So Lee
Cheguei.Eu
Entra, a porta está destrancada.
Já vou descer.Tiro do closet minha rasteirinha bege e o coloco, então vou até o espelho. Tudo certo. Uma maquiagem básica, rabo de cavalo alto porque sinto muito calor com meu cabelo tão longo e grosso. Mas percebo que na verdade não gostei muito dessa calça jeans rasgada. Já usei ela muitas vezes.
Volto para meu closet para procurar outra roupa.
Encontro um vestidinho solto, curtinho e branco. Eu tiro minha regata e a calça e coloco o vestido, o dia está quente então será o ideal.Começo a descer as escadas para encontrar Sook, mas ouço vozes. Com quem Sook estaria conversando?
Minha mãe, James e Ryder estão o dia inteiro indo e voltando da antiga casa deles para trazer tudo que precisam, mas a última vez que chequei a janela de meu quarto vi que o carro deles estava saindo novamente para buscar mais coisas, então não deveria ter ninguém aqui além de Sook a minha espera.- Mesmo? - a voz risonha de Sook soa ao fundo - eu também!
Eu vou até a sala e não encontro ninguém, devem estar na cozinha.
Como eu imaginei, ela está falando com Ryder.
A pergunta é: por que ela está falando com Ryder?Sook está de short e uma camiseta sem alças esverdeada que incrivelmente combina com seus olhos verdes. Ela encosta com os cotovelos na bancada de mármore da cozinha e apoia o queixo na palma das mãos enquanto vê Ryder, sem camisa, cozinhando alguma coisa no fogão à sua frente.
- Devo saber o que está acontecendo aqui? - eu pergunto à nenhum dos dois em particular.
- Nada - Sook responde - Ryder está fazendo um café da manhã para nós.Sook é definitivamente minha melhor amiga, e só por isso eu estou fazendo o maior esforço do mundo para não ir até lá e apertar seu pescoço até que desmaie.
Ela sabe que eu não gosto de Ryder, e como minha amiga ela deveria ficar do meu lado e não simpatizar com ele. Ou mais que simpatizar já que parece estar babando pela barriga sarada dele.- Nós quem? - pergunto entre os dentes.
- Quem quiser comer, Anya - Ryder respira fundo.
- Bom, nós não queremos. Vamos comer no shopping - digo para Ryder.Eu sinalizo para Sook sair de perto da bancada para sairmos logo, mas ela finge que não me vê e nem sequer se move um centímetro.
Ryder, pelo contrário, percebe minha indignação e sorri ligeiramente colocando à frente de Sook um prato com ovos, bacon, torrada e panqueca.- Você tem olhos lindos, So - Ryder a elogia sorrindo chamando-a por seu apelido.
- Não mais que os seus - ela sorri maliciosamente.Se Ryder está pensando que pode roubar as minha amigas agora que está vindo morar aqui ele está muito enganado.
A não ser que ele goste de Sook e realmente queira ficar com ela, eu não poderia impedir isso, poderia? E se ela ficasse com ele e começasse a contar para ele meus segredos? E se ela ficasse com ele e me deixasse sozinha?
Não. Essas coisas nunca aconteceriam, mesmo assim, a palavra "sozinha" ecoa em minha mente.
Sozinha. Como eu fiquei depois que papai morreu. Completamente sozinha enquanto minha mãe paquerava seu novo doutor.Imagens de meu pai deitado na cama do hospital gritando e berrando aparecem em minha mente, e eu não consigo evitar.
Ele está suando muito e pedindo socorro. Está sentindo muita dor. Os enfermeiros tentam me tirar do quarto, mas eu não quero sair, eu quero ficar ao lado dele."Sozinha. Sozinha. Completamente sozinha. Mas, você não está sozinha filha, eu estou aqui. Eu estou bem aqui."
Quando dou por mim Ryder está bem na minha frente perguntando se estou bem. Sook aparece mais rápida que um foguete e me tira quase correndo da cozinha. Ela me puxa pelo pulso até o lado de fora da casa e olha em meus olhos me mandando respirar fundo.
Eu o faço e depois de algum tempo minha respiração volta a ficar controlada e tudo volta ao normal como se nada tivesse acontecido, mas aconteceu, e é uma sensação horrível como de alguém apertando meu peito me impedindo de respirar.
Isso precisa parar, não quero mais me sentir assim.Sook está do meu lado segurando minha mão e me dizendo que tudo vai ficar bem enquanto olhamos para crianças correndo e soltando pipas em um parque aberto que fica quase de frente para minha casa.
- Obrigada por me tirar de lá - eu digo a ela.
Sook sabe que em hipótese alguma eu quero que Ryder saiba da minha situação. Na verdade, eu não quero que ninguém saiba da minha situação. Já tenho problemas demais e não quero que as pessoas comecem a me chamar de louca.
Minha cabeça agora está completamente focada em meu futuro. Na verdade não completamente, mais precisamente está no passado.
Tudo o que passei vendo meu pai ficar pálido, careca, sem cor e sem vida, sem fala e sem movimentos. Minha mãe por diversas vezes tentava me tirar de perto dele, tentava me fazer ir para casa, mas eu berrava, gritava e chorava. Nós passamos por isso durante todos aqueles anos em que ele ficou doente, e eu não quis deixar de vê-lo um só dia, não importava como ele estivesse, não importava que ele estava começando a não fazer sentido e a não me enxergar mais. Eu estava lá, por ele, assim como eu sei que ele estaria por mim.- É claro. Eu não sei o que deu em mim, amiga. Me desculpa por dar em cima do Ryder.
- Não tem problema - minto.Eu não sei o motivo, mas ver eles daquela maneira me deu algum tipo de gatilho e eu não quero que aconteça de novo.
Sook olha para mim como se estivesse tentando me analisar para saber se realmente estou dizendo a verdade ou se me importo que eles fiquem flertando na minha cozinha e na minha frente. É claro que me importo. Só não sei bem o motivo.
Por fim, Sook decide mudar de assunto.- Achei que essas crises tinham cessado - ela diz.
Não contei para Sook que parei de tomar os ansiolíticos que o Dr. Page me mandou tomar porque eu sei que ela seria capaz de enfiar a pílula pela minha goela abaixo caso soubesse. E Sook não sabe que às vezes ouço a voz de meu pai, principalmente quando estou tendo as crises, então como eu diria a ela que parei com os remédios simplesmente para continuar ouvindo sua voz?
- Eu também.
Ryder quase descobriu tudo, ou talvez até esteja desconfiado. E se por acaso eu tivesse um dos ataques no meio da escola na frente de todos? Não posso deixar isso acontecer. Principalmente agora que só faltam três meses para o acampamento de verão e todos os alunos do último ano estarão lá. Mesmo que o acampamento esteja aberto à inscrição de qualquer adolescente, não só para alunos, e que em julho minhas aulas já terão acabado e já terei terminado o ensino médio.. é uma tradição que todos os alunos do último ano em nosso colégio vá para o acampamento de verão Young Spirit, e quero que esses dias sejam sensacionais. Por isso, é imprescindível que ninguém descubra absolutamente nada. E mesmo assim, apesar de tudo isso, eu ainda não estou pronta para voltar a tomar os ansiolíticos e parar de ouvir a voz de meu pai.
Mas e quanto ao acampamento?

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Na batida do amor
Teen FictionNO AMOR OU NA GUERRA, SIGA SEUS SONHOS. Anya viu seu pai morrer com os próprios olhos e isso a abalou de várias formas. Ele era o único que apoiava seus sonhos, agora ele se foi e Anya precisa viver com a ideia de vida perfeita que sua mãe tem reser...