Capítulo 2

10 0 0
                                    

DAS RESTRIÇÕES SOBRE A IMPORTAÇÃO DE PAÍSES ESTRANGEIROS DOS BENS QUE O PAÍS PODE PRODUZIR

Restringindo, por altas taxas ou por proibições absolutas, a importação de bens estrangeiros que o país pode produzir, o monopólio do mercado doméstico fica mais ou menos garantido para a indústria doméstica empregada na produção deles. Assim, a proibição de importar gado vivo ou provisões de sal de países estrangeiros assegura aos criadores da Grã-Bretanha o monopólio do mercado doméstico da carne. As altas taxas sobre a importação do cereal, que em tempos de abundância moderada equivale a uma proibição, dá uma vantagem análoga aos criadores daquela mercadoria. A proibição da importação de lãs estrangeiras é igualmente favorável aos produtores de lã. A manufatura da seda, se bem que utilize inteiramente materiais estrangeiros, recentemente obteve a mesma vantagem. A manufatura de linho ainda não a obteve, mas está dando grandes passos nessa direção. Muitas outras espécies de manufatura, do mesmo modo obtiveram, na Inglaterra, totalmente, ou quase, um monopólio contra seus conterrâneos. A variedade de bens que têm a importação para a Inglaterra proibida, absolutamente, ou em certos casos, excede grandemente o que se pode suspeitar facilmente por aqueles que não estão bem familiarizados com as leis alfandegárias.

Não se pode duvidar que este monopólio do mercado doméstico dá grande encorajamento àquela espécie particular de indústria que dele frui, e frequentemente volta àquele emprego uma parte maior do trabalho e capital da sociedade, do que de outro modo seria possível. Mas se tende a aumentar a indústria geral da sociedade, ou dar-lhe a direção mais vantajosa, não é, talvez, muito evidente.

A indústria geral da sociedade nunca pode exceder o que o capital desta sociedade pode empregar. Como o número de trabalhadores que podem ser mantidos empregados por qualquer pessoa deve manter uma certa proporção para seu capital, o número daqueles que podem estar continuamente empregados por todos os membros de uma grande sociedade deve manter uma certa proporção para o capital todo daquela sociedade, e nunca pode exceder esta proporção. Nenhum regulamento do comércio pode aumentar a quantidade de indústria em qualquer sociedade além do que seu capital pode manter. Pode apenas desviar parte dele numa direção que de outro modo não tomaria; e de modo algum é certo que esta direção artificial poderia ser mais vantajosa para a sociedade do que aquela em que iria por si só.

Todo indivíduo está continuamente esforçando-se para achar o emprego mais vantajoso para o capital que possa comandar. É sua própria vantagem, de fato, e não a da sociedade, que ele tem em vista. Mas o estudo de sua própria vantagem, naturalmente, ou melhor, necessariamente, leva-o a preferir aquele emprego que é mais vantajoso para a sociedade.

Primeiro, todo indivíduo procura empregar seu capital o mais perto de casa que pode, e consequentemente, ao máximo no suprimento da indústria doméstica; desde que ele possa obter os lucros ordinários, ou não muito inferiores a ele, de seu capital.

Assim, com lucros iguais, ou quase, todo negociante atacadista naturalmente prefere o comércio doméstico ao exterior para consumo, e o comércio exterior de consumo ao negócio de transportes. No comércio doméstico, seu capital nunca está tão longamente fora de sua vista como acontece frequentemente no comércio exterior. Ele pode conhecer melhor o caráter e a situação das pessoas em quem confia, e se acontecer de ele ser enganado, conhece melhor as leis do país onde deve procurar retratação. No negócio de transportes, o capital do negociante é como que dividido entre dois países estrangeiros, e nenhuma parte dele deve ser necessariamente comprada em casa, ou colocada sob sua vista e comando imediato. O capital que um mercador de Amsterdam emprega ao transportar cereal de Königsberg a Lisboa, e frutas e vinho de Lisboa a Königsberg, deve ser geralmente a metade em Königsberg e a metade em Lisboa. Nenhuma parte dele precisa vir a Amsterdam. A residência natural de um tal comerciante poderia ser quer em Königsberg, quer em Lisboa, e só circunstâncias muito particulares poderiam fazê-lo preferir a residência de Amsterdam. A inquietação, porém, que ele sente ao ficar tão separado de seu capital, geralmente o faz resolver trazer parte das mercadorias de Königsberg, que ele destina ao mercado de Lisboa, e das mercadorias de Lisboa que ele destina ao de Königsberg, para Amsterdam: e se bem que isto necessariamente o sujeita a um duplo trabalho de carregar e descarregar, bem como ao pagamento de algumas taxas e impostos, com o fito de ter parte de seu capital sempre sob sua vista e comando, ele de boa mente se submete a este encargo extraordinário; e é desta maneira que todo país que tem qualquer parte considerável do negócio dos transportes torna-se sempre o empório, ou mercado geral, para os bens dos vários países cujo comércio exercita. O negociante, para economizar uma segunda carga e descarga, procura sempre vender ao mercado doméstico tanto das mercadorias de todos aqueles países diferentes quanto pode, e assim tanto quanto puder, converter seu negócio de transporte num comércio exterior de consumo. Um mercador, do mesmo modo, engajado no comércio exterior de consumo, ao coletar mercadorias para o mercado externo, sempre gostará, com os mesmos lucros, ou quase, de vender ao máximo a maior parte deles no próprio país. Ele economiza o risco e o trabalho da exportação, quando, tanto quanto pode, assim converte seu mercado exterior de consumo num negócio doméstico. O país, assim, é o centro, se assim se pode dizer, em torno do qual os capitais dos habitantes de todo país circulam continuamente e rumo ao qual estão sempre tendendo, se bem que por causas particulares podem por vezes ser afastados e repelidos para aplicações mais distantes. Mas um capital empregado no comércio doméstico, já foi mostrado, necessariamente põe em movimento maior quantidade de indústria doméstica, e dá renda e emprego a um maior número de habitantes do país do que um capital igual empregado no comércio exterior de consumo; e o empregado, neste, tem a mesma vantagem sobre um capital igual empregado no transporte. Perante lucros iguais, ou quase, portanto, todo indivíduo naturalmente estará inclinado a empregar seu capital do modo que poderá dar o maior apoio à indústria doméstica, e dar renda e emprego ao maior número de pessoas de seu próprio país.

A Riqueza das Nações (1776)Onde histórias criam vida. Descubra agora