Jack

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Olhando para a porta, me deparei com meu mestre, Chris, encostado nela. Ele sorriu enquanto segurava sua espada, que raramente era vista fora de suas mãos. Sam e Karol, em respeito, abaixaram as cabeças, e pude perceber um certo temor vindo deles, afinal, não é sempre que se fica frente a frente com o Sumo Comandante.

— Por favor, é um momento de felicidade, não precisam das formalidades — Seu sorriso se suavizou, e ele entrou no quarto.

O Sumo Comandante, o Governador Boreal, O Emissário Divino. Esses eram apenas alguns apelidos para o homem mais forte do mundo, Chris Salazar. Sua mera presença dentro do quarto irradiava uma sensação semelhante a de receber os raios de Sol, além do mais puro estado de calma e segurança, pelo menos, para mim. Ele se aproximou, pondo a mão que não segurava a espada em meu ombro direito, e então se sentou ao meu lado.

Meus dois amigos seguravam o ar perto da lendária presença que casualmente se acomodava entre eles. Sam, nervoso demais para continuar no local, diz com a voz trêmula:

— S-s-senhor S-sumo Comandante... receio que vocês tenham muito a conversar! V-vamos lá embaixo arrumar a mesa para comer, Karol!

Sam nem precisou puxar ela pelo braço, embora tenha tentado. Ambos rapidamente se curvaram em respeito e saíram às pressas do quarto, deixando a mim e meu mentor a sós.

— E então Jack, dois anos lá na Noite Vermelha, hein? Você deve ter passado por maus bocados — Ele diz, retirando sua mão do meu ombro e a apoiando na espada, virada verticalmente em seu colo — E aí, encontrou?

Eu sabia do que ele falava, sabia com perfeição, e queria evitar com todas as forças falar sobre isso. Mas ele era meu mentor, me treinou por anos na esperança de me ajudar em minha missão. Eu devia isso a ele.

— Encontrei... Ele...Eu...

Não consegui arrumar mais forças para dizer, embora quisesse.

— Não continue. Posso imaginar o que você viu lá, e pela forma como você diz, imagino que não seja fácil dizer, então não pense nisso agora. Você está aqui, fedelho, é isso que importa agora.

Eu me surpreendi quando ele pôs sua mão desocupada em meu cabelo, e então o acariciou de forma protetora. Não pude deixar de soltar um leve sorriso, porque melhor do que rever meu mestre, era ouvir que ele estava feliz em me ver, o que para ser sincero, era raro.

— Não pretendo atrasar a refeição. Vamos comer, vai te ajudar a repor suas energias.

Teremos muito tempo para conversar em outras ocasiões — Ele se levanta, e então sai do meu quarto.

Por alguns momentos eu fiquei sentado, refletindo sobre esses momentos felizes, que achei que haviam se perdido para ficar só nas minhas memórias.

Eu vesti minha camisa surrada, mas deixei meu manto e meu chapéu circular em cima da cama, e então desci para me reunir com meu grupo.

Mal havia pisado nas escadas, e meus olhos se encheram de lágrimas com o odor que senti. Correndo para baixo, eu gritei:

— Missoshiru?!

O cheiro da minha comida predileta rodeava meu corpo, me enchendo da mais pura alegria. Corri para me sentar à mesa, onde todos me aguardavam com um sorriso.

— Sempre comemos neste dia do mês, já que era, ou melhor, é a sua comida favorita. Embora não seja uma refeição... — Karol diz e solta uma risada de deboche.

Não esperei qualquer cerimônia que fosse, tomando a sopa com voracidade.

— Jack, você vai com eles? — Liza me perguntou repentinamente.

Lembrei-me que não tive tempo de perguntar sobre a estadia de meus amigos, então os observei, esperando que alguém esclarecesse a situação.

— Ah, é. Eu e Karol pretendemos passar a noite e partir amanhã de volta ao acampamento. Seria legal ver a cara de surpresa do Zack e do Haz, mas a gente entende perfeitamente se quiser ficar aqui com a Liza — Sam, que sempre sorria, sem parar, dessa vez dá um sorriso de compreensão. Estranhamente, ele tinha os mais diversos e específicos tipos de sorriso, como esse.

