Os Robes Amarelos

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Estou cansada de escuridão, do frio, da humidade.

Parece que tenho sempre as mãos engelhadas, o vento está constantemente a passar-me pelo corpo, pensei que vinha da pequena janela que tenho na cela, depois concluí que vem de todo o lado, das janelas, das paredes e do chão.

Os assobios duram o dia todo, no início eram irritantes, depois de um dia inteiro só os ouço se me concentrar neles.

Tenho um pequeno colchão para dormir, fino e sem estrutura para me manter longe do chão. Também me deram um cobertor, mas ainda não houve um momento em que me senti quente.

Chegamos de manhã à casa do Rei, passamos aqui o dia e a noite inteira, e agora está a anoitecer de novo. Já se tornam dois dias sem comunicação, nada a não ser as refeições e o ocasional olhar para verificar que estou cá dentro.

Sei que eles também estão presos, arrastaram-nos para quartos diferentes, mas já percebi que tenho a Bell ao meu lado e os rapazes estão nas duas em frente. Temos um postigo, que continua fechado até ao guarda vir confirmar se estou bem. Não sei como é que os outros estão, quando tento gritar por eles entram pela minha cela adentro para me bater, quando recebi um pontapé no estômago na primeira vez que tentei percebi a mensagem.

Ouvi o Helian gritar de raiva nas primeiras horas que estivemos aqui, por muito que os guardas o espancassem ele não queria parar. Cheguei à conclusão não muito tempo depois, acho que ele queria que o fizessem, talvez para se esquecer do que aconteceu. Suponho que estejamos todos assustados e frustrados.

Não esperávamos estar numa cela pequena, sem saber porque nos querem e porque o Kiell nos trocaria por alguém.

Que valor temos para haver sequer uma troca?

Ele disse que precisavam de nós. Não podemos fazer nada de especial, só somos diferentes, será que nos querem estudar? Se o Rei pode criar esses portais quer dizer que tem muita mais facilidade em arranjar pessoas como nós, porque é que o Kiell tinha que nos trazer como se fôssemos importantes?

O que vão fazer connosco?

É isso que me está a deixar louca.

Sei que temos um propósito, senão já estaríamos mortos.

Mas qual é o objetivo?

O meu habitual copo de água chega mal o sol se põe, depois dão-me dois bolinhos brancos dentro de uma caixa. Desfaz-se na minha boca, e tem uma textura esquisita, mas faço por comer, não quero morrer de fome, embora já esteja a caminhar para a minha morte, graças àquele idiota.

Passo muito deste tempo entediada, sem nada para me entreter, posso dedicar as minhas horas a tentar racionalizar o que o Kiell nos fez.

Acho que não foi difícil juntar as peças, ele contou-nos no caminho para aqui que havia uma pessoa que o amava, que cuidou dele quando mais precisou, e que lhe foi tirada, para o ferir. Foi o Rei, ele tirou-lhe essa pessoa, uma mulher, pela maneira como ele estava a falar.

Porque é que isso aconteceu ainda tenho que perceber.

Nuns momentos entendo-o, imagino-me na sua situação, em que alguém que amo me foi tirado. Se a única escolha fosse entregar quatro estranhos, o que faria? Entregaria esses quatro pela vida daquele que amo?

É provável que sim, não me importaria com os desconhecidos se soubesse que essa pessoa estaria a sofrer.

Mas seria essa a única escolha? Basicamente matar alguns para deixar viver quem amamos?

Noutros momentos penso na minha vingança, imagino-o à minha frente, e de repente o meu corpo voa e os meus dedos agarram-lhe o pescoço.

Vario entre assassina e compreensiva.

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