Maven Calore: Recomeço

Parte V

-Antes de começarmos quer falar algo?- Thomas fala sentado numa poltrona cinza e sem graça. Estamos numa sala que iremos usar para entrar na minha mente e desfazer as coisas doidas que minha mãe plantou na minha cabeça (se for possível, pelo menos iremos tentar). Não é como achei que seria, escura ou triste, há outras coisas nela, um piano, uma estante com livros intocados, e a parede é pintada de amarelo, como disse nada como eu esperava que fosse, acho que Cal tomou o cuidado pra não escolher um lugar tão deprimente quanto eu.

-Você está muito bonito.- Digo sentado a sua frente no sofá, enquanto tento fazer o meu melhor sorriso.

-Eu trouxe você aqui para conversar e saber mais sobre sua mente, para mim entender você, não para flertar. Como vou resolver isso se não entender?

-Eu prefiro a parte do flerte.- Eu também quero que ele me ajude e que a ideia bizarra do meu irmão dê certo, mas gosto de dar em cima dele, me diverte. O que mais posso fazer?

-Maven, é sério.

-Tudo bem. Vou me comportar prometo.

Thomas assente.

-Você está bem comigo entrando na sua mente?

Na verdade não, odeio Murmuradores e até mesmo na minha corte não conseguia ficar sozinho com um sem desejar pelas pedras silenciosas, depois de minha mãe morrer jurei que nunca mais ia deixar um Murmurador entrar na mina mente de novo, a não ser que fosse muito necessário, tipo para manter a coroa.

-Nem um pouco. Não gosto de Murmuradores. -Falo e depois de ver a ofensa nos seus olhos acrescento - Menos você, eu gosto de você.

-Também gosto de você, ou pelo menos gostava. – Ele olha para o chão, nervoso. -Não sei o que sentir por você agora.

Eu quero que goste de mim, penso, mas fico quieto. Sei que ele tem toda razão de se sentir assim, posso ser um narcisista, mas não sou burro.

Ele se levanta e vêm na minha direção e estende a mão com uma interrogação transparecendo em seu rosto.

-Eu posso?- Ele pergunta e eu confirmo com a cabeça. Ele se aproxima e coloca a mão no meu rosto.

Thomas olha dentro dos meus olhos e sinto seu poder passando pela minha mente e não é uma sensação boa, assim não doe, mas é meio que humilhante. Ele vai saber todos os meus pensamentos, incluindo os mais obscuros, minha obsessão com Mare, ódio por Cal, meu pai, outra obsessão com a Coroa, minha relação estranha com minha mãe. Quando planejamos o assassinato de meu pai e incriminamos Cal e Mare por isso, e eu nem mesmo senti remorso. Percebo como a minha mente é perturbada e tenho vergonha dos meus pensamentos serem vistos por ele. Ele também poderá ver meus sentimentos em relação á ele, meu primeiro amor, a primeira pessoa que me viu além da coroa e realeza, pode ver o quanto o desejo e penso nele, mesmo quando estava morto para mim. Ele vai saber quando fui dormir ontem á noite, no quarto escuro e quieto, desejei por ele naquela cama ao meu lado, imaginei como seria deitar e ouvir sua respiração enquanto dorme.

Consigo ver minhas lembranças passando, minha mãe murmurando, contando sobre as coisas que fazia quando eu era criança, consigo lembrar dos pesadelos, de ir dormir no quarto de Cal com medo, dela falando que iria tirar os "sonhos ruins de mim" mas na verdade tirou tudo. Consigo ver todos os seus abusos disfarçados de uma mãe protetora, vejo seus olhos tão azuis e tão frios como o meu ao me encararem de volta, o que me assusta. Sinto raiva queimando dentro de mim, ao mesmo tempo em que me sinto frio e desnorteado.

Thomas checa muitas memórias, incluindo as com o Cal, ele me encobrindo quando espionava nas conversas oficiais de nosso pai, ele contando segredos para mim, tentando me ajudar a melhorar minhas práticas de batalha em treinamentos. Consigo ver que eu o amava, mesmo que tenha perdido esse sentimento no momento, antes éramos uma família, desejo poder sentir aquilo de novo, por mais que nunca fosse admitir a Cal. É estranho compartilhar esses pensamentos com Thomas.