Eu ia responder e dizer que queria ficar mais, mas minha irmã, me conhecendo, mal me deixou tirar o ochawan da boca para falar e disse:

— Quero que você vá, sem discussão. Não é justo que eles não saibam sobre você, maninho. Mas me prometa que todos vão voltar dentro de uma semana, vou pedir uma refeição especial!

Chris, que estava calado até o momento aproveitando a sopa, suspira.

— Eu vou até Hong Chun Li, deixo vocês no acampamento no caminho. Conheço um atalho para a vila ao lado da caverna.

Ao ouvir isso, Sam e Karol deram um leve sobressalto. Se um deles tinha a intenção de ser contra, não teve coragem de argumentar.

Terminado meu lanche, eu me levantei. Ou ao menos tentei, porque o cansaço de antes retornou de surpresa. Ao lado de minha irmã, vi uma fumaça negra em forma de uma pessoa, que sorria para mim. A sombra atravessou a mesa, tocou em meu ombro, e então pude ouvir, como um sussurro: "Diga olá ao Rubro". Logo em seguida, eu desmaiei.

Acordei no dia seguinte em minha cama, me deparando com Liza dormindo sentada em uma cadeira, ao meu lado. Quando me levantei, ela abriu os olhos rapidamente. Às vezes me assustava com o quão leve podia ser o sono dela.

— Você deu um susto na gente ontem, apagou como se tivesse sido nocauteado... e parecia assustado.

Eu me sentei na cama, pensando sobre a visão de ontem.

— Erro de Lótus? — Ela pergunta.

Erro de Lótus. Quando ocorre uma ativação involuntária das glândulas alucinógenas de um portador de ilusões, causando delírios... era raro, mas muito incômodo.

Eu aceno, fazendo sim com a cabeça. Mas antes que ela falasse algo a respeito, eu logo me pronunciei:

— Liza, eu cheguei ontem, tem certeza de que não quer que eu fique? Afinal, também senti sua falta — Eu falo, dando um sorriso sonolento.

— A decisão não é minha. De qualquer forma, passei dois anos sem você, o que é uma semana? — Ela sorri de volta — Eu já lhe disse minha opinião.

Liza tinha razão, era só uma semana, e certamente Zack e Haz iriam preferir receber a notícia de mim.

— Eles estão na sala, caso esteja se perguntando, esperando você acordar — Minha irmã então se levanta, vai até a porta, e antes de sair, continua — sem pressa para pensar.

Eu pensei. Não por muito tempo, mas suficiente para decidir ir junto. Meu pai iria querer que eu fosse, e quem sabe... quem sabe eu possa me redimir, ajudar as pessoas que eu puder. Não que vá diminuir meu erro, mas quem sabe me ajude a ter paz.

Ele certamente gostaria.

Eu peguei a mochila a qual cheguei, com alguns mantimentos, vesti meu manto e chapéu, guardei o par de lâminas em suas respectivas bainhas, e fui ao encontro deles. Não dei tempo de Sam e Karol falarem sobre eu estar acordado, e disse, assim que apareci nas escadas:

— Estão olhando o quê? Zack e Haz estão esperando, vamos!

E assim fui o primeiro a sair de casa, e olhando para trás, pude ver os sorrisos de Liza, meus amigos, e meu mestre, que logo vieram atrás de mim após pegarem seus pertences.

Sinceramente, eu cheguei pensando que ficaria mais alguns dias, mas o que posso fazer? Parece que a aventura me chama.

Uma aventura curta, mas que me levaria a rever meus amigos de longa data. Aposto que devem ter vivido as maiores loucuras durante esses últimos dois anos, mal posso esperar para ver tudo que eles têm para contar!



Opa! Luci aqui! E assim nossa aventura começa, obrigado a todos que estão lendo! Como acham que essa aventura continuará? 


O coração de açoOnde histórias criam vida. Descubra agora