Não Me Deixe

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Guilherme nunca esqueceria o terror que sentiu naquele momento. Correu ainda tonto para o próprio carro, não conseguia aceitar que perderia Flávia assim. O sentimento de despedida no olhar dela não o deixava respirar. Ele estava quase na porta do seu carro quando foi abordado por Paula Terrare e sua filha, as duas apavoradas.

- A Flávia! Aquela lambisgoia levou a Flávia?

Pelo visto, a mania dela de estralar os dedos ficava pior em tempos de tensão.

A filha gritou histérica.

- Mãe, ela vai matar a Flávia!

Guilherme interveio.

- Eu não vou permitir isso!

Paula agarrou o braço dele.

- Eu não sei se vocês resolveram as coisas, mas, por favor, salve a Flávia.

- Darei tudo de mim para tê-la em segurança. Pode confiar. Chamem a polícia!

A mulher assentiu e o soltou. Ele saiu disparado com o veículo perseguindo Rose pelas ruas. Não foi difícil de achar o carro que elas estavam. Parecia que a direção estava sendo disputada com afinco ali dentro. O veículo pendia para lados diferentes a cada instante.

Flávia estava resistindo e isso era preocupante. Rose não estava lúcida e não hesitaria em causar algum acidente. De um ponto de vista racional, as duas podiam ser consideradas com alto potencial para infligir uma injúria a si. Rose teve a vida destruída e Flávia acreditava ter perdido seu grande amor.

Guilherme bateu furioso no volante repetidas vezes. Naquela hora, qualquer motivo que tinha para afastar Flávia e manter sua distância, esquecê-la, parecia tão pequeno. Perto do real perigo de perdê-la para a Morte, ele descobriu que não se importava com as razões tortas que fizeram a garota o cortejar.

O carro delas passou a dançar mais e Guilherme ouviu um barulho que fez seu coração parar. Elas só podiam estar brigando pela arma. Ele acelerou para poder se aproximar.

Quando chegou perto de alcançá-las, outro disparo soou e o carro pendeu para o lado até bater na diagonal com uma barreira na rua. Guilherme viu os corpos das duas praticamente voarem pela vidro da frente.

Parou o próprio carro perto e saiu correndo atrás delas. Ligou para a Emergência imediatamente. Rose estava mais perto, conferiu seu estado: nenhum sinal de vida. Fechou os olhos e respirou fundo, contendo uma onda de náusea. Correu para o lado de Flávia. Ela tinha um pulso apesar de sangrar bastante, ele agradeceu aos céus.

- Flávia, meu amor, fala comigo. A ajuda já está vindo, viu?

Suas mãos tremiam. Lembrou da última vez que uma pessoa que ele amava com todo o seu ser esteve sob seus cuidados. Não suportaria se a história se repetisse.

- Flávia, não me deixa. Eu não quero viver sem você. Tentei esses dias e descobri que é horrível.

Ela não respondia. Ele fez de tudo para estancar o sangramento. Sua palidez o preocupava. Começou a distribuir beijos por todo seu rosto, se deteve em sua boca.

- Meu amor, volta para mim. Por favor, só volte.

Ele já estava chorando. A dor em seu peito ganhava daquela do local que Rose o atingiu que ainda sangrava. Mas nada importava, somente fazer Flávia reagir.

- Eu te amo. Ouviu? Eu te amo.

Olhou para a pista tentando enxergar alguma ambulância se aproximando. Não tinha nada.

Não quis mexer nela, visto que não sabia a situação de sua coluna. Se deitou ao seu lado como sempre gostava de fazer. Tinha algo em sua  proximidade que era capaz de lhe devolver a paz, mas não agora. Não com ela imóvel assim.

Clamou por ajuda. Por um sinal. Por um milagre. E ele veio. A garota começou a recobrar a consciência.

- Flávia, você consegue me escutar?

Ela grunhiu.

- Gui?

Ele sorriu com aquela reação.

- Sou eu, meu amor. Você pode tentar ficar acordada um pouquinho para mim?

Ela começou a chorar.

- Ei, o que foi? Está com dor? Vai ficar tudo bem, viu?

Ele iniciou um beijo de esquimó para acalmá-la, seguido de um selinho.

- Eu estou no céu?

- Por que, meu amor?

- Porque só assim para você ter me aceitado de volta.

Ele enxugou as lágrimas dela com a ponta dos dedos.

- Eu te perdoei há tempos. Só estava deixando a mágoa falar mais alto.

Ela pousou a mão no braço dele com muita dificuldade.

- Eu me arrependo de tudo. Você precisa saber disso. Hoje, faria tudo diferente. Mas, não me arrependo de ter te conhecido nem de te amar.

E começou a tossir. Guilherme podia sentir que ela estava ficando cada vez mais cansada e se preocupou.

- Eu te amo, Flávia. Isso não importa, agora. Tente poupar um pouco da sua energia, certo?

- Eu te amo, doutor.

E o aperto em seu braço cessou. Ela tinha se entregado à inconsciência. Um objeto caiu da sua mão. Guilherme o apanhou. Era sua aliança. Ele lembrou do dia que Flávia a arrancou de sua mão. Estavam tão felizes, um contraste gritante do atual estado deplorável.

A ambulância finalmente surgiu o tirando de pensamentos depressivos. Flávia precisava da sua ajuda, não de sua melancolia. Os paramédicos foram rápidos e, em instantes, eles estavam se encaminhando ao hospital.

Mas, Flávia teve uma parada cardíaca no meio do trajeto. Guilherme não perdeu tempo e começou a manobra de reanimação. Gritou instruções aos paramédicos para os levassem até sua clínica, era mais perto que qualquer hospital naquele momento.

- Flávia! Nem pense em me deixar aqui sozinho. Não vou perder você também. Não vou, Flávia! Volta para mim! Volta!

O paramédico tentava o convencer a trocar de lugar, uma vez que ele também estava sangrando. Mas Guilherme não podia. Aquele era seu chamado. Precisava salvar a vida dela, era a sua chance de fazer diferente.

Eles logo chegaram na clínica. Guilherme pulou em cima da maca após eles a depositarem no chão. Joana saiu da clínica assustada com a cena. Fazia anos que não via Guilherme em ação e ele parecia desesperado.

- Joana, prepara a sala de operação! É uma emergência!

- Mas, Guilherme, você vai operar?

- Claro que vou!

- Você não opera desde seu pai, Guilherme...

- E agora vou voltar! Não discuta comigo, eu te imploro. Só me ajuda, não posso perder mais alguém na minha vida. Não vou sobreviver.

Joana se compadeceu do amigo. Quem quer que fosse aquela garota tinha o coração de seu amigo nas mãos.

- Você vai precisar se preparar. Vamos!

E entraram na sala que decidiria o destino daqueles presentes na vida do médico outra vez. Onde cada segundo contava.

Tic-Tac.

A sorte está lançada...

Best Mistake - FlaguiOnde histórias criam vida. Descubra agora