Mikey sempre achou que o clima que sua rua tinha durante a noite lembrava muito o que ele esperaria ser o resultado de uma invasão zumbi: havia um poste de luz brilhante posicionado bem em frente a sua casa que tinha tido seus circuitos queimados já fazia algum tempo, o que não era o bastante para ela não ligar, mas também não o suficiente para permanecer ligada, então ela apenas ficava lá, alterando entre um e outro como um pisca-pisca de natal improvisado.
Também havia alguma coisa plenamente errada quanto aos outros postes de luz: eles funcionavam bem e se mantinham permanentemente ligados, mas, mesmo assim de alguma forma parecia que eles não ajudavam nem um pouco a deixar a noite menos escura, como se eles não tivessem força o bastante para conseguir iluminar qualquer coisa que fosse.
Ademais, como uma zona mais afastada do centro da cidade, era também uma rua bastante escura, e a quantidade de silêncio que a suportava era tão grande que Mikey poderia até mesmo ouvir seus próprios batimentos cardíacos se ele se esforçasse o suficiente. As casas também eram bastante espaçadas entre si: era possível ver as paredes de concreto do lugar onde morava sua vizinha mais próxima — a velha com 7 gatos que de tão fofoqueira não conseguia dormir antes de ter certeza que não iria perder nenhuma briga de vizinhos que pudesse aparecer durante a noite —, mas, ainda assim Mikey tinha certeza que ele teria que andar no mínimo mais umas boas duas quadras para chegar até onde a casa dela ficava exatamente.
No entanto, mesmo com tudo, Mikey não pretendia trocar a área que morava. As noites poderiam ser um pouco sombrias as vezes, mas era tão calmo, fresquinho e agradável durante o dia, que ele não tinha problema nenhum em lidar com aquele pequeno lado negativo do lugar.
Além disso, Mikey sorriu enquanto abria a porta para entrar na residência, Takemitchy gostava do lugar, gostava do jardim enorme que eles tinham onde ele podia encher de flores, árvores e plantinhas, gostava do quintal dos fundos onde ele podia deitar-se no chão ao lado da fonte de água que tinha lá apenas para observar as formas das nuvens, gostava até da velha dos gatos por alguma razão que Mikey não fazia a menor ideia qual era, apesar dele ter a teoria de que provavelmente era apenas uma coisa de Takemitchy, enxergar bondade nas pessoas independente de quem eram.
Afinal, não era isso que havia acontecido em seu próprio caso? O sorriso de Mikey caiu um pouco, com tudo que havia acontecido em sua adolescência, as lutas que ele deixava Takemitchy participar mesmo sabendo que o garoto era uma negação quando se tratava de lutar, as noites que Takemitchy passava em claro por preocupação com futuros incertos porque Mikey havia feito ou causado algo que seria o declínio de todos eles, os próprios futuros horríveis que Takemitchy tinha que passar um atrás do outro enquanto tentava salvá-lo, o tanto de vezes que ele o obrigou a ver as pessoas que amava morrendo em sua frente sem poder fazer nada, os malditos três tiros e o que ele convencionou chamar de pacto de suicídio que aconteceu depois no futuro de Bonten.
E é claro, o que aconteceu no salto final, no dia da batalha das três divindades, onde ele não apenas quebrou o braço de Takemitchy, mas também o espancou de novo e de novo, soco após soco, até a massa desfigurada de carne, sangue e lágrimas que outrora ele chamava de amigo ser demais para Senju Kawaragi, a líder de Brahman, que implorou-o de joelhos para que libertasse Takemitchy com a promessa da dissolução de sua gangue.
Um arrepio correu por sua espinha, não era que ele não estava grato por ela tê-lo parado a tempo, mas, o que Mikey mais abominava em toda aquela história era o fato de que ele não achava que teria parado se não fosse Senju.