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POV Gabriela

A folha preta amarronzada cessou a sua luta contra ficar pendurada; rendeu-se em vez disso, a força da gravidade, para o fluxo do vento. Voou impotente, sem rumo sobre os táxis em uma dança improvisada, com passos improvisados até que, finalmente, pousou.

O lápis parou no meio do seu caminho, seu movimento interrompido por um intruso inesperado em seu caminho. Gabriela limpou a folha com a sua mão esquerda antes de se sentar para examinar o seu progresso. Ela olhou para as linhas perfeitas em preto e branco que formavam uma réplica exata do parque ao seu redor: O banco que agora estava ocupado, as árvores nuas, as folhas secas que estavam próximas, as pessoas passeando. Ela levantou o seu olhar do bloco de notas para comparar a recriação quase perfeita com a realidade, e suspirou.

Como era possível ela preencher uma página em branco com tudo o que ela via? Como ela conseguia capturar sorrisos, sons, tristezas e desespero com um simples traçar de um lápis? Ela conseguia? Era possível?

As mesmas perguntam que sempre pairavam pela sua cabeça e que eram impostas pelo fantasma que a obrigava a duvidar de si mesma. A necessidade de começar tudo de novo; a necessidade de criar e recriar até que nenhuma dúvida restasse. A folha se rasgou facilmente do seu bloco de notas e tornou-se nada mais do que uma bola amassada e desapareceu em uma eternidade de tentativas descartadas.

- Desculpa, eu estou atrasado. - Ele disse num tom de voz que traía sua falta de sinceridade. Seus lábios encostaram nos delas em uma apresentação apressada e ele se sentou no banco ao seu lado, uma mão enfiada no bolso do seu longo casaco preto e a outra segurando um cigarro.

Seus olhos escuros se demoraram no vazio da folha branca.

- Já são cinco horas? - Ela perguntou mesmo sabendo que já eram mais de seis horas. - Acho que perdi a noção do tempo. - Então levantou o seu olhar para o namorado tentando sentir alguma coisa. - A aula atrasou? -

- O professor queria falar comigo sobre o meu último trabalho. - Ele disse enquanto a fumaça do cigarro saia dos seus lábios. Ele tirou um papel do bolso e entregou a ela. - Olha só. -

Tinha um grande “A” estampado no topo da página com caneta vermelha. Ela sorriu, tentando se sentir orgulhosa, mas sentindo um ressentimento no lugar.

- Esse trabalho é aquele que você fez de qualquer jeito? -

- Genialidade é uma coisa espontânea para algumas pessoas - ele riu enquanto jogava a guimba do cigarro no ar.

O cabelo comprido dele caiu sobre seus olhos e sem ao menos perceber Gabriela colocou de volta no lugar. Ele sorriu para ela e depois de uma beijo na palma da mão que estava repousada na bochecha dele.

- Desculpa por eu estar tão ocupado ultimamente. -

Gabriela olhou para ele por um bom tempo, parando nos lindos olhos que um dia tiveram o poder de desarmar ela. O que aconteceu, ela pensou. Pra onde foi?

- Ta tudo bem, Lucas. - Ela disse, sabendo que mais dia ou menos dia ela teria que contar a verdade para ele.

Ele se inclinou para beijá-la e ela sorriu contra seus lábios, saboreando o doce amargo da familiaridade. Ela desejou que pudesse tirar uma foto daquele momento e moldá-la contra seus pensamento sombrios. Ela queria sussurrar um “Eu te amo” por força do hábito, sem nada mais. Mas ela sufocou o impulso e se afastou.

- E então, o que você estava fazendo? - Ele perguntou se sentando de novo. Seu olhar sobre o bloco de notas que agora estava no colo dela.

Gabriela olhou para baixo e deu de ombros, sentindo raiva de si mesma por não ter nada para mostrar. Como ela desejava que alguma coisa maravilhosa aparecesse nas páginas vazias para que ela pudesse mostrar a ele que ele não era o único com um futuro brilhante. Em vez disso, se sentiu nua, seu fracasso exposto na ausência explícita da motivação.

The Blind Side Of Love - Sheibi (Adaptação)Onde histórias criam vida. Descubra agora