Eu quase não tinha apetite. Nem sono. Quase nem mesmo tinha vontade de fazer outra coisa que não fosse passar o dia todo dentro de casa. No início, eu culpei meu metabolismo corporal, a insônia e o fato de ser uma pessoa introspectiva. A terapia estava me ajudando a perceber que esses poderiam não ser os únicos motivos. A verdade era que meus transtornos psicológicos estavam afetando diretamente o funcionamento do meu corpo. Do meu organismo. Parece loucura, mas não é. A saúde mental também pode estragar você. Pode criar doenças que você jamais conseguiria perceber sozinho. Era estranho. Estranho estar realmente levando aquela hipótese em consideração. Estranho descobrir que talvez realmente houvesse um "motivo".
Naquela tarde, estou na academia com Ted. Tudo parecia ter voltado ao normal. Tudo menos ele. Percebo que está mais distante do que o normal. Brincando menos do que o normal. Quando terminamos o treino, ele me convida para tomar um sorvete, e é bem ali que eu percebo que há algo errado. Ted era do tipo que nunca furava a dieta.
– Tá tudo bem com você? – Pergunto quando já estamos do lado de fora da sorveteria, depositando nossos copos agora vazios dentro de uma lixeira.
Penso que ele vai mentir. Talvez retrucar com uma piada. Mas não. Ted cruza os braços e admira o horizonte que já estava se pondo. Acho que ele precisava que alguém fizesse aquela pergunta.
– Eu pensei que fosse começar a faculdade de Educação Física esse ano, mas não vai rolar. – Ele dá de ombros. – Não tenho notas que sejam boas o suficiente para conseguir uma bolsa. – Ele faz uma pausa. – E meus pais... bem, eles são pobres demais para bancar esse tipo de coisa.
Também cruzo os braços, pensando sobre o assunto. Eu sempre me esquecia que Ted era um ano mais novo do que eu. Tinha dezessete. Também sempre me esquecia que ele não costumava falar sobre sua vida familiar.
– Acho que você não entende, não é mesmo? – Ele dá uma risada, mas percebo que não passa de um disfarce. – Afinal, sua família sempre foi rica. – Ouvir aquilo é estranho. – Quer dizer, vocês até moram em um condomínio.
Então aquela era a imagem que ele tinha?
– Para falar a verdade, eu entendo. – Revelo. – Não é minha família que sempre foi rica, e sim a família da minha mãe. Agora que ela já arrumou uma nova, as coisas não funcionam mais desse jeito. – Consigo captar a atenção de Ted por um momento. – Meu pai sempre trabalhou feito um louco, mas a verdade é que já faz um tempo que as coisas não andam muito bem. – Dizer aquilo em voz alta não era vergonhoso para mim. Nunca foi. – Nós não somos ricos. Somos apenas pessoas pobres fingindo que ainda tem algum dinheiro.
Ofereço um sorriso amigável para Ted, mas ele não retribui. Ele apenas me olha com o rosto meio corado. Nunca havia sido minha intenção constrangê-lo.
– Eu não fazia ideia. – Ele reflete.
Foi bom ter falado sobre aquilo. Estreitado nossa relação de amizade meio vazia. Penso que Ted vai voltar ao seu estado normal agora, mas ainda vejo insegurança em seu olhar. Ele me olha, mais uma vez, e faz a seguinte pergunta:
– Você sempre soube que gostava de garotos?
Por alguns segundos não sei o que dizer ou sentir.
– Hum. Acho que sim. – Tento soar natural. – No início não era nada do tipo amoroso ou sexual, mas com certeza eu percebi rapidamente que garotos chamavam minha atenção de uma maneira diferente. – Naquele momento percebo como eu não estava acostumado a falar sobre aquilo.
Ted assente com a cabeça. Ainda não parece convencido.
– E você nunca... – Ele pigarreia. – Nunca teve curiosidade de tentar com uma garota?
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Para Aqueles Que Não Querem Viver [✓]
Teen Fiction[Romance Gay] Além de Love ser gay, problemático e infeliz, ele ainda pensa em se matar todos os dias. Vivendo uma rotina extremamente frustrante para um jovem de dezoito anos, o ápice da sua vida é ir para a academia com Ted, um recém amigo hétero...