A chegada

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Era início de temporada no Regatas Clube e isso significava um novo ciclo. Nesse primeiro dia, era tradição que a treinadora apresentasse oficialmente as novas jogadoras contratadas ao restante da equipe.

— Meninas, estou muito feliz em vê-las de volta! Tenho certeza que todas ainda estão muito felizes com a conquista da Superliga na temporada passada, mas agora estamos começando uma nova história — disse a treinadora, enquanto dava um sorriso orgulhoso — Para isso, gostaria de apresentar vocês as nossas novas contratadas para a temporada: Roberta e Isa! Meninas, vocês podem dar uma palavrinha?

Então Roberta começou a se apresentar. Ambas jogavam no exterior há muitos anos e eram nomes conhecidos no cenário do vôlei feminino, apesar de não terem passagem pela seleção principal. A maioria das jogadoras já as conhecia, apesar de não saberem muito delas além das quadras.

— Amiga, as duas são muito gatas — Gattaz comentou enquanto fingia prestar atenção na apresentação de Roberta.

— Achei que nós tínhamos combinado de evitar envolvimento com pessoas no ambiente de trabalho, isso não dá certo! — retrucou Rosamaria.

— Ué, mas foi só um comentário inocente, você que está supondo coisas.

— Eu te conheço muito bem — Rosamaria revirou os olhos.

— Eu to falando sério, e além do mais eu não quero mais me envolver com mulheres muito mais novas.

Rosamaria deu uma risada que foi um pouco mais alta do que deveria, chamando a atenção de Roberta, que pausou sua apresentação e se questionou se havia falado alguma besteira. A treinadora olhou para Rosamaria imediatamente, a reprimindo. Ao perceber que a treinadora havia desviado o olhar novamente para Roberta, Gattaz disparou baixinho:

— Será que a Roberta gosta de mulher?

— Gattaz! Chega!

— Amiga, ela pode ter amigas para nos apresentar. É mais fácil quando a pessoa já é do meio.

— Tudo bem, tu tem um ponto, mas as amigas dela devem morar fora do país, então não viaja e lembra que ninguém chegou aqui pra satisfazer teu fogo não!

— O que vocês estão cochichando aí? — perguntou Gabi, que estava sentada atrás e se inclinou no meio das duas.

— A Gattaz já está de olho na Roberta e na Isa, pra variar.

— Não julgo, elas são bem gatas mesmo — respondeu Gabi, fazendo sinal para que Gattaz batesse na mão dela.

— Viu, Rosamaria? Até a Gabi! Mas é só curiosidade mesmo, não esquenta.

Rosa achava graça da situação, mas no fundo tinha um pouco de receio pela sua amiga. Gattaz sempre se envolveu com pessoas do meio do vôlei e todos os seus relacionamentos acabaram de forma conturbada, então desejava muito que sua amiga saísse desse padrão, mas algo lhe dizia que esse interesse por Roberta duraria por algum tempo.

O dia passou e o primeiro treino da temporada foi leve. Ao final da tarde as jogadoras estavam pegando suas bolsas no vestiário e Rosamaria aproveitou para puxar assunto com Roberta:

— Tu treinou muito bem, Roberta! Vai ajudar muito a gente essa temporada. Como está a readaptação ao Brasil?

— Obrigada — A levantadora respondeu e suas bochechas ficaram vermelhas — Ah, eu sempre estava por aqui nas minhas férias, então não é tão complicado, o chato mesmo é resolver algumas burocracias de moradia e documentação.

— É engraçado que nós nunca nos esbarramos em nenhum rolê do vôlei, né? Normalmente todo mundo se conhece — Gattaz aproveitou para entrar na conversa.

— Verdade, mas o que não vai faltar é oportunidade agora. Eu to num momento que quero aproveitar as coisas, então fiquem a vontade para me convidar se souberem de alguma coisa legal pra fazer.

— Tá falando com as pessoas certas. Essas duas têm muita história, toda hora estão em um lugar diferente — A voz de Gabi surgiu do nada. Ela estava distante, mas aparentemente ouvia bem a conversa. Roberta riu.

— Ah, é bom saber disso. Inclusive eu... — Roberta interrompeu o raciocínio.

— Tu o quê? — Questionou Rosa.

— Nada, deixa, eu ia falar uma coisa nada a ver.

— Pode falar, a gente não se ofende fácil não — Gattaz tranquilizou a levantadora. 

— Eu ia dizer que eu já vi vários memes "Rosattaz" na internet e achei muito engraçado. Tem uma galera que shippa muito vocês duas.

Rosamaria e Gattaz deram uma gargalhada em conjunto enquanto Gabi, de longe, abriu um sorrisinho com o canto da boca diretamente para Gattaz. 

— Rosamaria vive me dando fora e a galera ainda shippa a gente, é possível? Pessoal gosta de me ver sofrer mesmo.

Isa, a outra jogadora nova, também estava no vestiário, mas conversava com outras jogadoras. Esse comentário de Gattaz a fez prestar atenção na conversa. Revirou os olhos algumas vezes, apesar das outras meninas não perceberem. Isa era muito religiosa e não gostava desse tipo de brincadeira.

— Ah, mas eu acho que isso é carinho mesmo. Eu já vi me shipparem com muita gente também, não sei como acabam descobrindo que eu já tive rolo com alguma pessoa e automaticamente começam a shippar — Roberta retrucou.

— Eu sei que é carinho, mas é engraçado porque no meu caso e da Carol nós realmente somos só amigas e nunca demonstramos para ninguém ser mais que isso. Ela brinca de filmar me dando cantadas, mas é sempre num tom cômico. A galera passa dos limites... — Rosamaria se apressou em responder e parecia querer justificar alguma coisa.

— Vocês são amigas todo esse tempo e nunca se beijaram? — A pergunta de Roberta pegou as duas de surpresa, pois não esperavam que alguém com comportamento tão tímido questionaria uma coisa dessas na primeira conversa entre elas — Gente, eu já fiquei com quase todos meus amigos e amigas! A maioria foi na inocência no meio de uma bebedeira, mas não nego que foi bom.

— Não, nunca ficamos — Rosamaria respondeu envergonhada. Ela já havia pensado na possibilidade sim, mas parecia algo muito distante. Quando conheceu Gattaz havia um interesse, mas logo se tornaram tão amigas que esse assunto não voltou.

— A verdade é que a Rosa nunca me deu moral, sabe? — Gattaz disse, trazendo Rosamaria de volta de seus pensamentos — E ela é muito golpe pra mim.

— Quer dizer que se eu tivesse dado moral a gente teria se pegado, Gattaz?

Gattaz abriu a boca para responder, mas antes que pudesse falar qualquer coisa foi interrompida por Roberta:

— Viu? É assim que começa mesmo, com essas brincadeirinhas.

As duas deram uma risada sem graça.

— Nós somos só amigas mesmo — Rosamaria reforçou.

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