Torta crocante de doce de leite - espero que não seja óbvio

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IV. Torta crocante de doce de leite — doentiamente doce; eu espero que não seja muito óbvio.

Então elas trocaram números.

— E daí?

Yachi mordeu o lábio inferior, tentando concentrar toda a sua atenção em esmagar os biscoitos no balcão e ignorar a risada escandalosamente vitoriosa de Hinata.

— Todo mundo troca números hoje em dia. Não é nada especial. É a era da tecnologia, né?

— ...Qual foi a última coisa que ela te mandou?

Yachi bufou, unindo as sobrancelhas, sentindo o rosto esquentar ao responder baixinho, sem olhar para o amigo.

— Ela me ligou hoje...

— ...E o que ela disse?

Droga, Hinata, só deixa pra lá.

Ela completou rapidamente: — "Bom dia."

De novo, a gargalhada do ruivo ecoou pela cozinha.

— O que eu disse? O que eu disse? Hm?!

Yachi bateu uma última vez o rolo de cozinha sobre o saco de farelos, querendo nada mais do que virar um avestruz, enfiar a cabeça no chão e nunca mais sair dali.

A conversa no ponto de ônibus havia corrido bem.

Na medida do possível.

E no momento de êxtase dado pela explosão de adrenalina assim que havia chegado em seu apartamento, é claro que ela ligou para Hinata e contou cada detalhe.

E é claro que Hinata nunca poderia deixá-la sobreviver ou esquecer disso.

Como se a própria voz na sua cabeça já não bastasse.

Kiyoko é uma dançarina e o estúdio onde tem aulas acabou de abrir um novo departamento perto de lá. É por isso que ela tem aparecido mais no café. Kiyoko não namora o rapaz que a deixou no ônibus, na verdade, ele tem um namorado extremamente fotogênico que é professor do fundamental. Kiyoko não gosta de doces. Kiyoko gosta de pássaros. Kiyoko é capricorniana.

Kiyoko disse que está curiosa para provar sua torta de chocolate amargo.

Ela guarda essas pequenas informações como segredos, guarda perto de seu peito como se esses fossem os ingredientes mais preciosos para uma receita que Yachi quer só para si.

— Por favor, não lambe a colher que eu vou usar... — ela avisa, ao mesmo tempo que querendo mudar de assunto também abominando a ideia de ter que procurar outra colher só porque Hinata não consegue esperar.

Ele deixa o utensílio de lado com um biquinho infantil, como uma criança pega pela mãe comendo doces antes do jantar. Ele se vira e senta no balcão, tomando cuidado para não esbarrar em nada posto por Yachi previamente.

— Então vocês já estão no nível de ligação?

Yachi revira os olhos de forma meramente teatral, tentando evitar dar muita importância porque haha, ligação? De celular? Isso é algo que todo mundo faz. Né?!

A verdade é que assim que a ideia foi sugerida por Kiyoko, o planeta terra poderia muito bem ter parado de girar e todos morreram rapidamente, inclusive Yachi, e tudo depois disso era apenas uma fantasia criada por um cérebro lentamente desligando-se.

Com as mãos trêmulas ela atendeu a chamada. E elas conversaram.

E assim repetiram-se os dias. E os dias tornaram-se semanas. E agora, huh, olha só, Yachi esperava uma ligação todo dia, às nove da manhã em ponto (porque era o horário que Kiyoko saía de casa), dizendo-lhe bom dia. E, se fosse sortuda, poderia até mesmo ter uma antes das dez da noite, a voz cansada de Kiyoko lhe contando sobre seu dia e, ei!, perguntando sobre o dia de Yachi.

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