às pressas pela janela, era alto, mas os dois deram um jeito. O frio do lado de fora quase os congelou vivos, a neve caia sobre eles, então os dois apertaram ainda mais seus casacos contra si. Neil deu a volta na casa para pegar sua bicicleta, e então partiram, Neil partiu para sua nova vida.

É que... e se?Onde histórias criam vida. Descubra agora