Nem que o mundo acabe, nem que as vacas voem

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O barulho da chuva que faz do lado de fora me prende à cama. O vento forte com seu famoso assobio, assopra com força do outro lado da janela. O frio me faz rolar de um lado para o outro de baixo da coberta. Faz cinco dias que o sol não dá as caras no céu desse lugar.

A luz que meu celular emite, em simultâneo a uma vibração irritante que vem de minha cômoda me obriga a colocar a cabeça abaixo do meu travesseiro. A claridade que o aparelho proporciona ilumina meu calendário, que marca o décimo dia do mês.

O telefone para de vibrar, isso significa que tenho mais cinco minutos na cama. Pelo menos foi o que eu pensei:

— Daniel, larga de ser vagabundo — meu pai abre a porta do quarto e ilumina todo o ambiente antes escuro — já é a décima vez que seu celular vibra e você não levanta! — Fala com uma voz firme.

Escondo-me mais ainda embaixo da coberta.

Daqui a pouco ele desiste. Não sei o que tá fazendo em casa, já deu a hora dele sair trabalhar.

Ouço passos se aproximando, o homem de quarenta e três anos puxa o tecido que me cobre, fazendo com que o olhe de imediato:

— São oito horas da manhã, ainda dá tempo de você fazer a prova — está em pé me olhando e esperando alguma reação vindo de mim — sua mãe me contou que foi mal nas outras provas, mas é melhor um "cinco" a um "zero", não é?

Sento-me na cama cruzando as pernas.

— Como que vou para escola? — pergunto enquanto passo a mão nos meus olhos e subo ela até meus cabelos para ver se me dava ânimo.

— Eu te levo, não tem problema. Hoje estou de folga — sai do quarto acendendo a luz do mesmo — vai se trocar! Oito e meia te levo.

A luminosidade no lugar revela as roupas jogadas no chão, algumas portas do armário abertas e a zona que está meu quarto.

Depois que meus olhos se acostumam, me levanto da cama e vou em busca do meu uniforme. Após colocá-lo, vou ao banheiro me higienizar.

No meio do caminho me deparo com minha irmã tentando alcançar um objeto em cima do armário, logo após escovar meus dentes e ver que ainda não conseguiu, a ajudo recebendo um genuíno obrigado junto a um sorriso branco que ela sempre me dá depois de receber minha ajuda em algo.

Já com a porta de casa aberta, meu pai me chama, então, me apresso no que tenho que fazer e vou até o quarto da minha mãe, ela ainda dorme. Dou um beijo em sua testa e ando até meu pai a passos rápidos.

O homem de cabelos pretos e olhos azuis me olha correr pela sala até passar a porta. Ele tem um guarda-chuva em sua mão, a única coisa que impede as gotas frias de nos encharcar.

Depois de já estarmos no carro, meu progenitor liga o motor e acelera. O sereno raso que cai, não para em nenhum momento do caminho.

Já na escola, Renato, meu pai, para o carro:

— Leva o guarda-chuva com você, em casa eu me viro — passa a mão em meus cabelos, bagunçando-os ainda mais — que horas você sai mesmo?

— Duas horas — respondo abrindo a porta do carro e tentando não ser atingido pelos pingos que caem sem cessar.

— Então me espere aqui duas e dez — aponta para a escola e faz com a mão mesmo sinal que fazemos para um cachorro quando não queremos que ele roce em nossa perna. Só falta dizer o típico "xô!" — boa sorte, filho.

— Tchau então, pai. Obrigado — fecho a porta e corro.

— Tchau, Daniel — Consigo ouvir ele e o som do automóvel ganhando velocidade na rua molhada.

23 mortesOnde histórias criam vida. Descubra agora