Prólogo: Línguas

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Falar, falar e falar.

O vilarejo estava agitado hoje.

Eram apenas oito e meia da manhã quando finalmente despertou, calçando seus sapatos folgados, tratando de sua higiene pessoal, e seguindo para mais um dia de trabalho duro em uma lojinha de artefatos preciosos de sua família, quase escondida em meio a tantas outras bancadas soltas espalhadas pelo reino de Yauska. A região onde morava era farta, por mais complicada que fosse a locomoção no local, porém, a competição por um espaço a mais de venda era gigantesca.

E hoje, tudo parecia pior ainda. Pois, de acordo com as línguas existentes por alí, havia "carne nova" na região; termo qual moradores locais costumavam chamar pessoas de fora, que vinham visitar ou se alojar permanentemente no reino.

— Está atrasado, Jeonghan — ouviu seu pai dizer em bom tom; grosseiro e mal humorado, como em todos os dias da sua vida desde quando nasceu. Pelo menos, até onde lembrava-se.

— É o horário que eu sempre chego... — murmurou como resposta, tentando, ao máximo, não passar um tom indiferente ao seu progenitor. Por mais que aquele fosse o seu querer...

Ah! Yoon Jeonghan... como podemos descrever essa criatura delicada e peculiar em tão poucas linhas de prólogo?

O garoto loiro, de aparência madura e estatura média alta, fora o filho menos planejado da sua humilde família de cinco pessoas, chegando por último após um pequeno descuido de seus pais, e em uma época onde suas condições financeiras não estavam nem um pouco boas para mais uma criança ser posta no mundo por eles. Com um irmão mais velho já fora de casa por seus (compreensíveis) princípios, e uma irmã do meio prestes a sair também após conhecer o amor da sua vida, o considerado indesejado fora o único que sobrou.

E o que lidava com as consequências de ainda estar ali, entendendo, todo o santo dia, o porquê de seus irmãos terem saído sem ao menos se despedirem de si.

— Pois trate de acordar mais cedo a partir de hoje, então — retrucou, sério, o homem mais velho. Erguendo-se para encarar o filho pegar uma pequena vassoura ali perto, seu início de trabalho, até que o outro o fizesse carregar o que conseguia ou não durante o dia inteiro — Visitantes chegaram essa manhã, alguns refugiados, outros não

"Pela quantidade de pessoas que eu vi entrando pelos portões de Yauska, vamos vender artefatos preciosos o suficiente para conseguir pagar a dívida que seu irmão deixou nas nossas costas antes de fugir" uma grande mentira, o Yoon pensou "E o que sobrar..."

— Vai para nossa casa, ou fica sob o seu cuidado antes de sumir "magicamente" de novo? — murmurou para si mesmo enquanto varria, logo, tomando consciência do que havia soltado sem querer.

— O que disse, seu idiota imprestável? — em um piscar de olhos, o loiro teve a vassoura segurada e a roupa puxada para perto do homem um pouco mais alto que si, com brutalidade; fazendo-o piscar com rapidez suas orbes cor havana e encarar o outro.

Eu... eu disse que... — respirou fundo, tentando controlar-se e recuperar a voz falhada; porém, já sentindo suas mãos tremerem e seu coração palpitar de uma forma terrível. Estava acontecendo de novo... — Eu disse que... o que sobrar, vai ficar sob o seu cuidado, e isso está totalmente certo... você é quem toma conta daqui e eu acho que- Ai!

— Volte ao seu trabalho e pare de opinar no que eu não pedi a sua ajuda! — cuspiu após jogar o garoto no chão frio com brutalidade, indo para o lado de fora a fim de abrir seu espaço e iniciar as vendas diárias por um preço bem mais caro do que seriam os artefatos reais; apenas para os forasteiros gastarem todo o seu dinheiro ali.

— Você tem trabalho a fazer — ouviu a voz de sua mãe soar atrás de si, conforme levantava-se lentamente diante seus olhos... não recebendo ajuda alguma — Não faça corpo mole ou vai ser bem pior, e você sabe disso

— Ainda tenta me dar um manual quando eu já sei de tudo isso? — visou a mulher, segurando o pulso dolorido pela queda.

Chegava a ser hilário os avisos vindos desta à frente... principalmente, quando sabia muito bem que esta não se importava.



— Ei, garoto — Jeonghan visou a moça ali perto enquanto terminava de juntar tudo o que precisava para levar, qual chamou-o anteriormente; mesmo que não o conhecesse — Você ficou sabendo?

— Sabendo do que? — Mais fofocas...

— Os refugiados foram mandados de volta para as suas devidas províncias, obrigados — comentou, colando seu ombro ao do loiro; como se, de repente, fossem melhores amigos de longa data. Jeonghan afastou-se um pouco, mas a mais velha prosseguiu grudada em si até a outra lojinha — Eles vieram foragidos do reino vizinho, sabia? Deve ter acontecido algo terrível por lá, principalmente agora, que foram obrigados a voltar, não se sabe o que vai acontecer

— Eu espero que fiquem bem... — Jeonghan confirmou, um tanto preocupado — Mas era sobre isso? Não esperava uma reação dessa da guarda?

— Deles? Nah, já sim!

"O que me intriga foi o foragido que ficou"

Visou a mulher de idade com atenção, confuso por um momento; até onde lembrava, refugiados ilegalmente de um reino para o outro não poderiam ficar em Yauska, independente do que estivesse acontecendo em sua região. Era uma lei falha, na sua humilde opinião, e perigosa em diversos aspectos até mesmo se o caso fosse causar uma rebelião entre os moradores e forasteiros, mas algo que aprenderá... era que ninguém daquele reino se importava com algo, sem ser o ouro e outras pedras preciosas.

— Como assim "o que ficou"?

— Como posso explicar?... — olhou ao redor, logo sorrindo — Oh, bem na hora!

Então, a mais velha o vira rapidamente para uma parte da região onde estavam...

E o loiro não conseguia crer no que estava fitando naquele exato momento.

Era um homem alto, forte, e de aparência surreal — no bom sentido; ele usava um pequeno óculos redondo em seu rosto e carregava consigo uma bolsa lateral que parecia levar livros pesados. Suas roupas eram simples, seu ar continha mistério, e observava cada lojinha com atenção, parecendo buscar alguma coisa específica.

De longe — pelo canto de olho — pôde ver seu pai abrir um longo e falso sorriso, pronto para receber o refugiado em sua pequena bancada de artefatos que seria a próxima onde o forasteiro iria parar.

Até o homem encará-lo de volta de repente, e ficar totalmente paralisado.

Não notou o sorriso de seu pai se desfazendo quando entendeu que o filho fora uma distração para os negócios, apenas que o homem bonito o encarava de volta, como se estivesse estudando-o e procurando saber mais sobre a figura loira perfeita a sua frente.

E foi assim... que a sua verdadeira história, criada pelo destino, começou.

Eternal Happiness • jeongcheolOnde histórias criam vida. Descubra agora