15- Inseguranças e maus seguranças

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Bento ficou feliz que a guerra fria na sua casa durou pouco menos de um dia. Deus sabe como sua tia e seu primo podem ser complicados. Foi bom ver João entrar completamente relaxado no quarto, entretanto.

— A conversa foi boa?

— Foi.

A maioria das conversas entre os primos, exceto quando estavam discutindo, eram curtas assim e isso bastava. João desligou a luminária do lado da sua cama e em segundos estava dormindo. Roncando na verdade.

Bento voltou a ouvir o documentário sobre o maior maestro do Brasil, quando de repente começou a reparar que suas pernas não ficavam no limite da cama. Quer dizer, João dormia numa cama exatamente igual à sua e suas pernas gigantes iam até o final do colchão, deixando seus pés de fora, mas com Bento não era assim. E ele sabia por que.

A dura realidade — principalmente para um menino de quinze anos — é que ficar anos sentado numa cadeira de rodas, conjuntamente a predisposição para ser baixinho, atrapalharam o seu crescimento. Atualmente ele é o cara mais baixo de sua turma e sua voz ainda parece estar na transição, porque não se decidiu entre ficar grave ou fina de vez. Isso era uma merda.

Até os treze ele não se importava tanto, mas aí o João começou a sair da bolha, porque sem a Poliana na escola agora ele tinha saco para prestar atenção no resto da escola. Ele começou a fazer novos amigos, mudou o corte de cabelo, ficou mais alto e pra completar aprendeu a surfar. Aí pronto, as meninas caíram matando, a atenção ficou sobre ele e Bento ficou com fama do baixinho, o pianista, primo do João.

Se Bento tinha raiva ou inveja de João? Não, passara dessa fase há muito tempo, suas inseguranças agora eram outras. Como o fato de muita gente achar que ele ainda estar no ensino fundamental. Bento é um intelectual, mas não deixa de ter um certo orgulho masculino.

Késsia sempre foi a única a não ferir esse orgulho. Ele sonhou com ela aquela noite, quando terminou de assistir o documentário e fechou os olhos.

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O sol iluminou um dia particularmente bonito naquela manhã, tudo o que Luigi precisava. O filme que ele estava formando precisava começar em um ambiente absolutamente amigável, por necessidade de trama. Logo aconteceria algo bombástico com a personagem principal e tudo iria por uma espiral mais sombria e... Bom, só faltava mesmo uma atriz. Se pelo menos a Yasmin ainda estivesse aqui...

Bom, isso ele resolveria depois.

Aproveitou o dia bonito, catou seu equipamento e foi gravar na frente de casa. Tinha acabado de fazer a preparação do cenário e ia entrar em um take importante quando um skate surgiu do nada, atrapalhando sua gravação.

— Ai, desculpa! 

Song Park surgiu da direção que o skate tinha vindo. Ela usava dois coques, um ao lado do outro, lembrava a Luigi o antigo desenho da Pucca. 

— Eu te atrapalhei não é?

— O quê? — sem querer, Luigi se distraiu em suas observações.

— O seu filme. Eu atrapalhei?

— Ah não, relaxa. — tranquilizou Luigi. — Esse é só um rascunho. Não sabia que você andava de skate.

— Pois é, é um novo hobby que eu tô tentando dominar. — ela sorriu.

— Você... Já conheceu a vizinhança?

Poliana - Sobre crescimento e escolhasOnde histórias criam vida. Descubra agora