Capítulo Três: Reputações

3 1 0
                                    

Em abril, as coisas começaram a pegar ritmo. Eu me preocupava com pouco mais que meus estudos. Na faculdade, ninguém sequer me notava. Eu vivia à sombra de meus colegas de casa, famigerados por suas produções literárias.

Em especial, Álvares de Azevedo, se tornou um nome muito citado no local. Só de passar por um corredor, atraía todos os olhares e as pessoas cochichavam entre si:

-Esse sujeito é insano!

-Esse sujeito é um gênio!

-Esse sujeito é incrível!

-Esse sujeito é muito insano!

Havia rumores de que ele nascera numa biblioteca (escritor desde o parto). Ele, Guimarães e Lessa formaram até umas dezenas de seguidores. E se um decidia daguerreotipar-se com uma capa preta, em breve era moda. Uma aura mística passou a cercar esses homens, que apesar de artistas excelentes de sentimentalismos exagerados, não eram como se dizia. É provável que o resto de minha narrativa não convença nesse sentido, pois não tenho pena de mostrar os lados mais podres desses três. Mas, eles eram de fato introvertidos e tímidos na maior parte do tempo. Não causavam intencionalmente bagunças durante as aulas, senão quando discordavam de um professor que agia (ou falava) injustamente. Eram extremamente competentes nos estudos também.
Mas, algo chamava Álvares de Azevedo à aventura. E, ele atendia ao chamado. Sua fama só se intensificava.

Tudo em consequência das várias noites que passavam em saraus, bailes e peças, seja no Largo do São Francisco ou no Solar da Marquesa.

Eu, comparecia poucas ou nenhumas vezes nesses eventos domingueiros. Na época, meus companheiros favoritos eram os livros de estudo e as canecas de café. Uma única companhia me agradava mais que o comum e por isso fazia questão de mantê-la: a da dona da livraria.

Sempre aparecia lá com a desculpa de comprar mais livros e tabaco para meus amigos, quando em verdade os comprava para mim. Ela parecia não se importar e conversávamos normalmente. Eu não conseguia decifrar se ela tinha alguma afeição por mim, logo, precisava fazer investidas.

-Bom dia, senhorita!-Estendi os braços, cheios de livros nas mãos, ao chegar no balcão.

Ela ergueu as sobrancelhas e sorriu sem mostrar os dentes.-Bom dia, senhor!

-O outono chegou que é uma beleza, não é mesmo?

-Deve ser...Tudo que vejo é o sol...-Olhou pela vitrine e abaixou a cabeça.

-Hmmm...Lá fora há brisa gélida, auroras dedirroseas e folhas laranja de plátano pelas calçadas!

-Jura!?-Esbugalhou os olhos.

-Se quiser, posso levá-la a um passeio...

Sua feição se neutralizou.- Não, eu...Dar-te-ei o benefício da dúvida...

Isso foi mais frio que o vento. Lembrei-me de um "quebra gelo".

-Oh, é mesmo! Já faz semanas e nem perguntei: qual o teu nome?

-Sophiei!-Uma voz forte como um trovão soou em minhas costas. Eu e a dona trememos. Pareceu uma resposta divina. Olhei para trás e havia um homem alto, robusto, caucasiano, com uma regata branca e um chapéu de palha apesar de estarmos num ambiente fechado. Ele tinha a barba feita e o olhar sério.

-P-Pai...!?-A dona respondeu.

-Ah, o senhor...-Não concluí.

O homem me estendeu a mão.- Desculpa-me. Prazer, sou o Sr.Oliveira, dono da loja!-Estava no limiar entre simpático e intimidador.

A Casa do SatãOnde histórias criam vida. Descubra agora