3.2 Sabotagem

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Dez horas da noite, prontos para abrir o bordel, eu pedi as fichas de cada uma das putas à Lola, que havia ficado encarregada. Ela me entregou com um sorrisinho, e eu preferi não ter nenhum contato maior que o necessário com sua personalidade intempestiva em plena noite de inauguração do método novo, então só as enfiei no bolso e dei as costas para ela.

Tudo começou tranquilo, com as meninas andando entre as mesas com poses perfeitas de garçonete, acostumando a clientela à nova postura. Eu podia ver os cavalheiros com os olhos vidrados nas moças, tentando puxá-las para conversar e se admirando quando elas apontavam pro teto e faziam cara de quem sente muito.

Antes mesmo de começarmos as apresentações, duas delas já estavam enfiadas nos quartos, ocupadas prestando seus serviços, e eu considerei aquilo um bom sinal.

Mercedes ainda se confundia com as bebidas que precisava preparar para os clientes, mas aquilo parecia ser um charme a mais, pois eles riam e a desculpavam a partir do momento em que ela balançasse os quadris minimamente.

Coloquei Atibaia de olho em Lola, para que ela puxasse a colega para andar sempre que ela teimasse em fincar os pés em alguma mesa. De alguma forma, eu sabia que ela não ia seguir as minhas instruções, apenas de teimosia.

Depois de algumas interrupções a meu mando, vi as duas discutindo em um canto e fui até elas, pronto para trocar mais algumas farpas com meu desafio particular.

- Chega! As pessoas estão vendo o desentendimento. Vamos, uma para cada lado. — bati as mãos, dispersando, e Lola segurou no meu colarinho com força antes de deixar o lugar. Aproximou nossos rostos e sussurrou energicamente:

- Eu não sei quem você pensa que é, mas espero ansiosamente a hora que você vai perceber que isso aqui não é o seu puteiro.

Ela me soltou e foi pra mais uma mesa, e eu revirei os olhos, entediado.

Resolvi depois de mais de uma hora, quando o lugar já estava mais cheio, que podia começar o "leilão". Fiz um sinal para Selena trocar a música e outro para que Ceci me acompanhasse até os holofotes.

Encontrei sua ficha no exato momento em que a batida mudou e segurei o microfone para fazer a narrativa.

- Ceci tem 1,68m de pura gulodice, é sanguinária e bate como ninguém. Prefere não raspar as pernas, mas nossa dominatrix faz os pelos serem o último de seus problemas, enquanto você vê Jesus Cristo entre uma chibatada e um apertão no mamilo daqueles que sua mãe preferia não saber ser do seu gosto. — tinha algo muito errado. Aquele discurso estava fazendo as pessoas rirem, Ceci inclusive, e aquilo não era para ser um show de stand-up comedy!

Encontrei meu olhar com Lola, a responsável pela ficha engraçadinha, e me senti rosnar como um leão. Larguei o microfone com violência e fui até ela, puxando-a pelo braço para o escritório de Papá, que estava vazio por ele estar acompanhando alguns amigos em uma das mesas.

- Qual é a porra do seu problema, prostituta? — gritei em seu rosto, sem paciência alguma. Ela tinha conseguido me tirar do sério. Essa história de me desobedecer era apenas areia no meu sapato enquanto não afetasse de verdade meu trabalho, mas agora o limite havia sido cruzado. Eu não estava passando meu tempo e gastando minha disposição naquele lugar para ser atrapalhado por uma garota arteira.

- Você é meu problema, seu engravatado mimado! — ela gritou no mesmo tom, vermelha como um pimentão. Ficou bem claro que eu a incomodava no mesmo nível e que aquela conversa iria além das malditas fichas corrompidas. - Acha que pode chegar aqui e ditar as regras do jogo quando você sequer nos respeita para começo de conversa?

- Uma puta pedindo respeito, era só o que me faltava. — Ri, irônico, revirando os olhos.

- Respeito, sim! — Lola me puxou pela camisa — essa parecia ser sua mania -, me fazendo olhar em seus olhos raivosos novamente. - Ninguém entra nessa vida porque quer, seu infeliz. E você não se dá ao trabalho de olhar pra gente com o mínimo de dignidade só por pensar o contrário! — ah, pelo amor de Deus. Eu não tinha nada que ser obrigado a amar aquelas garotas, só suportá-las e trabalhar com elas como em qualquer emprego normal. Ela era tão surtada que não percebia isso?

- Olha aqui, eu estou nesse lugar tem dois dias e já sei o nome de todas, então você não venha me dizer...

- O nome de guerra, parabéns, estúpido! — me interrompeu. Eu odiava quando me interrompiam. - Isso qualquer cliente pode saber sem nem conversar com a gente. Vai querer pagar pra foder também?

- Eu prefiro transar com mulheres de verdade, obrigado. — respondi com escárnio, mostrando todo o meu desprezo pela sua profissão. Lola deu mais uma risada cética, como se não acreditasse que eu tivesse dito aquilo realmente. Me soltou e deu dois passos para trás, criando alguma distância.

- É por isso que elas olham torto pra você de tempos em tempos, sabia? — murmurou, a voz subitamente fraca. - Elas não são idiotas e sabem que você não só não é do ramo, como tem nojo da gente. — nojo era um exagero considerável. Eu só não queria fazer parte de suas fotos de capa no Facebook. Pra mim aquilo era trabalho, não amizade. Era tão absurdo assim pensar daquele jeito?

- Eu tô aqui para salvar essa espelunca, não pra dormir com a equipe. Vocês deviam ficar agradecidas, é menos trabalho! — gesticulei, soando um tanto óbvio aos meus ouvidos.

- Como você pretende vender os nossos serviços se nem conhece eles direito, se sequer tem interesse por conta própria? — ela negou com a cabeça e olhou para qualquer lugar que não fosse eu, parecendo... Machucada. Mas por que diabos...? — Eu não vou mastigar as coisas pra você, Matteo. Se quiser fazer dinheiro aqui vai ter que superar seu preconceito babaca.

Lola me deixou ali sem direito de resposta e voltou para o salão, tomando o microfone nas mãos e conduzindo ela mesma, de um jeito muito único, o restante das apresentações. Não precisava de fichas, pois conhecia as colegas muito bem, e conseguiu atingir o perfeito contraponto entre um leilão leve, engraçado, e extremamente erótico, que deu o que falar pelo resto da noite.

Todas as meninas arranjaram mais de um cliente. Mas Lola não. Lola preferiu negá-los com graciosidade e se retirou ao fim do expediente para seu quarto exclusivo, de onde não saiu até a tarde do dia seguinte.

[Degustação] BordelOnde histórias criam vida. Descubra agora