𝐓𝐇𝐑𝐄𝐄

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Apoio meus cotovelos em meus joelhos e prendo minhas mãos em meus fios levemente emaranhados. Olho para baixo, na intenção de evitar contato visual com meu pai. Todo o meu plano de "evitar intrigas" foi por água abaixo.

─── Mayumi, você não pode simplesmente quebrar as minhas regras. Se eu digo para você ir com a Tachibana e voltar cedo, é para você voltar cedo, ou eu falo grego para você?

Antes de sair de casa, tinha prometido que voltaria as nove, mas acabei me atrasando, já que Hina foi embora sozinha e eu tive que voltar com Keisuke. Infelizmente, Amaya viu a moto de Keisuke em frente de casa e teve que me dedurar, e agora eu estou escutando meu pai de chamando de irresponsável de diversas maneiras.

─── Pai, eu acho que ela já entendeu, por que não deixa ela subir? ─── Mitsuo sugeriu.

─── Eu não sei não, hein. Acho que se você deixar ela ir, isso vai continuar se repetindo. ─── Seu olhar de desprezo era visível, somente meu pai não via. Essa mulher me odeia só por eu nascer.

─── Pai, eu só cheguei uns minutos atrasados.

─── Você diz isso como se fosse algo normal? Eu nem deveria ter deixado você sair, quem me garante que você não encontrou com aqueles delinquentes?

Eu odeio quando ele traz esse assunto a tona. Ele diz para "esquecer" que eles existem, mas sempre volta a falar deles. Que hipócrita!

─── Sabe como é difícil ter uma filha rebelde? Se alguém tivesse me avisado há quinze anos que a minha filha séria amiga de "caras de gangue" eu jamais teria tido uma.

Depois de tais palavras saírem da boca dele, a sala se tornou um silêncio total. Até Amaya parecia um pouco chocada, por mais que ela disfarce. Tentava falar algo, mas nada vinha na minha mente a não ser "Eu jamais teria tido uma". Consigo sentir as lágrimas se formando e descendo pelo meu rosto. Cenas assim se tornaram normais para qualquer um daquela casa.

───  Me desculpe por não ser a filha que você tanto sonhou, eu juro que tentei. Tenho certeza que a minha mãe nunca me falaria isso, tenho certeza que ela me amaria independente de quem eu escolhesse ser amiga.

─── Mayumi, a sua mãe está morta! Ela morreu há oito anos, você nunca vai superar? Essa é a sua única desculpa?

"Sua mãe está morta!"

E ele não mentiu. Minha mãe está morta. Mas ouvir isso é como se alguém, sem piedade alguma, tivesse arrancado um pedaço de mim. 

Apenas deixo ele falando sozinho e subo para o meu quarto, não sou obrigada a escutar ele falando essas merdas. Não sou obrigada a escutar ele falando da minha mãe dessa forma.

Meu quarto está escuro, apenas com a luz da lua iluminando o quarto, então eu ligo o abajur, fazendo o cômodo ficar um pouco mais claro. Alguns murmúrios ainda poderiam ser escutados lá embaixo, mas isso não importava. Apertei um pouco os olhos, com a intenção de afastar os pensamentos intrusivos. As palavras cruéis de meu pai ainda rodavam pela minha mente, por mais que eu tentasse expulsá-los. Minhas mãos começaram a tremer involuntariamente, logo, um aperto se formou em meu peito, como se algo estivesse esmagando minha respiração. As lágrimas começaram a escorrer pelo meu rosto, enquanto eu tento não fazer barulho.

Pego uma pequena navalha que estava em minha gaveta e me sento ao lado da minha cama. As lágrimas descem com o sangue em meus pulsos, a dor dos cortes não é nem comparada a dor psicológica que eu venho sentindo.

É como se o tempo parasse e só eu existisse. Eu só queria acabar com isso há muito tempo, mas eu não consigo. Me falta coragem.

Olhando para os meus braços e vendo todo o sangue escorrendo, eu apenas me pergunto: quando eu virei isso? Quando eu virei esse ser desprezível? Quando eu deixei de ser a menininha do papai e virei o motivo da decepção dele?

𝐓𝐖𝐄𝐋𝐕𝐄 𝐘𝐄𝐀𝐑𝐒, Chifuyu MatsunoOnde histórias criam vida. Descubra agora