III. Torta de chocolate amargo — não é exatamente doce, mas... não é tão ruim assim, não é?
Então ela queimou o quiche.
Uma, duas, três vezes.
E talvez a ponta dos seus dedos também tenham sofrido um pouco.
Mas eventualmente, e previsivelmente, Yachi Hitoka conseguiu.
No fim, ela estava pensando demais nas medidas. Nos ingredientes. No posicionamento. Não; aquele quiche tinha- precisava ser simples. Não era preciso pensar demais, complicar demais. Apenas começar a andar, mesmo que com um passo tímido. Tudo o que era preciso era colocar as mãos na massa.
(Literalmente).
E, ei, ela nem tinha feito só porque Shimizu Kiyoko não gostava de doces (Kiyoko, Kiyoko, Kiyoko, ela repete de novo e de novo e de novo esperando em vão que o nome vá perder o sentido e o seu gosto bom). O problema era bem maior que esse; Yachi sempre esteve acostumada demais na sua zona de conforto. Precisava diversificar um pouco, arriscar um pouco, não? Shimizu havia sido nada mais do que um pequeno empurrãozinho.
Nada mais do que um empurrãozinho... Nada, e não havia nada de algo a mais na constrangedora interação trocada anteriormente.
Nada mais. Nada mais. Nada mais.
Por favor acredite nisso. Aperte com mais firmeza a mochila surrada no seu colo se for preciso, prenda a respiração, mas não olhe, definitivamente não olhe para a sua direita de novo. Abaixe a cabeça, pense no desconforto da sua meia suja de clara de ovos secas (nota mental: não deixar Hinata misturar mais nenhum ingrediente na cozinha sem uma supervisão minuciosamente próxima de cada ação)
Mas Yachi Hitoka era apenas humana, afinal.
Naturalmente, ela cai em tentação.
Hinata é um demônio com poderes sobrenaturais originário diretamente da camada mais profunda do inferno, é isso. Porque ele havia sido quem havia insistido para fecharem a loja mais cedo, uma desculpa qualquer sobre precisar fazer um trabalho — obviamente mentira, visto que Shimizu Kiyoko estava, sem aviso prévio, sem motivo aparente nenhum, dividindo a parada de ônibus com Yachi (e Yachi havia pegado o ônibus desse horário antes, havia sim. Mas essa era a primeira vez que havia visto a garota nessa área. Tinha que ser a primeira. Yachi com certeza teria notado caso não fosse). Leggings escuras, uma camiseta amarela coberta por um casaco grosso, uma bolsa mala de alças longas equilibradas no seu ombro. Rabo de cavalo, mais uma vez.
De tirar o fôlego — mais uma vez.
Yachi era apenas humana, mas, sério, parabéns para ela por conseguir se segurar completamente quieta por pelo menos uns quinze minutos, ok?
Era tão difícil distinguir o certo do errado quando olhar para ela era tão bom.
No entanto, naquele dia, Shimizu não estava sozinha. Ela havia vindo caminhando com uma outra pessoa.
Um rapaz.
Eles estavam rindo e conversando e criando piadas internas que Yachi nunca iria entender. Ele era alto, tinha cabelo castanho, uma risada contagiante e era tudo que Yachi deveria ser antes de sequer ser permitida a estar no mesmo ambiente que Shimizu. Yachi assiste pelo canto dos olhos com a sua complexa companheira chamada culpa, medo e outra emoção que não tem o direito de ser mencionada; mas ela não pode só desviar o olhar para o outro lado até que o ônibus chegue, ela simplesmente não pode, porque assim que ela deixar de prestar atenção, mesmo que minimamente, Shimizu e o rapaz vão começar a se beijar apaixonadamente e ele vai pedi-la em casamento e eles vão sair do Japão correndo e rindo em rumo à construção da sua nova vida juntos. Yachi tem certeza. Ela já consegue vê-los escolhendo um apartamento no centro de uma cidade pequena, adotando um golden retriever chamado Walter e indo à igreja todo domingo de manhã.
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Ao alcance
Romansa5 tortas que Yachi Hitoka cozinhou para a garota mais bonita que ela já tinha visto na vida inteira + 1 em que foi a vez de Kiyoko