Capítulo 57

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SEHER

Encaro o homem de olhos arregalados na minha frente. Yaman não fala uma única palavra, ele parece uma estátua.

— Por que você não fala? -Jogo as folhas no chão. — Além de matar minha mãe, o que mais você escondeu de mim durante esse tempo?

Yaman pisca repetidas vezes, então seus olhos desviam de mim para as folhas espalhadas no chão. Lentamente, ele recolhe algumas delas e as observa por alguns segundos antes de voltar os olhos para mim.

As lembranças dos olhares amorosos de minha mãe fazem lágrimas verterem por meus olhos, a dor no meu peito, assim como o peso esmagador sobre meus ombros me fazem perder o fôlego.

Eu faria qualquer coisa para ver aqueles olhares amorosos outra vez, uma única vez.

Por mais quanto tempo ele vai continuar sem falar?

Yaman coloca as folhas sobre a mesa e vira para mim, os olhos opacos me encaram sem emoção, então caminha até parar a alguns centímetros de mim.

Estou ardendo de raiva, remorso, tristeza. Silêncio não é o que eu quero. Eu preciso de uma explicação. Sinto meu coração apertado, virado pelo avesso dentro do peito.

— Eu nunca escondi nada de você. -Ele me olha com tristeza. — Essa paciente...

— MINHA MÃE.

Yaman tenta segurar minha mão, mas dou um passo para trás. Ele está desconcertado e me observa com medo, como se eu fosse surtar e sair correndo pela porta.

— Seher.

— Não se atreva a me olhar assim. Você não tem o direito de me olhar assim.

— Eu acabei de te falar sobre essa paci..., essa mulher. Ela teve um colapso gestacional e eu tenho certeza que nada além poderia ter sido feito, mesmo que ela tivesse tido um atendimento imediato do melhor médico do mundo. Infelizmente ela foi admitida no meu plantão sem vida, as manobras realizadas foram única e exclusivamente para manter o bebê a salvo. Nada poderia ser feito para reverter o quadro em que ela chegou. Eu fiz o que o outro médico não quis fazer, mantive o coração dela batendo para que o bebê não fosse ainda mais prejudicado.

— Eu quero saber tudo o que aconteceu. Você vai me contar exatamente qual foi sua conduta, vai me contar passo a passo sem deixar nada de fora. Eu preciso saber.

— Eu sinto muito.

— Sente muito? Por quê? Por ter matado minha mãe? Por tratar ela como se fosse qualquer coisa? Por não ter dado a atenção que ela merecia?

— Sinto muito por ela não estar aqui com a gente nesse momento. Sinto muito por ela não ter a chance de conhecer o neto. Sinto muito por ela não poder te abraçar. Mas não pense que eu teria feito qualquer coisa de diferente naquele dia. Eu faria exatamente o mesmo procedimento caso isso acontecesse hoje. Minha conduta e meus métodos foram profissionais e respeitosos. Eu fiz por ela e por todas as outras pacientes tudo o que estava ao meu alcance sem jamais ser negligente. -Ele fecha os olhos e eu posso ver milhares de emoções passando por seu rosto. Quando ele volta a me olhar, sua expressão é de uma tristeza profunda. — Eu lembro de cada uma dessas mulheres, lembro de cada detalhe e sei que fiz o máximo por cada uma delas. Eu nunca fui negligente. Eu me importava com aquelas vidas.

— Você deveria ter feito mais. -O mundo desaparece, deixando apenas um imenso abismo à minha frente, só esperando que eu caia. — VOCÊ DEVERIA TER FEITO MAIS.

Preciso respirar.

Preciso sair daqui.

Preciso ficar longe do olhar triste de Yaman, então viro as costas e saio do quarto.

SEGUNDA CHANCEOnde histórias criam vida. Descubra agora