Capítulo 18

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...E quando o almirante deu a ordem de atacar, todos nossos remos tocaram a água ao mesmo instante, os barcos lançaram-se pela baía e se aproximaram das naus desordenadas dos espartanos.
A voz de Serkan reverberava pelo grande anfiteatro. Os membros do Conselho inclinavam-se para a frente nas cadeiras, ansiosos, esperando as palavras seguintes.
- Os espartanos recuaram e remaram em círculos, os remos prendendo uns nos outros - prosseguiu ele. - Nossos homens gritavam para os deuses, enquanto os aríetes quebravam madeira e ossos, os barcos se partiam...
Depois de breve pausa, a voz se ergueu, criando mais dramaticidade.
- Uma depois da outra, nossas naus atacaram. Um a um, os barcos inimigos afundaram ou fugiram.
Murmúrios ergueram-se da platéia.
- Quando estava terminado - a voz de Serkan subiu, firme e sonora - recuperamos cada barco ateniense, e afundamos ou capturamos metade da frota espartana!
Um grande rugido ergueu-se da audiência.
Gritando e agitando os braços, os homens de túnicas brancas saltaram de seus assentos.Os gritos assustaram corujas e pombas, que voaram dos prédios de mármore junto do anfiteatro. Mesmo Péricles, estadista digno como era, estava festejando e deu um tapa nas costas do arconte de cabelos brancos ao seu lado, o velho senhor foi impelido para a frente, recuperou-se e continuou a celebrar.
Serkan ficou parado no plinto enquanto seus companheiros cidadãos dançavam e gritavam. Sentia-se invadido de orgulho pela grande vitória de Atenas, pela coragem e bravura de seus companheiros de armas. Saboreou o momento e a emoção compartilhada por todos, sabendo que nunca mais a experimentaria de novo.
Por fim, a alegria pela vitória deu lugar para as considerações sobre conseqüências que poderiam advir daquele acontecimento, no futuro. Os gritos de alegria tornaram-se discursos excitados, todos pontificando o que deveria ser feito em seguida. Um dos arcontes conseguiu fazer com que os presentes à Assembléia se calassem.
- Temos de mandar emissários ao rei Naxos imediatamente! Quando ouvir-a notícia, ele terá de erguer o cerco!
- Sim! - apoiou outro. - O inverno está chegando e a frota espartana foi destruída. Naxos não tem como receber suprimentos agora.
Fazendo gestos para Serkan descer, Péricles ergueu-se e avançou, preparando-se para dar seu conselho sábio. Os olhos do estadista arregalaram-se, surpresos, quando Serkan fez que não. Virando-se novamente para a multidão, o capitão ergueu a mão, pedindo silêncio e disse, quando os clamores se extinguiram:
- Levarei a notícia pessoalmente ao rei Naxos, hoje mesmo.
- Sim, é adequado que ele a ouça de alguém que estava lá- disse um homem da última fila.
- Isso mesmo - concordou outro.- E é justo que Serkan tenha essa honra.
- Sim, mandem o filho de Alptekin, que foi o artífice da nossa vitória!
Serkan respirou fundo, ergueu as mãos e comunicou:
- Quero que saibam que este será meu último ato como cidadão de Atenas. Amanhã deixarei a cidade, com minha esposa e filha. Nunca mais voltaremos..
Os gritos de alegria terminaram, deixando um silêncio chocado no lugar.
- Serkan! - bradou Péricles, aproximando-se rapidamente dele. - Você enlouqueceu?
- Não, nunca estive mais lúcido em minha vida.
- Não diga mais nada até conversarmos - exigiu o estadista.
Serkan desceu do plinto e fitou-o, com determinação:
- Não há mais sobre o que conversar, velho amigo. Vou levar minha esposa para onde possamos criar nossos filhos como orgulhosos cidadãos do Estado em que vivermos.
- Não pode fazer isso! Este é o seu lar, Atenas está no seu sangue.
- Atenas pode estar no meu sangue, mas a senhora Eda está no meu coração.
Péricles respirou fundo e seus olhos inteligentes, argutos, examinaram os de Serkan por algum tempo. Então, suspirou, vendo que fora vencido.
- Para onde você vai?
- Ainda não sei. Tenho intenção de navegar além das Colunas de Hércules e ver o que há lá, apesar de duvidar que minha esposa vá gostar da viagem. Talvez possamos ir para Massília, na foz do rio Ródano. Ouvi dizer que a terra acima do rio tem belas montanhas altas e muita caça.
Serkan calou-se e estendeu a mão. Péricles olhou para a mão estendida e, então, segurou o antebraço do amigo com força.
- Onde quer que esteja - disse Serkan - saiba que vou orar para os deuses protegerem você e a nossa cidade.
- Não tenho qualquer chance de dissuadi-lo dessa decisão?
- Não.
A mão de Péricles apertou com mais força.
- Então, que os deuses lhe deem paz.
A risada de Serkan aliviou a tensão entre eles:
- Terei minha esposa junto de mim. Duvido que vá ter muita paz... Adeus, amigo. Vou mandar notícias sobre a resposta de Naxos quando eu lhe der as notícias que trouxe.
Ele deixou Péricles parado junto do plinto, as sobrancelhas grossas quase unidas, tão preocupado estava.

A Escrava de AtenasOnde histórias criam vida. Descubra agora