Hanna me leva ao Hospital

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Depois do que julgo ter sido 15 minutos, comecei a sentir que estava sendo movimentado. Quando perguntei o que estava acontecendo, Hanna, sem ter como se comunicar, apenas fechou meus olhos com os dedos, indicando que eu relaxasse. Dormi. Permaneci adormecido até sentir alguém cutucando minha testa. Mas esse toque era mais borrachudo. Talvez uma luva médica.

— Oi — eu disse.

O objeto borrachudo parou de me cutucar. Fui carregado, colocado em vários lugares e voltei a dormir. Só pude saber o que havia se passado depois de umas 2 horas, quando Hanna acariciou minha bochecha devagarinho, me acordando.

— Toque na minha testa para sim e no meu queixo para não, ok?

Ela tocou delicadamente na minha testa.

— Eu estou falando claramente? — Sem ouvir minha própria fala, era difícil saber. Fiquei aliviado com o toque na testa que recebi. — Ok. Se não entender algo toque na minha orelha esquerda. Estávamos no hospital? — Toque na testa.

— Agora estamos em casa? — Toque no queixo. — Então continuamos no hospital? — Toque na testa. — Esperando os exames saírem? — Toque na testa.

—Entendi. Que horas são? — Ela tocou na minha testa uma, duas, três, quatro, cinco, seis, sete, oito, nove vezes. — Nove horas? — Senti um décimo toque na testa. — Ok. Estou morrendo de fome, pode pegar algo para mim?

Senti mais uma vez um toque na minha testa e, depois, os lábios macios dela nos meus. Não senti nada nos próximos minutos. Eles foram uns dos piores da minha vida, uma vez que não consegui voltar a dormir e estava sem minha amada, além de com fome.

Não era só o tédio que me incomodava. O principal problema era, na verdade, a ansiedade. Meus pensamentos começaram a fluir muito rapidamente, como se a torneira do meu cérebro estivesse totalmente aberta. Ideias irreais encharcavam minha mente:

Será que Hanna vai voltar? E se ela me abandonar? Será que ficarei aqui esperando para sempre? Não, ela me ama. Vai voltar! E se alguém do hospital resolver me sequestrar? Meu corpo não teria nenhuma chance de se defender! Poderiam fazer o que bem entendessem com ele! Estou tão indefeso... Talvez já tenha sido sequestrado e nem pude perceber...

Tentei me distrair pensando em memórias boas. Meu casamento, por exemplo. Foi uma festa pequena, com cerca de vinte pessoas. Como não somos religiosos, não teve padre nem nada do tipo. Quem realizou a cerimônia foi o irmão de Hanna. Ele foi bem sucinto:

— Você, Hanna Junot, aceita Yonos Burguer como seu marido?

— Sim! — Ela respondeu, empolgada, dessa vez em voz alta e não só com um toque em minha testa.

— E você, Yonos Burguer, aceita Hanna Junot como sua legítima esposa?

— Sim!

— Então podem se beijar.

O beijo foi muito bom. Hanna beija bem. E a noite que se seguiu foi mágica...

Meu pensamento foi interrompido pelo cheiro de fritura misturado com o perfume que já conhecem — como vocês podem perceber, meu olfato é apurado, e só melhorou desde então. Hanna havia chegado. Logo senti seus dedos acariciando meu couro cabeludo e uma coxinha sendo empurrada delicadamente à minha boca. Dei uma mordida. Pelo menos o paladar eu ainda tinha.

Depois de saciar minha fome, desenvolvi um sistema simples, embora demorado, com o qual Hanna poderia se comunicar comigo. Ela daria uma quantidade de puxadinhas na minha orelha direita equivalente à letra que quisesse comunicar. Uma para "A", duas para "B", três para "C", e assim em diante. Tocaria uma vez no meu nariz para dizer que iria para próxima letra, duas vezes para a próxima palavra e três vezes para indicar que terminou.

Como teste, ela deu leves 25 puxadas na minha orelha, depois um toque na ponta do meu nariz — era um Y. Então 15 puxadas e um toque no nariz — um O. 14 puxadas e um toque — um N. 15 novamente — outro O. E 19 puxadinhas acompanhadas de três toques no meu nariz. Era meu nome: Yonos.

— Yonos? — perguntei, buscando confirmação. Senti o dedo de Hanna em minha testa, indicando que estava correto.

Ela se deitou ao meu lado na maca e me abraçou. Ficamos assim até que os exames chegaram. 5, 24, 1, 13, 5, 19 puxadinhas de orelha: Exames. Mais tarde, já em casa, ela me contou, usando a menor quantidade de letras que conseguiu, que os exames não encontraram nada:

Exames inconclusivos.

— Meus sentidos vão voltar? — um restinho de esperança inflou-se e encheu meu peito.

Não sabem.

Cego, Surdo e TetraplégicoOnde histórias criam vida. Descubra agora