A decisão

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Rei Aguiar não sabia o que a filha queria, mas de uma coisa tinha certeza: não seria algo fácil.
- Pai, eu quero fazer missões. Ir para os países mais pobres ajudar.
Isso seria lindo para uma princesa, mas não nas condições que a garota queria.
- Ai meu Deus Valentina, você tem noção do que está querendo? Disse o rei inconformado.
- Tenho pai, e é bem simples.

O rei amava a menina mas sabia que tinha que arrumar um jeito de fazê-la desistir daquela ideia. Primeiro porque ela era uma princesa e precisava focar nas coisas do reino, logo seria uma rainha e precisava se casar. Se casar. Acabara de ter uma ótima ideia, por mais que a filha era nova, uma decisão consciente precisava ser tomada.

-Tenho uma condição...
- Qualquer coisa pai.- Respondeu a menina pensando que a coisa mais diferente que o pai poderia pedir a ela fosse que o acompanhasse em uma daquelas reuniões chatas, começasse um novo idioma que poderia fazer com que ela conhecesse um príncipe de longe ou algo do tipo.
- Você precisa arrumar um noivo minha filha.

Valentina não estava acreditando no que o rei acabara de dizer. Com toda a certeza do universo era uma piada, sabia que o pai a faria desistir de deixar o Longívea mas aquela proposta não poderia ser real.

-Ah, claro! Disse Valentina rindo de maneira meio histérica, fruto do medo de que fosse verdade.
- Não estou brincando. O reino precisa de você. Precisa de você como nunca precisou antes. Te treinei todos esses anos pra isso pequena e só poderá cumprir seu papel com um príncipe, seu futuro rei ao seu lado. Depois disso poderá passar um ano fora.

Valentina sabia que não era verdade. Que marido, mesmo que fosse um "marido real" deixaria sua esposa passar um ano em missões? Mas algo na voz de seu pai a preocupava. Sabia que tinha um tom sério e preocupado, como se algo que precisava ser dito, não pudesse ser dito.

- Vamos embora. Disse o rei já do lado de fora da igreja.
-Mas, pai...

Alaor já estava na porta da igreja, esperando que as realezas entrassem no carro. Desapontada, Valentina entrou quieta no carro, e foi para o lado oposto em que o pai sentara. Fixou seu olhar na cidade que passava pelo vidro do carro. Quase sentiu uma lágrima escorrer. Engoliu o desapontamento.

Alaor abriu a porta do carro, já se encontravam no jardim do palácio. Era mesmo uma casa da realeza: um jardim redondo ao meio e um casarão com cerca de 10 quartos, algumas escadas até a porta principal e um certo ar de solidão.

- Me espere em minha sala. Aguiar disse segurando os ombros da filha e indo ao encontro da rainha Marcella.

Valentina foi direto ao seu quarto. Se jogou em sua cama. Ela não podia casar, aquilo tinha que ser una brincadeira. Precisava saber o que estava acontecendo. Levantou da cama e saiu, em passo acelerado, sentido a sala do pai, no andar de baixo.

Precisa entender o que o pai tinha na cabeça. Não é possível que a obrigaria a casar só porque pedira pra fazer uma viagem. Que falasse não. Mas pedir para que arrumasse um noivo ? Parecia muito!

Seus pais estavam na sala. Seu pai sentado em sua poltrona dourada de acolchoado vermelho e a mãe ao lado. A mãe sempre estava linda, em um daqueles vestidos que pareciam até mediavais, em um verde musgo que contrastava com a sua pele branca e seu cabelo escuro que iluminava os olhos verdes. Valentina sabia que não estava nem perto de ter metade da beleza que a mãe tinha.

- Precisamos falar com você, minha princesa. Disse a mãe com uma voz carinhosa, porém era perceptível a preocupação. Como se a vida deles dependesse daquela conversa.

- Minha filha, já está perto dos seus 21 anos. E, bom, essa é a idade mais importante para uma família real. A mãe levantou e foi ao lado da garota. Você sabe que nossa família é tradicional. Somos vindos dos antigos lobos marinhos.

Oi? Lobos marinhos? Mãe, o que está arrumando? Está ficando louca?

Talvez a cara de Valentina não tenha sido de maior compreensão pois a mãe começou a explicar:

- É sério minha filha. Cada família real tradicional é vinda de algum animal, que bom, de certa forma representa uma cadeia. Uma cadeia de sobrevivência. E acontece que, aos 21 anos você precisa encontrar seu príncipe.

- Não mãe, sem chance ! Valentina disse levantando da cadeira, inconformada.

- Eu ordeno que se acalme princesa, disse Aguiar.

Valentina sabia distinguir quando o a ordem era de seu pai e quando a ord era do rei. Naquele momento, ela sabia que não poderia desobedecer a Vossa Excelência Rei Aguiar vindo dos lobos marinhos.

- Minha filha, acontece que somos quase o último nível da cadeia. Bem, portanto, ai meu Deus, essa parte é a mais difícil de explicar... Você só pode se casar com alguém do nível acima ou alguém do nível abaixo da cadeia. Os leões terrestres. Ou as raposas marinhas. - Como se pode colocar em uma mesma cadeia, leões terrestres, raposas marinhas e lobos marinhos ? De onde tiravam aqueles animais -. Na verdade, essas dominações serviam apenas como nível de escala. E agora entendia porque em cada lugar havia o retrato de um belo lobo. Sempre pensara que a mãe gostava muitos dos lobos.

- E acontece que os Boaventura são raposas marinhas, um nível a baixo e os Bittencourt são leões terrestres, o último nível da cadeia.

- Minha filha, Arthur Bittencourt chega amanhã pela manhã para conhecê-la melhor... Disse o rei como se tivesse descoberto a América. Ou a Europa, que anda mais valorizada.
-Vocês estão brincando comigo né ? N-Ã-O Q-U-E-RO M-E C-A-S-AR!
- Desculpe filha, mas desta vez não é uma opção e sim uma ordem. A mãe disse de um tom de voz ríspido mas ainda assim amoroso.

Valentina olhou para os dois, abaixou-se em sinal de respeito e saiu indignada com tudo que ouvira. Não conseguira digerir sobre a cadeia, os animais e muito menos sobre um príncipe que estava chegando. Decidira: não sairia do quarto até que o leão fosse embora.

Quase conto de fadasOnde histórias criam vida. Descubra agora