Provações noturnas

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As glórias dos sonhos vinham com o descansar, porém, pela terceira noite seguida, Meredith mal conseguia pregar seus olhos. O corpo girava de um lado para o outro, e quando se cansava de estar deitada, se punha a ajoelhar diante a imagem santa, pedindo que seus caminhos fossem direcionados e seu repouso fosse concedido. Seu chamado, ainda que doloroso, parecia não ser ouvido, muito pelo contrário, se sentia mais sozinha do que nunca.

Como afago para noites não dormidas, o livro de capa dura lhe servia como consolo maior, lendo e relendo várias páginas, mas sempre voltava a página doze. O poema tinha gosto, cor e vivacidade, pois quando colocado na voz de alguém ele ganha vida. Em sua mente, a voz de Addison ecoava como uma melodia, e ainda que houvesse dito a Meredith que não possuía segredos, algo no modo como ela evocava as palavras dizia o exato contrário.

Nas palavras doces de uma mulher, Meredith encontrava paz de pensamento, ainda que seu corpo negasse com veemência. Era muito mais comum sofrer com o racional que atormentava, porém sua mente suavizava seus quereres mais profundos, não seguindo sua lógica corporal. Em sua mente, as palavras de Addison lhe rodeavam, lhe abraçando o corpo com o fim de emergia-la em águas tranquilas. Porém, na matéria, a carne ardia só por pensar em ser tocada daquela forma, pelas mãos de uma mulher. Inadmissível, até de se imaginar.

O livro é fechado de forma sonora, ao que sua cabeça pesa, se encostando contra a parede gélida que lhe servia de apoio. De volta em seu quarto, na casa de seus pais, os livros de temática proibida foram queimados por suas próprias mãos, buscando manter sua santidade, ainda que os desejos falassem mais alto. Se a imagem de alguma mulher lhe vinha a cabeça, as orações redobravam em escala perfeita ao tamanho da culpa que sentia. Tão jovem e tão cheia de desejos. A repressão não lhe afagava como a eloquência de Addison Montgomery fazia.

O corpo se movera sobre os lençóis, abrindo a gaveta da móvel ao lado de sua cama, tirando dali uma caneta preta e papel pautado. Um suspiro fora dado enquanto seus pés se mexiam inquietos. Amar de forma visceral. Podia haver então uma menção dolorosa a resistência em amar alguém? Com a ponta dos dentes, ela mordera o canto de seu lábio inferior, colocando a ponta da caneta sobre o papel. Como escrever mantendo segredos? Como esconder deixando livre? Aquela atividade era insana.

Dentro de si, uma lufada de ar se dava como se quisesse dizer a si mesma que o papel não lhe cortaria por escrever seus desejos, ainda que fossem os mais profundos. O desejo pelo o que não poderia ser tocado por ela sempre vinha a mente, mas nunca com forma, nunca com lábios, olhos coloridos e um cabelo sedoso. Se vinha, era nublado e logo afastado pela mão que tocava seu crucifixo, se lembrando de que apenas a oração lhe salvaria do pecado que tanto lhe atormentava.

A caneta fora colocada de lado, bem como o papel. Sua mão trêmula segurava o crucifixo, e com os olhos apertados a oração era dita diversas vezes até que os lábios de Addison Montgomery parassem de ser mover tão vividamente em sua mente.

────...E não nos deixe cair em tentação, mas livrai de todos os males. Amém! ────O ar saira de uma vez só de peito, aquilo era o correto.

Eve's Garden ▪︎ MEDDISONOnde histórias criam vida. Descubra agora