Solas | Lewis Hamilton

GP da Áustria

Julho de 2022, Spielberg, Áustria

Já passavam das duas horas de duração a reunião geral com os principais engenheiros e estrategistas da Ferrari, no início daquela quinta-feira.

Sky não aguentava mais tomar café e respirar fundo. Era a sequência necessária para se manter sã e calma diante de todos. Única mulher na sala, ela estava cercada por, pelo menos, quinze homens. A ordem de fala de cada um estava relativamente organizada, seguindo uma sequência - que era quebrada somente quando chegava a vez dela.

Como tantas e tantas vezes, Brandon, o engenheiro II (que iria ficar mais alguns meses na equipe para tirar a licença-maternidade da verdadeira dona do cargo), estava implicando com ela. O problema é que agora ele era endossado pelos outros membros numa teoria que, para Sky, era completamente sem sentido.

-Certo, Brandon, o que você faria no meu lugar? Me explique com riqueza de detalhes. Me diga como ganhar uma corrida ou um campeonato com um motor que quebra de repente ou estratégias que estragam todo o trabalho feito pelo piloto? - ela perguntou se segurando para não bater na mesa, respirando fundo e entrelaçando uma mão na outra com força, as duas apoiadas no colo - Por melhor que o carro seja, de que forma você quer vencer se todas as partes não funcionam direito?

-Sky, acalme-se. Você está muito nervosa - ele disse suavemente, sorrindo amistoso - Você precisa reconhecer as deficiências desse carro.

-Eu reconheço todos os erros e problemas que o carro pode ter. Inclusive alterei e consertei o que foi preciso, algumas inclusive apontadas por você. Mas se existem outros problemas que estão na minha alçada, me informe, já que você tem a solução para tudo.

Brandon sacudiu a cabeça sorrindo. Apoiou os dois cotovelos na mesa, fixando os olhos castanhos em Sky. Ela, que estava com as costas totalmente apoiadas na cadeira, automaticamente projetou-se para a frente, também colocando parte dos braços na mesa, olhando para ele.

-É hora de reconhecer, então, que somente as garotas da sua equipe não são suficientes. Precisa que outros de nós - ele olhou para os outros homens da mesa, que fizeram murmúrios de concordância - Coordenem vocês.

Sky sentiu seus olhos faiscarem.

-As mulheres - ela enfatizou - da minha equipe já têm uma coordenadora. Sou eu. Mas já que você quer contribuir em alguma coisa para, quem sabe, termos uma chance nesse campeonato, comece dando uma boa olhada em como esse motor se comporta. Afinal, é o seu papel que, ao contrário do nosso, não está sendo bem cumprido. Talvez eu devesse sugerir que a doutora em Química, Padma Raj, supervisione as suas decisões.

Sky viu Brandon fechar os punhos e sentiu vontade de jogar o resto do café que estava na sua xícara na cara dele.

-Acredito que - Mattia, que estava ao lado de Sky e de frente para Brandon, pigarreou e ajeitou-se na cadeira - Que possamos resolver isso com calma e em outro momento. Passamos de duas horas e meia de reunião - ele deu uma olhada no imenso relógio pendurado na parede - Vamos descansar um pouco, tomar uma água. Voltamos depois das reuniões dos engenheiros com seus respectivos pilotos.

Todos se levantaram quase ao mesmo tempo em silêncio.

Sky foi uma das primeiras a sair e acabou trombando com Brandon e Mario, um dos responsáveis pelas unidades de potência que estava a todo momento concordando com as colocações dele. Ela e Brandon tentaram passar ao mesmo tempo pela porta, mas o engenheiro recuou e indicou a saída para Sky com um sorriso cordial. Ela revirou os olhos e passou.

Saiu do prédio da Ferrari e resolveu sentar-se numa das mesas em frente, onde tinha ampla vista do paddock. Observar as pessoas indo e vindo (e até os fotógrafos de vez em quando perseguindo um piloto) era mais relaxante do que olhar no rosto de qualquer um naquela sala.