Ainda estávamos no meio do verão. Mário havia se mandado com a atual namorada - uma Cubana esquisita que finge que eu não existo- e ninguém sabe pra onde foram. Bruno achava que ele tinha ido embora de vez, pois levou praticamente todas as roupas que tinha, já eu, achava que só estavam rodando por ai, transando, usando drogas, vivendo a juventude. Justo.
Os dias estavam cada vez mais quentes e faziam quase duas semanas desde o meu "encontro" com o Oscar no quintal. Aquilo havia mexido com a minha cabeça, e eu só conseguia pensar em Freeridge. Confesso que também pensava muito em Oscar, no quanto havia mudado, amadurecido..no quanto parecia um homem. Quando o conheci, tinha acabado de chegar no país e mal falava inglês. Éramos do mesmo colégio, porém de turmas diferentes pois além de ser mais velho que eu, ele havia reprovado algumas vezes. Já estava quase terminando os estudos e eu ainda estava entrando no ensino médio. Oscar era muito paciente comigo. A maioria dos alunos era um poço de preconceito com imigrantes, como nós, e isso aproximou a gente. Era nós por nós.
Ele me levava em casa todos os dias após a aula, me chamava pra ficar á toa na porta da sua casa, conversando, jogando cartas. Pedia sempre a minha ajuda para organizar festas, e eu obviamente sempre ajudava. Éramos carne e unha, e ele era o meu "protetor". Tudo isso mudou quando, certa noite em uma das festas enormes que ele deu, bebemos muito e em questão de segundos estávamos transando em seu quarto. A partir daí, a gente se evitava. Não era aquela ideia clichê de "transar e sair fora". Nós dois simplesmente não conseguíamos mais conviver como amigos, depois do que havíamos feito. Oscar foi o meu primeiro, e não que eu me importe muito, mas não foi especial como eu esperava. Ele não foi tão carinhoso, eu não era - nem um pouco- experiente e ambos estávamos bêbados.
Ri sozinha ao me lembrar de tudo isso. Fiquei imaginando como as coisas estariam em Freeridge.
-Yolanda me deu bolo. Tá afim de ir num evento? - Bruno diz, se aproximando de mim na varanda de casa, ficando em pé ao meu lado, se apoiando na mureta.
-Quem é Yolanda e que evento é esse?- Perguntei confusa enquanto soltava a fumaça do cigarro.
-Se ela me deu bolo, não é mais importante -Respondeu rindo nervoso- É um evento de Lowrider. Acho que você vai curtir.
-Eu não tenho um Lowrider Bruno, qual a graça?- Dei de ombros.
-Qual é o seu problema? Eu tenho um Lowrider por acaso? Óbvio que não! O evento é justamente pra gente curtir e conhecer os carros de OUTRAS pessoas. Para de ser chata, garota. - Disse nervoso.
O olhei com a sobrancelha arqueada, desdenhando do seu chilique
-Você consegue ficar mais feio ainda dando esse chilique de puta. -Ri enquanto levantava e jogava a bituca do cigarro longe. - Que horas vamos? - Passei por ele enquanto entrava em casa.
-Você é estranha.- Bruno falava enquanto apontava pra mim, rindo forçado. - Começa as 23h, são dois ônibus até lá... isso significa que vou começar a me arrumar exatamente as 23h.
-Dois ônibus? Devia ter perguntado antes de aceitar. Já tô me arrependendo. Onde vai ser?
-Lembra do parque comunitário né? Duas ruas acima, próximo ao posto de combustível tem uma rua enorme.
-Ah, já sei. A rua que dá fundos para a igreja não é? Escolheram o lugar perfeito pro evento -Falei rindo- A igreja vai adorar um monte de gente fumando um baseado e mijando nas paredes deles.
Por um momento me lembrei de que o parque comunitário era em Freeridge.
-Ninguém vai ligar Rosalina -Bruno me chamava assim quando queria zuar com a minha cara. Eu odiava, me sentia uma idosa sendo chamada de Rosalina- Além do mais, tenho certeza que o padre não dorme na igreja. -Finalizou enquanto se jogava no outro sofá.
Ficamos em silêncio por um tempo. Bruno era mais legal que Mário. Quer dizer, os dois eram um saco, mas Mário era egoísta e conseguia magoar a gente quando queria. Era ignorante sem necessidade e vivia sumindo. Bruno falava mais comigo e, vez ou outra a gente conversava sobre a vida de forma séria. Os dois tinham o mesmo problema: mulheres. Não conseguiam segurar o pinto nas calças e viviam se ferrando por conta disso. Já perdi as contas de quantas vezes tive que separar duas barangas aleatórias se batendo na sala de casa, por causa deles.
