(28/03/22; 8:45; Mathias Aguiar)
O segundo período de aula das segundas-feiras é o melhor. É um misto de literatura e filosofia, onde a professora Flora (eu sei, ela tem o nome de uma Winx) nos leva para a biblioteca. Além de nós fazermos ficha de leitura todo o mês, estudamos os períodos literários e os grandes filósofos. E hoje o estudo é justo sobre o meu filosofo favorito: Sócrates. Além de discutirmos suas filosofias, sempre acabamos as trazendo para a atualidade, o que é algo ótimo de se fazer, mas sempre é a mesma coisa. Feministas debatendo de um lado e cristãs levantando a bíblia do outro. Eu sempre dou risada, não passam de discussões que não levam a lugar nenhum. Não sou mulher e muito menos um exemplo perfeito de cristão, então nunca me posiciono. Evita a dor de cabeça e os julgamentos. Na verdade, essa última parte não. A sociedade julga até o teu silêncio.
Fecho meu livro didático azul com uma página inteira falando do Sócrates. Já nem adianta mais ler, a aula perdeu todo o foco.
— Posso dar uma volta, Prof.ª Flora? — pergunto.
Ela autoriza com um aceno de cabeça, esfregando as mãos no rosto, aparentemente cansada daquilo tudo. Apesar de não pode sair dali por ser a professora, ela é boa o bastante para me deixar vagar entre estantes de livros. Cruzo pela sessão fantasia, olhando os títulos: Harry Potter (AMOOO), Senhor dos Anéis (CHATOO), A Arma Escarlate (desconheço), entre outros. Paro ao escutar um som de notificação chegando no celular. No início acho que veio do meu, mas não há nada. Mais uma vez. Desta vez olho fixamente para o lugar de onde saiu o som, do outro lado da estante.
Com cuidado para não fazer barulho, tiro um livro preto todo empoeirado da estante para poder ver o outro lado. Dou de cara com os cabelos escuros e bem alisados de João. Ele está com a cabeça baixa, olhando fixo para o celular. Então ele olha reto. Bum. O pesado livro preto escapa da minha mão. João arregala os olhos e a professora Flora quase grita:
— Está tudo bem aí, Mathias?
— Só derrubei um livro. — Me agacho para pegar o livro e devolvê-lo a estante. — Vou fazer a volta — sussurro.
Ando depressa, mas com cautela ao pisar no chão. Quando chego aonde João está, sua respiração está pesada e entrecortada. Ele foi pego no flagra fazendo seja lá o que for. Nós demoramos para trocar uma palavra e isso dá tempo para minha mente suja prestar atenção em sua respiração ofegante e criar cenas inapropriadas.
— Está matando aula? — pergunto.
— Fala baixo — ele sussurra. — Meu pai esqueceu de pagar a internet e ela foi cortada. Só tenho a senha da biblioteca. Satisfeito?
Meu coração fica leve ao ouvir isso. Toda a ansiedade que eu senti por ele não ter respondido minhas mensagens no final de semana vai embora. Afinal, eu não falei e nem fiz nada de errado. Isso me dá esperança.
— Entendi, mas não poderia esperar o recreio? — pergunto.
— Não, sexta-feira foi o meu ani...
— PERA, sexta foi seu aniversário? — falo um pouco alto.
— Cala a boca pelo amor de Deus — ele implora juntando as mãos em súplica.
E pelo visto falei alto demais mesmo, pois a professora grita:
— Está falando com alguém Mathias?
— Só mandando áudio, professora. Desculpe atrapalhar.
— Tudo bem, querido.
João, que já estava de saco cheio dos meus gritos, pega minha mão e me arrasta para o banheiro. Minha mente fantasia que ele vai me colocar contra a parede e calar minha boca com seus lábios, beijar o meu pescoço e dizer o quanto estava ansioso por isso. Mas nada disso acontece. Ele solta a seguinte bomba:
— Tenho um web namorado e sexta era nosso aniversário de três meses.
— Ah. — Demoro para processar a informação. — Aaah, entendi. — Me afasto dele e me escoro na parede. — Parabéns, cara... fico muito feliz. Se sabe, por vocês dois.
— Você não é bi? É o que me falaram, sabe? — ele pergunta, desconfortável.
— Sou, por quê?
— É que você parece decepcionado. Nem está gritando como sempre faz.
Meu Deus, está tão obvio assim? Reúno todas as minhas forças e dou um falso sorriso.
— Só me pegou de surpresa, mas parabéns mesmo. — Passo a mão no ombro dele, mas parece errado fazer isso. Tocá-lo parece errado, não sei explicar; sendo que a dois minutos atrás estava cobiçando-o.
(28/03/22; 9:05; João Santos)
— Eu sou gay — admito isso em voz alta pela primeira vez no banheiro de uma biblioteca para um garoto que conheci semana passada.
— Que bom.
Esperava um estardalhaço, não só duas palavras.
— É a minha primeira vez admitindo isso pra alguém. Em voz alta.
— João, eu... Nossa! — Ele me abraça de repente.
Eu não sabia que gostava de abraços até receber aquele. Mathias é um cara mais alto que eu, tem aquele estilo nerd desengonçado de filme clichê, mas nosso abraço encaixa. Minha cabeça se apoia em seu peito, descansando. Ele massageia minhas costas com cuidado. Quando meu coração acelera, resolvo me afastar. Isso não parece certo.
— Obrigado. Amigos?
— Amigos — ele responde. — Preciso voltar pra aula, ok?
— Claro. — Sorrio enquanto ele se despede com um aceno de mão.
Aproveito sua partida e me sento na privada para trocar mensagens com Igor. Sua mensagem de três meses foi basicamente essa: "Muito obrigado, meu amor. Também não vejo a hora de nos encontrarmos. Te amo muito, muito mesmo; feliz três meses." Eu fico um pouco decepcionado, mas é só o jeito dele. Mando mensagens contando tudo que aconteceu agora a pouco e como estou feliz por ter compartilhado um pouco de mim para alguém de carne e osso. Ele responde:
"Fico feliz por ti, mas toma cuidado. Não esquece que tem a mim, não precisa ficar falando suas coisas para os outros."
Igor e sua mania de querer me proteger de todo o mal desse mundo. É fofo, mas as vezes extremista demais.
"Tudo bem, amor, você tem razão. Preciso ir pra sala de aula, em seguida acaba a educação física. Te amo, até mais tarde", respondo e acrescento um emoji sorrindo e um coração.
"Ok, até mais."
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Meu Futuro (web) Namorado
Roman d'amourMathias conhece João e se apaixona de primeira, sem saber que o menino já namora. Ele tenta deixar João de lado a todo o custo, mas aquele menino com sorriso bobo sempre reaparece e bagunça tudo. João web namora com Igor e o ama de verdade, ma...