𝗣𝗲𝗿𝘃𝗲𝗿𝘀𝗼

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𝙀𝙧𝙚𝙣:

Eu sempre gostei de observar.
Querer participar, sentir o que estão sentindo é quase mais atraente do que realmente participar. Eu gostava de ler as pessoas, principalmente aquelas que não sabiam sequer disfarçar o que sentiam. S/n era uma delas.

Passou a ser fácil saber o que se passa em sua mente já que, ela não fazia ideia de como disfarçar embora tentasse. Contudo, o que mais me atiçava era o medo que ela começou a sentir de alguns anos pra cá. Ela ficava em alerta e meio cabreira sempre que me via. E eu gostava daquilo.

Eu sabia que, mesmo após tantos anos, ela ainda sentia algo por mim além do medo. E sabia também que ela rejeitava aquele sentimento de várias formas, pois para ela, aos meus olhos ela tornou-se invisível. Talvez fosse verdade, eu não importava com coisas fúteis e rasas, mas ela era diferente.

Diante de todo desejo, ela sequer tentou atrair minha atenção como as outras garotas faziam. Muito pelo contrário. Passou a me evitar desviar o olhar sempre que me via. Como se desejasse alguma coisa, mas não tinha ousadia em pedir. Gostei da inocência que exalava dela, mas pude sentir a ânsia em se livrar disso.

Os faróis iluminaram de relance a janela, denunciando que ela havia chegado. Após Jean ter estragado minha primeira investida decidi ir embora e tentar novamente agora. A casa foi indicada pelo meu pai e eu tinha a cópia da chave, até porque foi eu mesmo quem pediu para que ele indicasse. Seu pai não estaria em casa, era apenas eu, ela e o medo.

Fiz um coque desgrenhado em meus cabelos para que ela não percebesse que era eu. Abaixei a cabeça cobrindo o máximo que conseguia com o capuz, apenas esperando por ela.

O barulho de chaves se chocando resultou e logo depois a porta foi aberta.

O calor se arrastou pelo meu pescoço, infiltrando-se em meu peito e expirei silenciosamente, sentindo o coração bater forte e ansioso.

— Pai, cheguei — cantarolou.

Senti um frio intenso na barriga, fechei os olhos saboreando.
A casa era iluminada apenas pela luz da lua, deixando o ar mais sinistro. O som de sua voz ecoou pela casa vazia, me mantive imóvel no canto escuro, esperando por fim que ela me encontrasse.

Vi ela levar a mão até o interruptor e tentar acender as luzes em um click, porém como eu já havia desligado o disjuntor, as luzes não acenderam.

— Merda! — murmurou. — Pai? Já chegou?— suspirou audivelmente sem obter respostas.

Vejo ela enfiar a mão no bolso da jaqueta e retirar o celular, após um deslize na tela a lanterna traseira acendeu. S/n girou a cabeça para a esquerda e para a direita e a luz acompanhou seus movimentos.

Seu ritmo respiratório acelerou, sua consciência estava vindo à tona conforme ela apertava o tecido da sua jaqueta.
Lutei para conter o sorriso, inclinei a cabeça observando-a. Eu deveria avisar que estava aqui e que ela estava segura.
Mas quanto mais nervosa ela ficava, mais desejo em continuar eu sentia.
Amedrontada e acanhada. Não fazia a menor ideia que eu estava aqui, - ou talvez fizesse mas isso não mudaria nada -. Ela não sabia que meus olhos estavam focados nela nesse exato momento.

Eu não queria assustá-la, mas fiz do mesmo jeito. Não queria gostar daquilo pois me deixava doente.

— Pai? — gritou.

Comecei a respirar com dificuldades, cercando o punho no bolso do moletom, temendo a me mesmo. Isso não era normal.

— Droga! — retrucou após o silêncio.

Mas a teimosia que brilhava em seu olhar em encontrar logo a luz por causa do medo, fez com que meus lábios se curvasse em um sorriso embaixo do capuz.

𝗙𝗲𝗮𝗿, 𝙀𝙧𝙚𝙣 𝙔𝙚𝙖𝙜𝙚𝙧Onde histórias criam vida. Descubra agora