Vínculos -III

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Okay, dessa vez eu tenho de admitir que ensinar a Mika a dirigir era uma das partes mais leves e descontraídas dos meus dias ultimamente. Afinal, o caminho de casa até uma quadra antes da escola, porquê ela não queria ser vista pelos colegas do meu lado, eram um dos poucos momentos que eu não estava preocupado com Juliet, as finanças da empresa, a crise no meu casamento e o estranho afastamento de Emma nas últimas semanas.

Não que eu seja um maluco controlador que não quer que as filhas se afastem demais do ninho. Eu entendia que ela estava numa fase de descobertas e todas essas baboseiras de início da vida adulta. Acontece que dadas as circunstâncias, a atitude que eu esperava da minha primogênita, seria de ficar mais próxima da gente, no entanto, ela parecia estar fazendo o contrário. E mesmo que eu jamais fosse cobrar a presença dela e entendesse que todos os compromissos na faculdade necessitassem da sua atenção, parte de mim ansiava pela presença dela.

Na verdade, desde que Emma foi morar na faculdade, eu vinha tentando lidar com aquele sentimento de perda. E por mais normal que pareça a ideia de que os filhos cresçam e sigam seus caminhos, reorganizar a vida e encontrar um novo patamar pra aquela relação, as vezes é uma tarefa bem difícil e dolorosa.

一 Que tá fazendo? 一 Mika me pegou parando admirando feito um idiota a porta fechada do quarto que um dia foi da Emma.

一 Isso foi esquisito.... mas eu só tava pensando na Emma e não pensando em uma maneira de te matar e esconder o corpo.

一 Eu tenho minhas dúvidas quanto a isso, mas imagino que sinta falta dela. Embora na maioria das vezes eu ache que os pais não vêem a hora de chutar a bunda da gente pra fora de casa. 一 ela disse dando os ombros.

一 Não tá errada, a gente fantasia muito com a ideia de voltar a ter a nossa vida só pra gente, ter menos preocupações, menos bagunça... Mas eu acho que depois que você tem um filho, já era. Não tem como voltar atrás e agora eu entendo aquelas famílias que se tem sete filhos e se isolam em montanhas por gerações.... Acho que eu faria isso.

一 Ah fala sério? O senhor "não comprei carro pra ter que caminhar" vai subir uma montanha e viver da terra? 一 Ela questionou com sarcasmo.

一 É... acho que vou esperar instalarem escadas rolantes. 一 Falei e ela riu balançando a cabeça.

Depois de deixar a Mika na escola e ter uma manhã intediante e cheia de burocracia no trabalho, decidi ligar para doutora Cooper e informar sobre os últimos acontecimentos e decidir como deveríamos agir. Definitivamente, eu não queria fazer mais besteira do que já havia feito, mas Miguel não estava errado em tomarmos alguma providência sobre aquele incidente.
Saí do trabalho mais cedo e me encontrei com nossa advogada em um café próximo ao seu escritório. Ela contou sobre a alegação de inocência do advogado da família Callinham e agora além do processo, teríamos que enfrentar uma ação de calúnia e difamação movida por eles.

一 Theodor foi intimado a depor e ao ler os autos eu confesso que fiquei surpresa.一 Ela disse tirando uma pasta recheada de papéis de uma bolsa de couro impecável.一 Ainda tinha dúvidas sobre a autoria do crime, mesmo com a declaração da sua filha em não acreditar na culpa de Theodor, em casos assim, muitas vezes a própria vítima não quer acreditar que a pessoa que ela acredita e ama, fosse capaz de cometer algo tão terrível contra ela. Então, inconscientemente acabam desviando a culpa pra um terceiro e embora eu não tenho sido clara quanto a isso num primeiro momento para que Juliet não se sentisse intimidada, esse também foi um dos motivos de escolher acusar o Theodor, não o Eric. Enfim, voltando ao depoimento dele 一 ela fez uma pausa enquanto procurava a página correta 一 bem se ele fosse o autor do crime qualquer advogado com o mínimo de discernimento, sabendo da prova irrefutável que poderemos apresentar que é o teste de DNA, o instruiria a dizer que eles tiveram uma relação sexual consentida onde ambos tinham consumido substâncias capazes de alterar seu estado de consciência. Isso não exime a culpa em caso de violação, mas é um atenuante que faz com que o julgamento torne-se discricionário, ou seja de acordo com a interpretação dos fatos pelo juiz e nesse caso as penas são ridículas, quando há pena. No entanto, Theodor não declarou isso, ele disse abre as aspas "eu não sei, eu não sei, quando ela me contou sobre a gravidez fiquei desesperado, eu gostava muito daquela garota e eu sabia que não havia a mínima chance daquele filho ser meu, só tinha acontecido uma vez na casa dela semanas depois da festa e tomamos todos os cuidados, não aconteceu nada na festa eu não sei porque ela está me acusando" fecha àspas 一 Ela leu e continuou.一 Ou seja, ele confirmou que não houve relações sexuais entre eles, no dia em questão ou mesmo anterior ou posterior ao dia em que estiveram na sua casa, alguém culpado com um bom advogado como o que ele deve ter, não se colocaria nessa situação. Afinal,  se ele alega que não houve relações e há uma vítima que não lembra de absolutamente nada, com um feto cujo o DNA é compatível com a paternidade e incompatível com as semanas da declaração do ato sexual consentido, ele já assume uma inconsistência e perjúrio automaticamente. Então se ele fez isso é porquê ele sabe que o teste de paternidade vai dar negativo. 一 ela concluiu.

