Capítulo 31 - Não haverá escapatória

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O sonho é um dos eventos universais e biológicos mais intrigantes de que se tem notícia. Para uns, o espírito deixa a matéria e vaga por dimensões alternativas, para outros, desejos reprimidos afloram do subconsciente, e há ainda os que acreditam piamente em um poder premonitório expresso em uma simbologia. Enquanto o corpo está inerte e paralisado, a mente vaga por mundos fabulosos, improváveis e livres da contenção morna - muitas vezes em preto e branco - da realidade.

O enredo do sonho é fruto de um emaranhado de memórias com intenso componente emocional e muitas vezes fantasioso. Grande parte do que sonhamos refere-se a coisas que vivenciamos em uma realidade recente. O sonho é uma colcha de retalhos com personagens, símbolismo, ambientes que afloram do nosso arsenal de experiências, mas dispostos de forma meio errática. Podemos misturar pessoas que nunca se encontraram, lugares distantes em muitos quilômetros, mortos, e até eventos sobrenaturais.

Cheryl permaneceu atônita por um tempo imensurável. Se fosse necessário relatar, não saberia dizer se eram segundos ou minutos, poucos ou muitos. Ela apenas tentava organizar as desconexões de pensamentos, o emaranhado que se dava em sua mente. A filha do presidente, ao deparar-se com aquela mulher vistosa nos corredores da Casa Branca, foi levada de imediato para o seu período de estadia no hospital, após o atentado do qual Toni a salvara. Era ela, tinha certeza. Em uma época chegou a supor que tudo não passava de torpor causado pelo efeito medicamentoso, mas estava enganada. A paciente internada no leito ao lado do seu era real e estava bem à sua frente. Não a conhecia, mas lembrava-se das conversas frívolas, e ao mesmo tempo tão significativas que tinham; o sentimento de companheirismo na voz da mulher, como se realmente a presença dela fosse um bálsamo para a sua enfermidade. Definitivamente eram a mesma pessoa. Cheryl reconheceria os cabelos loiros, medianos e ondulados em qualquer lugar. A boca pequena já não tinha as fissuras de ressecamento, mas os olhos verdes, expressivos e brilhantes, em nada mudaram de lá para cá. 

- Oi. - O timbre de voz concedeu a certeza do qual a herdeira necessitava para não crer em uma loucura momentânea. 

- Me desculpa a indelicadeza. Srta. Blossom, essa é Elizabeth Cooper. Ela fará um trabalho interno para mim. Betty, acho que você já conhece a…

- Claro que conheço… - Toni franziu o cenho em estranheza ao notar uma emoção contida no semblante da loira que sorria ternamente - E posso dizer que é maravilhoso revê-la, digo, vê-la assim de perto. - O toque no cumprimento das mãos fez ambas estremecerem discretamente.

Cheryl, como a outra, trazia consigo traços atípicos em suas atitudes. A comandante observava as duas, atenta, buscando entender o que se passava ali. A ruiva foi afastando-se devagar, um tanto quanto desajeitada por conta do cão.

- Você… foi a minha colega de quarto, se assim posso dizer. - A filha do presidente, um tanto quanto consternada, estudava as feições da mulher à sua frente.

- Acho que está cometendo algum engano, Srta. Blossom. Nunca dividi quarto com ninguém. - Betty parecia prender um riso ao entreolhar-se com Toni.

- Não esteve internada na época do ataque à Casa Branca no…

- Senhorita… - A comandante interrompeu Cheryl - Seu andar era exclusivo. Ninguém podia subir sem prévia autorização. 

A ruiva, de cenho franzido, encarou a namorada. Os ares de desconfiança fizeram-na arrepiar-se antes do suspiro profundo.

- Eu devo ter… sonhado, ou visto uma pessoa parecida. Me desculpe pelo inconveniente.

- Imagina. Se quiser me confundir com alguma atriz bonita e gostosa, fique à vontade. - De imediato, ouviram o pigarreio forte advindo da agente secreta - É… Sinto muito pela brincadeira.

The president's daughter - choniOnde histórias criam vida. Descubra agora