01 - O retorno

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     Poliana suspirou aliviada quando finalmente enfiou a última peça de roupa em sua mala. A casa, como sempre, estava silenciosa e muito fria. Uma das coisas que a menina mais odiou em morar no exterior, exceto a falta de todos os seus entes queridos de São Paulo, era com certeza o clima frio. Claro, São Paulo não era bem uma bola de calor, mas era muito melhor do que o frio rascante que se infiltrava nas solas dos seus pés fazendo-a estremecer inteira.

Seus pés descalços sentiam como o piso estava gelado, e embora fosse uma sensação incômoda ainda era pra lá de gratificante. Sim, porque dois anos atrás ela já não sabia o que era sentir temperatura nas pernas, tampouco movimentá-las. Agora, graças a Deus, ela estava curada e todo o seu tormento teve fim — não somente sua paraplegia, mas também sua distância das pessoas que mais amava.

Quer dizer, ela não estava sozinha em outro país, o senhor Pendleton — seu pai — estava com ela. Ela o amava e o havia perdoado por tudo o que aconteceu, só que por mais esforçado que fosse ele não poderia suprir a necessidade de calor humano da adolescente. Também, pudera! Com aquele jeito caladão dele era quase impossível... Porém ele deu o seu melhor durante aqueles dois longos anos de tratamentos árduos.

Com dificuldades ou sem, a verdade é que tudo deu certo no final e Poliana D'Ávila Pendleton podia andar perfeitamente agora, e não via a hora de voltar para casa. A saudade do abraço da tia Luísa, dos docinhos da Nanci, dos sorrisos do João... Tudo isso lhe dava ainda mais energia para preparar as coisas da viagem, isso e a tia Luísa que via a afobação da sobrinha pela câmera do notebook.

— Poliana quer parar quieta?

— Ai tia, desculpa, eu não consigo. — respondeu a menina, toda baratinada procurando o que faltava — Estou tão ansiosa, doida pra chegar aí. Sinto que se não fizer alguma coisa vou explodir!

— Calma, logo você vem pra cá, não adianta nada ficar assim. — aconselhou Luísa.

— É, tem razão. — deu-se por vencida, sentando na cama, de frente para a imagem da tia.

— Vem cá, essa ansiedade toda é só por voltar ou tem mais alguma coisa aí?

— É que... Já passou tanto tempo, as coisas devem estar bem diferentes por aí e sei lá! Tenho medo de voltar e não ter mais ninguém.

Foi bem difícil a adaptação de Poliana no exterior. Otto havia feito de tudo para o seu conforto, uma casa bonita e espaçosa, toda adaptada para ela e tal, mas sem os amigos e a família por perto para ajudá-la a menina ficou muito desanimada, sentindo-se solitária e frustrada também, com as dificuldades do tratamento. Ainda mais naquele país, onde a maioria das pessoas passava pela rua de cara fechada, numa escola que ninguém dava a mínima para ela... Foi muito complicado. A única coisa que alegrava seus dias era conversar com seus amigos pela internet. Aquele com quem ela mais falava era João, que sempre sabia como fazê-la sorrir.

Por causa disso, em vários momentos de tristeza ou irritação ela se via remexendo na pulseirinha que o rapaz lhe dera. Como agora.

Ouvindo Luísa suspirar, Poliana aguardou a resposta da tia.

— Oh meu amor, não precisa ficar assim. — ela disse ternamente — Presta atenção Poliana, isso é uma coisa que não tem a menor possibilidade de acontecer.

— Você acha?

— Eu tenho certeza, e você devia ter também, está usando a prova de que isso que você teme nunca vai acontecer.

— Verdade né? Eu sou uma boba mesmo — riu, bem mais tranquila, sacudindo os pingentes da pulseira.

Elas ficaram mais um bom tempo conversando e rindo sobre a vida. Depois de um tempo Marcelo apareceu e se juntou também, mas a hora passou voando e quando menos esperavam Poliana ouviu seu pai chamá-la pra ir dormir.

Poliana - Sobre crescimento e escolhasOnde histórias criam vida. Descubra agora