- Afinal, quem caralhos é Yolanda?- Perguntei deitada no sofá, olhando pro teto.
-Filha do Hopkins.- Respondeu dando de ombros enquanto mexia no celular.
-O oficial Hopkins ou o Hopkins vizinho esquisito? Perguntei tentando me lembrar
-O Oficial, e os dois são esquisitos -Respondeu rindo
-Eu não me lembro del.. MEU DEUS - falei alto - a Yolanda é a mais nova ou a mais velha? -Disse indignada, me lembrando das duas filhas do oficial.
-A mais velha -Bruno ria enquanto rolava o feed do Instagram.
-Bruno, que nojo. Você se superou dessa vez. Ela já tinha deve ter uns 35, eu hein.
-Você não entende, não é pela idade, isso não importa. -Bruno ria malicioso, se divertindo com a minha indignação.
-E você ainda diz que eu sou a estranha, bizarro. Ela deve te ver como um bebê.. se isso não importa, não sei o que importaria- Comecei a rir, zuando com a cara dele.
-Isso, minha irmãzinha, é o que importa. - Levantou a mão com o celular em minha direção, me mostrando um par de peitos enormes que provavelmente ela havia enviado pra ele.- É sobre isso!- Se levantou rindo da minha cara de nojo enquanto ia para a cozinha.
-Merda, você é realmente nojento.- Finalizei indo pro meu quarto.
Já se aproximava das 23h e, ao contrário do combinado, Bruno já estava pronto, e me apressava igual um idiota.
-Da próxima vez é só cumprir com os horários, você disse que ia começar a se arrumar as 23h e não estar pronto pra sair.- Falei irritada enquanto tentava fazer mais um furo no meu cinto. - Merda, não consigo!!- Disse nervosa.
-Você é burra ou se faz? É um cinto de couro! Não vai furar fácil assim.
Empurrei Bruno pra fora do quarto e bati a porta. - Espera na sala! Quando estiver pronta eu desço.
Apesar de ter algumas maquiagens, eu nunca aprendi a fazer uma decente. Prefiro usar apenas o básico. As vezes me comparo com outras meninas e me sinto inferior. Todas parecem nascer sabendo fazer um delineado, escolher o tom certo de base e outras coisas, menos eu. Sendo assim, optei por usar apenas um rímel e fazer um penteado um pouco diferente. Não tenho muita paciência para alisar o cabelo, as vezes saio na rua com ele molhado mesmo, e assim o fiz.
Vesti uma calça bege com um cinto -de fivela, pois não consegui furar o outro- e uma camiseta preta amarrada na frente. Como sempre, meti duas argolas na orelha e já estava pronta. Não tenho o costume de usar bolsa, então enfiei tudo que iria levar nos bolsos. -Merda!- Disse. - Acabou meu cigarro.
Abri a porta silenciosamente e passei pelo corredor. Pude ver Bruno sentado no sofá, completamente concentrado enquanto bolava um baseado. Deslizei pra dentro do seu quarto e comecei a vasculhar as gavetas. - Merda!- Disse novamente- Qual é o problema desse garoto? Que tipo de pessoa com menos de 90 anos fuma cigarro de menta? Eca!- Falei irritada enquanto pegava alguns soltos de dentro do maço.
- Bora, o caminho é longo, e vai ser mais longo ainda se nenhum motorista nos der carona. - Falei enquanto dava um tapa no pescoço de Bruno e seguia em direção a porta.
-Você pede a multa!- Falou me seguindo
-Nem vem, eu sempre peço. O motorista do centro já marcou minha cara e não me dá mais carona. - Respondi me lembrando de todas as vezes em que pedi a famosa multa e os motoristas de ônibus negaram.
-Você é mulher, eles sempre dão carona - Bruno disse balançando a cabeça como se fosse óbvio.
(...)
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Como la flor, con tanto amor. - On my block
FanfictionRosita mora em um bairro extremamente marginalizado de Los Angeles. Compton. Ela pensa que o reencontro com um antigo amor era o suficiente para mexer com sua cabeça, até que alguém sai da cadeia, fazendo tudo virar de cabeça pra baixo.