5. Um pouco mais de café gelado

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Segunda feira, o dia em que Brian voltaria para o Dom Marques após a suspenção na última semana. Aquilo não saía da minha cabeça por mais que eu tentasse esquecer, era como um disco arranhado tocando sem parar na minha cabeça. Se já não bastasse aquele domingo pesaroso e a noite de sono mal dormida, ainda teria que lidar com mais aquele pesadelo. Por mim eu nunca mais voltaria naquela escola e tentaria outra transferência, mas os meus tios desconfiariam logo de cara que havia algo de errado acontecendo comigo, então eu não tinha como fazer tal coisa. Não me atreveria a incomodá-los com aquilo também, que desculpa eu daria? O Dom Marques era, literalmente, uma das melhores escolas da região senão a melhor de todas, eles não comprariam aquilo.

Fui encarar meu destino e, por força do hábito gerado na semana anterior, ignorei Juliana mais uma vez na entrada da escola. Já seria ruim o suficiente estar na mesma sala que o Brian, não queria deixar o cara ainda mais irritado por ficar de papo furado com a namorada dele. Não que eu fosse ter algo com ela, mas ele não sabia disso. Ou sabia? Será que dava para perceber? Me perguntei enquanto ia em direção aos armários. Peguei minhas coisas e fui direto para a classe, não queria trombar com ele pelos corredores ou acabaria na enfermaria outra vez. Meu corte na testa nem havia sarado ainda, não estava nem um pouco afim de conseguir um irmão gêmeo para ele. Ao menos por todo o trajeto entre as catracas e a sala não tive sinal algum da presença dele no recinto, não sei se aquilo me dava alívio ou se me causava ainda mais ansiedade. Logo o sinal do primeiro tempo tocou e todos os alunos entraram na classe, tomando seus respectivos lugares. Fiz questão de sentar nos fundos da sala, torcendo para que ninguém notasse a minha presença ali, especialmente ele.

– Bom dia a todos! – A Srta. Garcia entrou, sorrindo como sempre – Fim de semana acabou, é hora de voltar pro conteúdo. Sr. Ferreira, onde paramos aula passada, por favor? – Ela usava uma blusa creme, uma saia marrom, seus saltos pretos e o seu cabelo estava preso num coque desconstruído.

– Morfossintaxe do adjetivo professora – respondeu após verificar suas anotações.

– Ótimo, continuaremos daí então... – Três batidas na porta e ela se abriu.

– Com licença, professora? – Disse um aluno desconhecido – Me desculpe o atraso, posso entrar?

– Claro, – Ela conferiu rapidamente um bilhete sobre seus papeis no birô. – Sr. Ferraz, não é? – Ele assentiu – Desta vez, vou tolerar seu atraso, mas seja pontual nas nossas próximas aulas, tá bem? Eu sou Isabela Garcia, professora de Português e Redação de vocês, seja bem-vindo à classe. – Ele assentiu em silêncio e se direcionou à uma carteira vazia, logo à frente da classe, mas ela o interrompeu – Calma, antes de tomar seu lugar, por que não se apresenta aos seus colegas, hm? Diga seu nome, sua idade, de onde veio...

– Tá, eu acho... Eu sou Miguel Ferraz, tenho quinze anos e vim do São Bento. – Ele manteve a expressão fechada, disse aquilo rapidamente – Posso me sentar agora? – Ele arqueou as sobrancelhas para ela.

– Claro. Como você está chegando somente agora, precisa pegar os assuntos da semana passada com algum colega, nas minhas aulas as anotações valem pontos. Quanto mais tiver, mais pontos terá. – Ela sorriu, sempre simpática. Ele apenas deu de ombros. – Certo, de volta ao conteúdo, Srtas. Cortes e Nascimento aí atrás, a aula já começou. – Ela pegou seu marcador e começou de fato sua aula.

A medida em que o primeiro tempo progredia a minha ansiedade explodia, ele poderia cruzar aquela porta a qualquer instante ou mesmo só chegasse no segundo tempo. Engolia em seco só de imaginar. Mas, contrariando minhas expectativas, não houve nem um sinal dele no primeiro tempo, nem no segundo, nem no terceiro. Talvez ele apenas não viesse aquela segunda e eu gostava daquela hipótese, mas aquilo não fora o suficiente para me acalmar. Minha integridade física ainda estava em jogo, talvez até minha vida, não podia não ficar em alerta. Quando o sinal do intervalo tocou encerrando o terceiro tempo, percebi que um terço daquele dia letivo já havia passado e nada de Brian. Talvez, no fim das contas, ele realmente não viesse e eu teria mais um dia de paz, não que aquilo me animasse muito, eu ainda teria que vê-lo mais cedo ou mais tarde, mas não deixava de ser um breve alívio.

Eu morreria congelado por vocêOnde histórias criam vida. Descubra agora