Capítulo 6

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São 04:05h da manhã. João, um jovem adulto, cerca de 29 anos, acorda. Seus olhos se negam a abrir, doem a cada vez que se esforça para buscar um pouco de luz. Ele tenta uma, duas, três vezes... sem sucesso. Suas pálpebras comprimem como se estivessem enrijecendo, lutando contra o esforço para abrir. A fadiga é intensa antes mesmo do primeiro movimento de seu corpo. Vagamente ele vira seu rosto à esquerda, a máscara em seu rosto se revela, amassada pelo peso das bochechas que a comprimem toda vez que se remexe na cama. No canto, uma luz esverdeada aos poucos ganha nitidez, é o despertador elétrico que marca o horário com o nome "vintage" escrito no canto direito, presente de sua mãe ofertado em seu aniversário, jamais se desfaria daquele relógio, isto é um assunto consumado. A sua direita, a silhueta de sua esposa, com curvas acentuadas, enaltece o contorno de seu corpo, ela dorme o sono dos justos. 

Aos poucos, João acorda. Estica os dedos de sua mão esquerda, tateia a busca pelo celular e não o encontra, seu coração acelera, um toque seco em sua boca, o corpo estremece, os segundos passam e a mão bate cada vez mais forte. Dois longos e exaustivos segundos se passam.

- meu Deus - rogou aos céus.

Então percebe que encontra-se em baixo do travesseiro. Logo trás o celular ao seu rosto e a tela se abre. Uma luz branca, forte, tão brilhosa quanto a luz de um farol em meio a escuridão, ofusca sua vista. Ele balbucia um arranque na voz "arrrgh". Desliga o celular, olha para sua esposa, ela continua a dormir.

- Cacete - fala em voz baixa, quase inaudível, surpreso por não ter acordado a mulher.

Bem devagar, em um esforço abissal, João consegue sentar-se à beira da cama, seu coração acelerado, desta vez pelo esforço, o faz lembrar das vezes em que disse "vou a academia" e se rendeu à procrastinação. Ele olha para os lados, não vê absolutamente nada, escuridão total. Rapidamente seu pescoço vira, um feixe de luz de um dos postes da rua, sutilmente ilumina o braço de sua esposa, ela continua a dormir. 

Seu coração acelerado, suas mãos começam a tremer, a adrenalina toma de conta do seu corpo, logo algumas gotículas de suor aparecem em seu rosto. João busca coragem para se levantar. Aos poucos vai se levantando, de repente olha para o lado e pensa: "não posso esquecer!". O celular é a chave indispensável para abrir qualquer porta trancada, seja de sua carência afetiva, seja de sua carência tecnológica. Estica a mão e, rapidamente, pega o celular.

Então, consumido pelo sentimento de coragem, João impulsiona seu quadril para frente e rapidamente está de pé. Neste instante seu joelho esquerdo estala "pec". Ele leva a mão ao joelho e, mais uma vez, balbucia:

- Preciso ir no ortopedista.

João arrasta, pé a pé, até o banheiro. Tateia na parede o interruptor. A luz acende. Ofuscado por mais uma luz, João pega o celular, abre a tela. Com os olhos entreabertos, comprimidos entre as pálpebras, ele lê:

"Covid: Governo estadual acaba de lançar os novos casos das últimas 24 horas. São mais de mil e duzentos casos confirmados e duzentas e três mortes."

O olhar se apavora, ignorando as luzes, suas pálpebras se abrem como o Nilo pelo cajado de Abraão. Seu coração, mais uma vez, palpita. João parece estar sofrendo um ataque cardíaco. Deixa o celular ao lado da pia, finge que não está abalado com as notícias, lava o rosto e, ainda molhado, novamente pega o celular. Desacreditando no que está a ler na tela do celular, João pega a toalha de rosto, seca-se, devolve a toalha de qualquer jeito. Apaga a luz.

Agora, a iluminação do celular está no mínimo, qualquer som de notificação e ligação desativado, João caminha em direção à porta de acesso à sala de seu apartamento, abre sem se importar com o barulho, enquanto rola a tela do celular com a mão direita, sua esposa ainda dorme. Vai esgueirando-se com muita habilidade entre uma cadeira e outra, passando pelos obstáculos com a devida maestria, porém, sem tirar os olhos da tela. 

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