Capítulo 2 - Bandeiras de São João

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Ruth Alves

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Ruth Alves

Aperto o grampeador com delicadeza, mas não havia mais grampos dentro dele, desço da escada metálica e caminho até as caixas de papelão repletas de materiais e enfeites, não encontro o que procuro e me direciono ao grupo de jovens do coral da igreja que estão focados em desenhar e recortar mais bandeirinhas.

Involuntariamente escuto os cochichos dos mesmos, fofocavam sobre desconhecidos que haviam chegado e estavam comendo na carroça da dona Lourdes, minha avó.

Serra dos Cataventos é um lugar extremamente monótono, logo, tudo que é novo se torna atração, desde a morte de um dos cavalos da propriedade Torres, até novos moradores. Antes mesmo que eu consiga chegar totalmente perto deles, ouço:

- Olha a doentinha está vindo aí, fiquem quietos... - Um nó é introduzido em minha garganta, meus pés giram rapidamente, ansiando que eu tome outra direção.

Meu estômago range, minha garganta coça e sinto uma insuportável vontade de tossir, mas não farei, porque isso chamaria atenção demais. Não por tossir, contudo para o que essa maldita tosse significa.

Meus olhos perdidos se encontram com íris azuis piscina, a menina forasteira, percebendo que estávamos a muitos minutos nos olhando, é a que toma iniciativa em separar nossa fixação. Sinto uma firme mão alcançar meu ombro esquerdo, reconheço assim que vejo as unhas alinhadas, viro-me para o indivíduo com um sorriso largo, mostrando meus dentes que insisto em escovar duas vezes seguidas antes de dormir.

- Você está bem? - Odeio essa pergunta tanto quanto as tosses, porque sei que a chave do carro está estrategicamente pendurada na cintura, o tanque do carro repleto de gasolina e mudas de roupas escondidas embaixo do banco, para uma possível emergência, onde iríamos parar em um hospital que não temos dinheiro nem para uma diária e que só posso frequentar porque meu caso é "curioso" e "precioso" demais para ser ignorado pelos estudantes de pesquisa do centro de medicina de João Pessoa.

- Sim, não se preocupe. - Asseguro.

- Ah, não estou preocupado, relaxe. - Traduzindo: Estou preocupado, mas você não pode saber, porque prometi que iria parar de ser um pai paranóico.

- Como foi o trabalho?

Meu pai, infelizmente, é um dos vários moradores de Serra dos Cataventos que se submetem a extrair pedras preciosas e, principalmente, ferro das minas locais. A situação é, às vezes, deplorável, contudo depois de muito protesto e repúdio houve melhorias na qualidade de vida dos trabalhadores. Escuto suas reclamações sobre uma briga que aconteceu entre dois colegas, mas o que verdadeiramente me incomoda é o cheiro rançoso de poeira de minério de ferro impregnado em suas unhas e roupas, mesmo não sendo seu uniforme.

- Quem são? - Pergunto curiosa, inclinando disfarçadamente o queixo em direção ao casal e, provavelmente, sua filha. O rosto de Paulo Alves pareceu iluminar-se instantaneamente à medida que conseguia ver melhor a quem eu me referia.

- Augusto? - Não foi propriamente uma pergunta, estava incrédulo, repetiu mais alto, finalmente chamando atenção do desconhecido, que por sua vez estabeleceu uma expressão tão surpresa quanto a dele. - Amanda?! - Os três se abraçam eufóricos, virando um emaranhado de exclamações confusas e braços.

Olho mais uma vez a garota, percebendo que esse acontecimento é tão surpreendente para ela, quanto foi para mim. Seus cílios são de um tom loiro, quase branco e isso intensifica as íris, observo que sua boca entortar e me pergunto se estou parecendo uma maluca frenética.

- Essa é a Ruth? - A mulher de estatura baixa interroga, passando as mãos em meus cabelos pretos.

- Sim, sou. - Sorrio genuinamente.

- Você está enorme! - Augusto exclamou empolgado e imediatamente percebeu que eu não fazia ideia de quem eram, talvez seja esse o motivo de ter caído em gargalhadas. - Sou Augusto Reis e seu pai era o meu melhor amigo na escola, não nos desgrudávamos nunca.

- Até você perceber que Serra dos Cataventos era pequeno demais para sua mente, seu esnobe! - Papai fingiu irritação, porém não conseguiu segurar o personagem por muito tempo, rindo alto.

- Essa é minha esposa Amanda e nossa filha, Samara. - Termina de apresentar sua família para mim.

- Prazer... - Estico a mão para cumprimentá-la, a mesma me olha com indiferença e volta sua atenção para o celular, deixando seus pais constrangidos.

- Samara, não seja rude. - Repreendeu a mãe.

- Podemos ir? Estou com dor de cabeça.

A verdade é que a menina foi completamente desnecessária, eu só quis ser agradável, mas não deixei minha insatisfação transparecer, ao invés disso sorri e caminhei em direção ao local onde eu deveria estar procurando grampos.

Quando finalmente achei, misturado com canetas coloridas e sobras de papéis, senti uma sensação desconfortável e observei uma gota rubra cair no chão, direcionei os dedos automaticamente ao nariz, meu tato detectou algo molhado e viscoso, finalmente tomei coragem para ver do que se tratava e me peguei observando o mais vívido tom escarlate que um sangue poderia ter. 

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Olá non magi ou místicos, espero que tenham gostado do primeiro capítulo, no início vai ser um pouco parado porque é meio que uma apresentação dos perfis dos personagens, mas confiem no processo hahaha! 

Se possível, aperta na estrelinha, comenta as partes mais legais e interajam com os personagens (eu adoraria trocar uma ideias com vocês) e compartilhem essa história :) 

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