一 E que nem ele e muito menos o advogado imaginam ou acreditam que o culpado possa ser o Eric 一 completei e ela concordou com a cabeça.

一Exato, bem continuando o delegado perguntou sobre o dia que Juliet alega ter sido violada e a resposta dele foi a seguinte, abre aspas 一 "Eu não vou mentir, eu tinha a intenção que aquele dia fosse a nossa primeira vez, que cara não tem esse tipo de ideia com a garota que gosta? Isso é crime? Mas eu não toquei nela. Ela achou que nao era a hora eu fiquei frustrado sim, talvez eu tenha isistido mais do que devia pra ela deixar rolar, mas a casa tava lotada e concordei que não era o melhor momento, eu queria que fosse especial pra nós dois, então voltamos pra festa. Nos divertimos, bebemos, comemos e ela dormiu... Eu não sabia que os remédios dela podiam fazer mal... eu não tentei dopar ela pra transar, eu não fiz isso. Eu nunca fiz isso, eu juro que nunca fiz isso. Eu queria poder falar com ela, eu não sei o que ela pensa que eu fiz, mas eu não fiz nada com ela."一 Fecha àspas, então o delegado perguntou se ele fazia ideia do que poderia ter acontecido na casa da piscina e ele respondeu que não havia acontecido nada, que ele a deixou dormindo, que o irmão dele e alguns amigos podem testemunhar que ele não voltou lá até o senhor chegar.

一É ele não tá mentindo, ele deixou a minha filha lá, sozinha, dopada e desprotegida pro desgraçado do irmão dele.一 falei irritado. 一 Eles tiveram lá em casa , não sei se os Callinham estão diretamente ligados a isso ou se foi algum amiguinho que tomou as dores dele, sei que esses garotos de time são muito protecionistas um com os outros, mas picharam aquela coisa na minha garagem, o que podemos fazer legalmente quanto a isso enquanto o processo corre?

一Eu já havia pedido uma ordem de restrição assim que entramos com o processo e como ela é menor de idade o juiz acatou na hora. Legalmente ele não pode chegar perto dela porque ele pode ser detido. Mas ele tem dezessete anos e pelo que vi no depoimento, está confuso e ele vai querer entrar em contato com ela cedo ou tarde, mesmo que o advogado dele instrua que não faça isso. Quanto aos outros garotos, até que identificamos quem seja, não há o que fazer.

一 Ela me disse que ele ligou e mandou mensagens, ela não respondeu.

一Pois deixe claro que ela não pode responder, mesmo que ela acredite que não tenha sido ele, nós estamos o acusando e se ela conversar com ele isso vai parecer para o juri como uma grande contradição, afinal o que se espera de uma vítima é que ela queria distância do seu agressor.

一Eu não acho que ela queira falar com ele agora, a Juliet ainda está confusa, mas ela tem sido muito sensata, mais do que esperava que fosse.

一 E como estão as sessões de terapia?

一 Acho que ela está indo bem, ela decidiu que não quer entregar o bebê pra adoção. É uma menina.

一 É uma decisão e tanto. Ela tem certeza disso? Quer dizer, criar uma criança indesejada já é algo muito difícil, um bebê de um estupro envolve ainda mais questões. Ela, a família e posteriormente a criança, precisam de um acompanhamento psicológico pra lidar com essa situação.

一 Eu sei, mas vou a apoiar no que ela decidir e no momento ela acha que o melhor é cuidar desse bebê, então vamos cuidar do bebê. 一 falei.

一 É uma atitude louvável, senhor Johnson.

一 É, ela está sendo muito corajosa, eu não teria essa coragem. Mas enfim, eu não estou preocupado com como vamos criar esse bebê, por mais que a minha família tenha seus problemas, somos conscientes, não vamos sempre pensar no bem dela idependente de qualquer coisa. Mas... Quanto aos direitos paternos, se não conseguimos provar que houve um crime o que acontece?

一 Se não conseguimos provar, ele terá todos os direitos paternos garantidos por lei. Mas não vamos pensar nisso agora, porque nós vamos provar. No depoimento do Theodor ele confirmou que Juliet estava desacordada, ele até usou as palavras "dopada e inconsciente" ou seja qualquer coisa que qualquer um tenha feito com ela naquela data não foi de forma consentida. E a menos que Eric, pressupondo que o DNA tenha dado compatível com ele, prove que eles tiveram alguma relação consensual, não há como ele se safar dessa. A inocência e pouca preparação do Theodor no seu depoimento, facilitou e muito as coisas para nós.

一 Ou seja, nesse caso minha filha ter namorado um idiota foi útil.

一 Resumidamente sim. 一de ela concordou com a cabeça 一 agora vai me contar o que viu no HD que roubaram e acabaram com qualquer possibilidade dele ser usado como uma prova, ou não?





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