capítulo 3.

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Se passou uma semana desde tudo o que aconteceu, Zoe ainda não tem comido direito. Tentei inúmeras estratégias, até comidas que eu jamais daria a uma criança, mas ainda assim ela não queria nada. Não tem como não ficar preocupada, mas pelo menos ela já estava indo para a escola, e já tinha uma babá fixa, uma senhorinha chamada Odette; muito simpática. No restaurante as coisas também não mudaram muito, a mesma e cotidiana energia caótica. Tony e eu vivíamos igual cão e gato, ele me provocava e eu sinceramente não sou capaz de ignorar; tanto isso se repetiu que todos estavam acostumados e já não se importavam mais.

Hoje, como todos os dias, fui pegar Zoe na escola, e chegando em casa iria para o restaurante. Já com Zoe em casa, escuto meu telefone tocar. Era Odette.

— Alô Odette! Aconteceu alguma coisa?

— Ah querida Pepper, estou um pouco doente, não poderei ir para sua casa hoje, espero que não tenha problemas.

— Tudo bem Odette, acho que terei que levar Zoe para o trabalho. Melhoras para você Detty.

Desligo o telefone, e aviso a Zoe que terá de vir comigo ao trabalho, ela não parece desgostar da ideia, na verdade, se apressa para trocar de roupa e saímos juntas. No carro, eu aviso Maya pelo telefone que terei de levar ela, o que sinceramente não é problema porque a menina mal fala. Maya não parece se incomodar e depois de desligar o aparelho, começo a dirigir. Durante a viagem confesso que encarei Zoe algumas vezes pelo retrovisor, a verdade é que não sei como ela se sente agora, me parece distante demais da realidade para uma criança; indiferente, e isso é certamente preocupante. Enquanto refleti mentalmente sobre o que fazer, o trajeto pareceu mais curto e se completou.

Quando chegamos ao restaurante, à cozinha especificamente, percebi olhares vindo de todos, o que era natural visto que ninguém conhecia minha sobrinha, pois não falo sobre minha vida pessoal no trabalho. Guardo minhas coisas e visto meu avental, de todos os olhares o que mais me perturba é o de Tony, como se quisesse desvendar alguma coisa... maluco. Deixo a menina sentada numa mesa, de onde ela está, se tem uma visão ampla de toda a cozinha. Vou tentar não me deixar levar por comentários hoje, prefiro que Zoe não conheça o meu lado estressado tão cedo, provável que vá se assustar.

Quando me afastei para conversar com May, eu ainda a observava de relance, parecia distraída. Maya é a mais próxima que tenho de amiga no trabalho, e como já sabia parte do que tinha acontecido, decido contar também sobre os problemas que estou tendo com Zoe.

— Eu já tentei de tudo, até iscas de peixe congeladas. E ela não come nada.

— Talvez ela ainda não tenha se acostumado, sinta falta da mãe e da comida dela.

— Não, a minha irmã não cozinhava, nem pisava na cozinha para ser mais exata.

— Com o tempo tudo vai dar certo, logo ela vai começar a se dar bem com você, e comerá sem reclamar.

— Espero que sim May.

Quando volto ao trabalho me sinto mais leve, separo os pedidos, preparo os utensílios, ingredientes, corto, fervo, frito, tempero, monto os pratos... fiz isso na maior paz desta vez, com uma nova tática que criei; consiste em fingir que Tony não existe, e que estou só na cozinha novamente. Depois do terceiro pedido do dia, continuo a preparar o próximo acompanhamento por uns dez pacíficos minutos até Maya me chamar pela segunda vez para ir até a recepção, cumprimentar alguns clientes, e mesmo contra minha vontade, ela me arrasta para lá.

Admito que não esperei mesmo o que vi quando voltei para a cozinha. Tony e Zoe estavam sentados juntos, conversando aparentemente, e ela comendo alguma coisa com macarrão que ele provavelmente havia feito. Entro discretamente e finjo não notar, volto ao meu posto e espio algumas vezes, mesmo depois de ele se afastar, ela continuou comendo até terminar o prato. Eu não sei o que esse cara faz, mas tenho que admitir que sempre me impressiona, ele parece imprevisível.

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