TRÊS

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— Na escola você poderia se distrair. — Minha mãe argumentou.

            Não era verdade, ir à escola significaria conviver com outras pessoas do reino e pessoas são a forma mais constante de lembrança que Pablo existiu. Todas elas estariam olhando para mim, curiosas, mas não o suficiente para perguntar, eu ouviria a voz de pena em cada sentença, em cada gesto, não estava preparada para isso.

            — Coma alguma coisa pelo menos — ela insistiu.

            Comi um pão, todo tipo de alimento descia de um jeito ruim em minha garganta, me causando um mau estar momentâneo, mas eu sabia que ficar sem comer iria preocupar a minha mãe e roubar ainda mais a sua atenção.

            Eu sabia muito bem para onde queria ir. Vesti roupas decentes e trilhei o caminho tão conhecido em direção à casa da família de Pablo. Dessa vez, o portão não estava fechado e simplesmente entrei. Uma das criadas veio até mim, surpresa com a minha presença:

            — Eu quero falar com a senhora Eax — disse.

            — A senhora tem certeza?

            — Como assim? Tenho.

            — Me acompanhe então — ela parecia relutante em atender o meu pedido.

            Eu a acompanhei até o quarto da senhora Eax, andando por um lado da mansão que eu nunca havia visto antes. A criada me deixou em frente a uma porta e disse:

            — Entre sem bater — virou-se e foi embora.

            Segui a orientação e entrei no que descobri ser um quarto. Um imenso lustre iluminava o local que continha uma cama de casal tão grande que caberia três casais. Do outro lado do cômodo, em frente a um armário branco, de costas para mim, estava a mãe de Pablo. Ela mexia nas roupas freneticamente, observando não consegui entender qual era a sua intenção com toda essa agitação. Ela não notou a minha presença.

            — Olá, senhora Eax — disse enquanto me aproximava a passos curtos.

            Ela parou de se mexer, como se tentasse entender de onde aquela voz apareceu, virou-se para mim e pude finalmente ver o seu rosto. Ela não estava bonita, parecia pálida e doente, seu cabelo se assemelhava a um ninho de pássaros.

            — Melissa — ela disse. — Olá. — E voltou a mexer em suas roupas. Pegou um punhado delas, como se fosse palha, levou até um baú e as depositou nele, derrubando várias peças pelo chão.

            Iria perguntar se ela estava bem, mas a resposta era tão óbvia que a pergunta seria indelicada:

            — Arrumando minha mudança — ela respondeu. — Estou arrumando minhas coisas, vou me mudar daqui, estou arrumando para ir embora desse lugar, daqui, pra outro lugar. — Em seguida, levantou uma garrafa de licor do chão e bebeu um longo gole direto do gargalo. Ela estava obviamente embriagada, era possível notar pelos seus passos e jeito de falar. Olhei para o chão e notei que outras garrafas rolavam vazias pelo quarto.

            — Eu preciso falar com a senhora.

            — Pode falar, só não posso parar de arrumar, estou com pressa.

            Ela não estava realmente arrumando nada. Socava as roupas no baú, amassadas e de qualquer jeito, depois ia até o armário e pegava um monte de uma só vez. Era possível encontrar mais roupas no chão do que no armário e no baú, que nunca suportaria todas as roupas do armário sozinho. Quando ela notava que o baú estava cheio, simplesmente pegava um punhado de roupas de dentro dele e jogava no chão, dando espaço para outras roupas que logo seriam jogadas no chão também.

MAIS LEVE QUE O AR (HISTÓRIA COMPLETA)Onde histórias criam vida. Descubra agora