Você acredita em destino?

59 9 38
                                    

Os raios amarelados adentraram pelas frestas da simplória janela de madeira, salpicando em fachos de luz finos sobre a cama onde o casal descansava. Quentes, luminosos, enérgicos e infinitos, estendendo-se até a porta entreaberta do quarto. Acostumados a essa rotina, os dois adultos deitados na cama lentamente despertavam, o sol cegando suas vistas por alguns instantes. Bo, um homem de longos cabelos negros, olhos castanhos e peito largo foi o primeiro, seguido de Marlene, sua esposa. A segunda já tinha cabelos curtos e loiros, olhos azuis e uma estatura relativamente menor que a do homem. Sentados na cama, Marlene apoiava o rosto no ombro rígido e firme, encostando sua testa junto às mãos. Murmurou um "bom dia", sua voz saindo rouca e baixa. Nunca fora muito disposta nesses horários.

- Bom dia, amor. - A voz grave de Bo ressoou, ecoando pelas paredes do quarto, alta e disposta. Ao contrário da mulher, era mais animado no começo do dia, mais disposto a tudo. Contudo, não pulou da cama como desejava, mas sim permaneceu ali, ao lado da amada, abraçando-a de lado e acariciando sua cabeça. - Prometi ao Isaac que iria ensiná-lo a caçar hoje, mal vejo a hora.

- Que legal, querido... Mas você pode fazer o café antes de ir? Eu cuido do almoço. - Propôs o acordo de sempre, a cabeça levantava aos poucos para olhar a face do outro, sorrindo. - Quem sabe do jantar também.

Assentiu, levantando-se da cama em seguida para iniciar seu dia. Marlene ainda ficaria por mais alguns minutos, tomando coragem para sair de seu conforto. Bo, por sua vez, já se dirigia para fora do cômodo, esperando encontrar-se com o filho em algum momento. Todavia, diferente do que imaginava, não ouviu sequer um único som que indicasse que o garoto já estivesse de pé. Estranho, afinal, Isaac costumava acordar bem cedo, algumas vezes até preparando o café para os pais.

Caminhou pela humilde - porém grande comparada às outras - casa em busca de seu filho. Passeou pela sala, banheiro e cozinha, mas nada. Só restava o pequeno quarto do garoto, que foi pra onde se dirigiu. No caminho, fazia mentalmente a lista de afazeres do dia, sublinhando as coisas mais importantes. No topo da lista, ensinar a caçada para o mais novo não só era sublinhado, mas também circulado com tinta vermelha cerebral... Bo sempre teve uma imaginação bem fértil.

- Isaac, acorda! Você está atrasado para a escola! - Bo gritou com tom fingido de desespero, sacudia o pequeno que dormia tranquilamente sobre os lençóis brancos. O quarto, de cortinas e janelas fechadas, estava abafado e escuro. - A dona Tara vai te transformar em voodo!

Do bolo de lençóis brancos, um pequeno garoto de no máximo oito anos de idade pulou, atrapalhado e enroscado no tecido neutro. De encontro ao chão, reclamou de dor e começou a se levantar, cambaleante, em uma tentativa de correr pelo quarto coberto de bréu. O cabelo marrom claro bagunçado e embaraçado pelo sono pulava, batendo no rosto babado e cobrindo os olhos azuis. As curtas pernas se enrolavam na velocidade, percorrendo o quarto inteiro para lá e para cá em questão de segundos. As mãos pequenas de dedos magros catavam roupas aqui e ali, jogadas pelo chão, algumas em gavetas no móvel ao lado da cama. O rosto gordinho e redondo se contorcendo em medo e pressa, ao passo que vencia os desafios da bagunça e do escuro lhe cobrindo a passagem. Continuaria correndo por um tempo, não fossem os braços de Bo o agarrando.

- Não acredito que você caiu mesmo nessa! Hahaha! Ainda é cedo, Isaac. - Declarou, tentando acalmar a "peste" que corria de um lado a outro. - Antes da escola, você e eu vamos caçar, esqueceu? - Por fim, sorriu para o filho, bagunçando ainda mais o seu cabelo.

- Qual é, pai!? Não faz isso! Você não sabe como a senhorita Tara é! - Indignado, de bochechas infladas e braços cruzados, Isaac protestou. Baixou a cabeça para não encarar o olhar do pai, no fundo se segurando para não rir. - Da última vez que eu me atrasei, ela me fez ficar de olho em cartas de tarô que se mexiam sozinhas! Eu senti como se elas pudessem me atacar a qualquer momento.

DestinoOnde histórias criam vida. Descubra agora