Prólogo

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A menina corre, com vontade, enchendo as pequenas botas com areia. Sabe que a mãe vai ter que as sacudir antes de fazer o caminho de novo para casa, mas não se importa com qualquer reprimenda, não por agora, enquanto se diverte.

Não tem crianças para brincar afinal, é hora do almoço, devem estar a comer, mas a mãe trá-la sempre aqui na sua pausa do trabalho, só para a ver sorrir por um pouco.

Chega ao seu destino, o grande dinossauro do parque infantil, a sua boca é uma escadaria que leva à cauda e se transforma num grande escorrega. Ficava sempre especada em frente às escadas, como se aquela boca pudesse realmente engoli-la. E se se perdesse lá dentro, como já viu outros meninos fazerem? Como é que a mãe entraria lá dentro? É uma entrada demasiado estreita, e ela ficaria lá dentro, fechada, para sempre.

O pensamento fá-la prender a respiração, tenta criar coragem, como muitas outras vezes, mas os pés não querem mover-se.

Talvez devesse ir para a chávena presa por uma mola mesmo ao lado do dinossauro, como costuma fazer, quando o medo ganha. Pelo menos só abana, e se se desorientar, a mãe pode simplesmente arrancá-la de lá. Não seria uma missão impossível.

Quando se decide vê algo brilhar, bem no cimo das escadas, na entrada do tubo, pelo canto do olho e para os pés anteriormente decididos a caminhar para a chávena. O brilho é o que a faz dar um passo em frente. 

Olha em volta, ninguém está a ver o que ela vê. 

Será que é real? A mãe diz que a sua imaginação é muito fértil, seria fácil imaginar um buraco brilhante para convencer a cabeça a entrar finalmente no dinossauro.

Um pé em cima do primeiro degrau, e depois outro, só para ver melhor, não para entrar.

Ela inclina a cabeça de um lado para o outro e vê o círculo mudar de cores, à volta do tubo é mais azul escuro, e à medida que vai chegando ao meio vira um roxo prateado, tão brilhante, tão atraente.

Parece falar, sussurra, implora para que lhe toque. Fala apenas para ela, chama pelo seu nome, vezes e vezes sem conta, encoraja-a a esconder o medo no bolso e subir as escadas, chegar ao círculo.

Quando dá por ela já está de caras com a mistura de cores azuladas, mas não se assusta, pelo contrário, está maravilhada. O círculo tem cheiro, ou talvez sejam as suas cores, cheiram a flores, a lavanda, a algo calmo e relaxante.

A mão estende sem permissão, a cabeça está a funcionar demasiado lentamente para acompanhar o corpo, o raciocínio de que possa ser algo perigoso já foi jogado pela janela há muito tempo.

Talvez porque aquelas cores, aquele cheiro, sejam apenas feitos de coisas boas, é isso que ela sente no seu coração.

Agarra-se a essa sensação quando toca nele.

E é puxada para dentro. Como se uns braços a tivessem agarrado com força e a sugassem para outro sítio.

Espera ver o tubo, o tubo verde escuro assustador com que andou a sonhar durante dias, o seu inimigo, o que tinha que vencer.

E agora, depois de tudo o que lutou, de criar força para subir as escadas, não encontra o tubo para rastejar.

Em vez de plástico pintado encontra uma pedra clara, não tem o tubo à sua volta, está noutro lugar, um que nunca viu. A luz solar é muito forte, esconde os olhos com as mãos e sente a pele queimar. Ela geme, sentindo dor, algo que nunca sentiu, como se a pele estivesse a derreter.

Sente algo a tocá-la e, pensando ser alguém mau, que lhe queira magoar mais que as queimaduras, afasta-o com palmadas que demoram apenas um instante, porque tem que tapar novamente os olhos. Em vez disso tenta dar-lhe com os pés, e sente o seu alvo ser atingido.

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