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"Saiba que eu te amei tanto

Que eu deixei você me tratar assim

Eu fui sua cúmplice voluntariamente, amor

E eu assisti enquanto você fugia da cena

Olhos de corça, enquanto você me enterrava

Um coração partido, quatro mãos ensanguentadas."

Favorite Crime - Olivia Rodrigo

O que doeu nem foi tanto o seu nariz, apesar do soco direto de Pamela quase ter quebrado-o de tão certeiro e potente. A dor maior vinha do fato de que mesmo sabendo da sua inocência em relação à morte de Bruce, a ruiva optou pelo silêncio. E, quando minimamente provocada em relação ao marido, Ivy reagiu como um animal selvagem, tão protetora que chegava a ser nojento. Essa proteção era a mesma que Harley costumava dar a ela quando adolescentes e por causa dela foi julgada e condenada por todos, inclusive pela própria Pamela.

Era um pouco revoltante, para ser franca.

Tentava manter o espírito elevado e usar de seu humor cínico para se sobressair em todas as situações e mascarar seus sentimentos, mas estava cada dia mais difícil fingir para si mesma que não amava mais aquela ruiva estúpida que havia se casado com um maldito homem. Por mais que se esforçasse, que interpretasse um papel, que manipulasse ao máximo as situações e pessoas ao redor, incluindo Valentina, Harley estava se equilibrando em uma corda bamba desde que deixou Arkham e essa corda parecia mais estreita e escorregadia a cada dia.

Não era de fazer planos, embora escrever um livro requeresse o mínimo de planejamento. Ela criou uma história que levou meses para ser gerida, sendo reescrita diversas vezes até ser lapidada e pronta para ser vista pelo mundo. Mas Harley nunca se importou com o mundo. As outras pessoas eram meras espectadoras baratas do show que queria protagonizar ao lado de Pamela. No filme de sua vida, não havia espaço para mais ninguém exceto Ivy, a sua melhor amiga, sua primeira e até então única namorada. O seu grande amor.

As coisas com Valentina eram complexas e nem Harley previu o ponto que poderiam chegar. Ainda no sanatório, a menina não imaginou que fosse ser convidada para morar com ela, ainda mais assim, logo de cara. Menos ainda que levariam poucos meses para firmarem uma relação sólida e íntima onde todas as amarras da psiquiatra pareciam ter sido desfeitas num estalar de dedos. Foi como se Quinzel, sem grandes esforços, derrubasse aqueles muros que pareciam impermeáveis em questão de instantes apenas com um sorriso sedutor e palavras dóceis.

A princípio, Harls não podia negar que tinha, sim, uma espécie de plano para tentar reencontrar Pamela, porém logo de cara se viu completamente perdida ao voltar para o mundo real depois de mais de uma década trancada, sendo que na época de seus crimes, ela não passava de uma criança. Se viu abismada com tanta tecnologia, tantos recursos à sua mercê, ainda mais porque Valentina era rica e disponibilizou tudo o que tinha para ajudá-la a se reinserir na sociedade. Talvez isso tenha feito com que Quinn se perdesse de sua ideia original, especialmente quando começou a beber demais e a se envolver com muitas pessoas ao mesmo tempo, como foi o caso do cantor e de seu editor, ambos ironicamente mortos agora. Mas, independente disso, sempre manteve o foco em atrair Pamela para si e sabia que caso seus livros fizessem sucesso isso seria uma consequência. E foi. Porém não da forma como havia planejado.

Matar trazia uma sensação indescritível de prazer e todos os dias Harley sentia falta dela. Passava horas revivendo seus crimes, cada um deles. Relembrava os mínimos detalhes da logística, de como matou, das armas que usou e, principalmente, das emoções que lhe dominaram no ato. Mas, mais que sentir falta da sensação de matar, Harleen sentia uma saudade sobrenatural de Pamela e de tudo que viveram juntas. Tanto que às vezes sentia que seria capaz de abandonar o seu lado sombrio e selvagem se pudesse ter a oportunidade de recomeçar ao lado dela.

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