Jack

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Pensar que já se passaram dois anos.

Dois longos anos longe de casa, naquele campo de guerra e de morte. Longe de tudo que um dia eu chamei de rotina. Longe das pessoas com quem me importo, e que se importam comigo. Longe de minha família, meus amigos, meu professor, meu lar.

Eu queria poder dizer que agora que voltei, tudo será como um dia já foi. Gostaria de dizer que eu e Liza, minha irmã, vamos poder brincar juntos, conversar, e chutar a quantidade de horas que faltavam para nosso pai terminar o serviço e passar as tardes e as noites conosco em casa, contando as melhores histórias da Guarda de prata. Gostaria de ouvi-lo dizer que se orgulha de mim, e que um dia eu e Liza iríamos tomar a responsabilidade de proteger nossa facção, como ele.

Mas esse dia não vai chegar, nada voltará a ser como era, porque meu pai está morto.

Não. Eu matei meu pai.

Com esses pensamentos amaldiçoados, meus sentimentos ficaram confusos, pois Liza abriu a porta, me viu ao lado de fora, e derrubou um vaso de planta que carregava. A sensação de felicidade ao vê-la misturou-se com a culpa de saber que por minha causa, ela jamais veria nosso pai outra vez. Mas não pude deixar de derrubar uma lágrima de emoção quando ela repentinamente me abraçou, com tanta força que meus pulmões ficaram sem ar.

— Eu pensei que eu nunca mais fosse ver você, Jack, nunca.

Ela disse, acariciando meus cabelos roxo escuro de forma protetora, como nossa mãe fazia, enquanto lágrimas caiam sem parar de seus olhos. A culpa consumia meu âmago, mas juntei toda a minha vontade e consegui responder, disfarçando a voz trêmula:

— Estou em casa, Liza.

Olhando para ela, notei que estava diferente. Os cabelos antes curtos agora haviam crescido, além de terem sido amarrados em tranças. O rosto, embora delicado como sempre, agora era mais maduro, como o da adulta que ela se tornara alguns meses atrás, no mesmo dia que eu. Podia ser a mesma Liza de sempre, com seu espírito altivo e orgulhoso, mas agora era definitivamente uma mulher muito mais responsável.

Ficamos abraçados por um tempo, em silêncio.

— Vamos nos sentar no nosso lugar? Parece que não vou lá faz dois anos — Eu respondo, sarcástico.

— Eu te bateria agora mesmo, se não estivesse tendo uma crise de felicidade espontânea – Ela responde sorrindo, enquanto enxuga as lágrimas – Vamos.

Indo em direção a árvore que ficava na ponta da colina, em frente a nossa casa, a primeira coisa com que me deparei foi que eu lado dela jazia um túmulo. Me aproximei e li, esculpido com grande delicadeza: "Em homenagem a Jack Murasaki".

— Uau, você não brincou quando disse "pensei que nunca mais fosse te ver" – Eu comento, um pouco envergonhado.

— 2 anos desaparecido, ainda mais na Noite Vermelha, o lugar mais perigoso do mundo. Nem posso acreditar que você está vivo – Liza fala, dando um leve sorriso enquanto olhava para o túmulo.

Após essa frase nós olhamos juntos para o horizonte, de frente a mais bela visão de Yukiyama, a capital da Ilusão, lar dos misteriosos portadores de ilusões, como eu e minha irmã.

A neve caía lentamente nas casas de madeira de pinheiro, distantes no horizonte, enquanto o Sol se escondia detrás das enormes montanhas nevadas. Era possível ver ao longe as pessoas, tão pequenas e distantes, passeando pela rua, brincando com a ilusão de uma cidade perfeita. Quase deixei cair uma lágrima, pois a muito já havia esquecido como esse lugar me era importante.

— Jack... Por mais que eu queira saber o que você viu lá, agora não me importo com outra coisa além do seu estado. Não sei o que você presenciou, mas só de olhar seu semblante sei que você precisa de tempo, e descanso.

O coração de açoOnde histórias criam vida. Descubra agora